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segunda-feira, 6 de maio de 2024

Críticas sociais e heranças escravocratas: uma análise de “Pai contra mãe” de Machado de Assis

O presente texto trata de uma análise crítica do conto “Pai contra mãe”, de Machado de Assis. A obra oferece elementos que contribuem para o desenvolvimento da literatura brasileira, repleto de críticas e reflexões que caracterizam o conto como atemporal. Diante do exposto, a tese analítica do texto aborda a importância do autor e da obra em seu contexto histórico, além da observância sobre as características dos seus elementos de composição, alinhado com os conhecimentos adquiridos ao decorrer das unidades da disciplina.

O conto “Pai contra mãe”, de Machado de Assis, foi publicado em 1906 no livro “Relíquias da Casa Velha”, cerca de dezoito anos após a abolição da escravidão no Brasil. Está inserido na segunda fase realista machadiana. Assim, percebe-se o forte traço de uma crítica social, comum às narrativas realistas. O autor efetua um retrato social da época e considera as memórias da escravatura.

Machado de Assis (1869-1908), foi um dos mais importantes escritores literários brasileiros. Considerado o difusor do Realismo no Brasil, com a publicação da obra realista “Memórias póstumas de Brás Cubas”, em 1881, Machado se destacava em sua produção por demonstrar seu desapontamento com a estética romântica e o conservadorismo que a apresentava. As principais características de suas obras são a ironia, ceticismo, metalinguagem, diálogo objetivo com o leitor e forte crítica social – destaca-se a crítica à burguesia.

A história do conto se passa no Rio de Janeiro, nos fins do Segundo Império. É narrado em terceira pessoa e, estabelece com o leitor, contato em um tom melancólico e muitas vezes irônico, para mostrar a dura realidade dos escravos.

Cândido Neves, um homem com pouco trabalho, decide caçar escravos fugitivos durante a extrema crise econômica. Quando seu filho está prestes a se entregar a “Roda dos Enjeitados”, Cândido descobre uma escrava fujona, logo, a entrega para o seu dono de quem recebe o dinheiro como recompensa e, ao entregá-la, a escrava é vítima de um aborto devido ao confronto e a brutalidade. Apesar de testemunhar o ocorrido, Cândido retorna para a casa feliz e livra o filho da roda dos enjeitados. Dessa forma, recebe o perdão de Tia Mônica.

O tema central da obra é a escravidão, observável no início do conto em que Machado afirma: “A escravidão levou consigo ofícios e aparelhos, como terá sucedido a outras instituições sociais”(p. 01). O autor retrata com riqueza de detalhes a crueldade vivenciada pelos escravos, além das principais formas de tortura, como no trecho: “O ferro ao pescoço era aplicado aos escravos fujões” (p. 01). A partir dos primeiros trechos é possível compreender o cotidiano violento vivenciado por milhares de pessoas escravizadas.

A partir da introdução descritiva feita pelo autor, ocorre o desenvolver da narrativa. Então, é notória a presença dos personagens e suas particularidades.

Iniciando pelo personagem de Cândido Neves, um homem carrasco ao capturar escravos fugidos, entretanto, demonstrava ser um homem ponderado diante da família; Clara, mulher de Cândido e sobrinha de Mônica, era uma mulher que desejava lutar pelo filho, no qual seria entregue à Roda dos Enjeitados, mas não conseguia, devido as suas financeiras; Mônica, que criou a sobrinha órfã e sempre temeu por uma gravidez devido à situação de penúria financeira que vivia e, por fim, Arminda, uma escrava gestante, fugida das crueldades, torturas, submissão, entre outras barbaridades que sofria por ser uma escrava.

Ironicamente, o narrador diz que os escravos fugiam porque eram muitos e que “nem todos gostavam da escravidão […] nem todos gostavam de apanhar pancada”. Em vista disso, é notável que há a presença do humor sombrio, típico das obras machadianas. A fala ao final do texto é bastante profunda: “Nem todas as crianças vingam”(p. 11). Dessa forma, o ser humano constrói as justificativas para os seus gestos mais baixos, suas atitudes mais reprováveis. Além da forte crítica ao sistema escravocrata, também há a presença da crítica em relação ao sistema capitalista. Enquanto Arminda e seu filho são vítimas do primeiro, Cândido e sua família são vítimas do segundo. Dessa forma, torna-se complexo julgar os personagens, tendo em vista que, de alguma forma, todos são vítimas de um sistema.

Conclui-se, portanto, que o conto “Pai contra mãe”, Embora publicado em 1906, mesmo escrito após a abolição da escravidão, é facilmente conectado com a contemporaneidade, onde ainda perpetuam os resquícios da escravidão e os demais problemas sociais e, consequentemente, resulta na ausência de direitos da população negra.

BIBLIOGRAFIA

ASSIS, Machado De. Pai contra mãe. 1906. Disponível em: http://www.dominiopublico.gov.br/download/texto/bv000245.pdf. Acesso em: 12 de março, 2023

MARINHO, Fernando. Realismo no Brasil; Brasil Escola. Disponível em: https://brasilescola.uol.com.br/literatura/realismo-no-brasil.htm. Acesso em 12 de março, 2023.

GUIMARÃES, H. de S. Machado de Assis, o escritor que nos lê. São Paulo: Editora Unesp, 2017.

ALENCASTRO, L. F. de. Pai contra mãe: o terror escravagista em um conto de Machado de Assis. Disponível em: http://www.freud- lacan.com/articles/article.php?url_. Acesso em: 10 de março, 2023.

KOBS, Verônica Daniel. CRÍTICA SOCIAL E PERMANÊNCIA NO CONTO ‘PAI CONTRA     MÃE’,     DE     MACHADO     DE     ASSIS.     Disponível em:

https://recortelirico.com.br/2018/veronicadanielkobs/pai-contra-mae-de- machado-de-assis/. Acesso em: 10 de março, 2023.

Autor:

Rodrigo Barbosa de Souza

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