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terça-feira, 30 de abril de 2024

O Divórcio, essa experiência pela qual ninguém sai ileso.

Quando falamos de divórcio, estamos nos referindo a algo muito mais do que um processo legal; é um percurso emocional complexo e profundamente pessoal. Cada pessoa vivencia esse momento de forma única, enfrentando dificuldades tanto nas relações com os outros quanto consigo mesma. Um passo crucial nesse caminho é aprender a redefinir o relacionamento com o ex-parceiro, o que pode ser um grande marco na adaptação a essa nova fase da vida.

Neste panorama, a Teoria do Apego, desenvolvida pelo psiquiatra John Bowlby, nos ajuda a entender melhor o que acontece conosco durante um divórcio. Essa teoria sugere que a maneira como nos ligamos emocionalmente a outras pessoas pode influenciar como lidamos com o fim de um relacionamento. Em especial, ela se concentra em dois aspectos: como reorganizamos nossos sentimentos de apego e como as nossas tendências pessoais, como a ansiedade e a necessidade de evitar conflitos, afetam esse processo.

Uma das partes mais complexas do divórcio é a mudança de um estado de compartilhamento da vida com alguém para um estado de independência. Nesse momento, entender quem somos (nosso autoconceito) e como encaixamos esta experiência na história da nossa vida (nossa coerência narrativa) é essencial. É sobre redescobrir nossa identidade e encontrar uma forma de integrar a experiência do divórcio em nossa narrativa pessoal, o que pode ser chave para uma adaptação saudável.

Neste sentido, a clareza do autoconceito e a coerência narrativa são fundamentais no processo de adaptação após uma separação. Elas ajudam os indivíduos a redefinirem suas identidades, a entenderem suas histórias de vida, e a avançarem com uma sensação de propósito e autoconhecimento. Enquanto o caminho para alcançá-las pode ser desafiador, ele é também profundamente enriquecedor e essencial para o crescimento pessoal após um divórcio.

Neste processo, dois padrões desadaptativos também podem ser ativados e que deverão ser foco de cuidado, ou seja, muitas pessoas experimentam ansiedade intensa ou uma tendência a evitar enfrentar seus sentimentos durante o divórcio.

No caso da ansiedade de apego, ela é caracterizada por uma preocupação excessiva com a rejeição e abandono. Sendo que, os indivíduos com alta ansiedade de apego, frequentemente, buscam aprovação e reafirmação em seus relacionamentos. E no divórcio, pode-se intensificar o sentimento de perda e medo de estar sozinho e levar a uma luta contínua para manter o vínculo com o ex-parceiro. Outro agravante é a manifestação de comportamentos obsessivos ou preocupação excessiva com o ex-parceiro. Nestes casos, a terapia e apoio social são cruciais para gerenciar a ansiedade. Aprender a reconhecer e questionar pensamentos e crenças disfuncionais também é benéfico.

Em relação a evitação de apego, essa se manifesta como um distanciamento emocional dos outros. Indivíduos com alta evitação de apego muitas vezes valorizam a independência e têm dificuldade em confiar e se abrir para os outros. Esse padrão de comportamento ativado no divórcio, leva a supressão emocional, ou seja, tendem a suprimir ou negar seus sentimentos, o que pode atrasar o processo de luto. Também pode levar ao isolamento social e resistir ao apoio dos outros. O outro agravante, é a dificuldade em formar novas relações, e podem ter problemas para estabelecer novos relacionamentos íntimos após o divórcio. A solução para modelagem funcional desse padrão é o gerenciamento, ou seja, reconhecer a importância da conexão emocional e praticar vulnerabilidade em um ambiente seguro, como na terapia, esse recurso pode ajudar a diminuir a evitação.

Assim, gerenciar essas emoções numa separação não é fácil, mas é possível. Para aqueles que lutam com a ansiedade, buscar apoio em amigos, família ou profissionais pode ser de grande ajuda. Já para quem tende a evitar seus sentimentos, aprender a se abrir e se conectar emocionalmente com os outros, talvez até em um ambiente terapêutico, pode ser muito benéfico.

Desta maneira, compreender como a ansiedade e a evitação afetam nossa experiência do divórcio é crucial. Esses insights não apenas facilitam a transição, mas também podem levar a um crescimento pessoal mais profundo e a relações futuras mais saudáveis. É importante lembrar que buscar apoio profissional e social adequado pode ser fundamental para percorrer por essas experiências de rupturas tão complexas.

O divórcio desencadeia um complexo processo de adaptação emocional, influenciado tanto por processos normativos quanto por diferenças individuais. Esta jornada envolve uma reavaliação das percepções e crenças sobre a experiência da separação, facilitando a criação de novos significados e a adaptação cognitiva.

Portanto, o divórcio não é apenas o fim de um capítulo, mas o início de um processo de autodescoberta e crescimento pessoal. As interações entre as dimensões interpessoais e intrapessoais, enquadradas pela Teoria do Apego, abrem caminho para uma compreensão mais profunda. Olhando para o futuro, é essencial explorar ainda mais estas dinâmicas, visando um melhor suporte e estratégias de adaptação para aqueles que enfrentam as dificuldades oriundas de um divórcio.

Observação: Este artigo visa oferecer uma compreensão mais clara do que acontece emocionalmente durante um divórcio, com base na Teoria do Apego. Ele destaca a importância de entender nosso próprio comportamento e emoções neste momento desafiador, proporcionando estratégias práticas para lidar com a ansiedade e a evitação. O objetivo é ajudar as pessoas a se adaptarem a essa nova fase da vida de uma maneira saudável e positiva.

Autora:

Maria Ramim

Neuropsicóloga e Neurorreabilitadora de lesões e transtornos neurológicos e neuropsiquiátricos

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