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quarta-feira, 24 de abril de 2024

O caminho é a educação

Não há como não me chocar e entristecer com realidades como a revelada pela Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD): Pessoas com Deficiência 2022. A taxa de analfabetismo no Brasil entre as pessoas sem deficiência no terceiro trimestre do ano passado era de 4,1%. Já entre as pessoas com deficiência era de 19,5%. Quase 20%!

Uma pessoa analfabeta em pleno século XXI é inadmissível. É muita gente! A mesma pesquisa PNAD estimou que a população com deficiência no Brasil é de 18,6 milhões de pessoas de 2 anos ou mais, o que corresponde a 8,9% da população dessa faixa etária. É muita gente! Muita gente que não tem as ferramentas básicas para se inserir na sociedade e ter uma vida digna. Estamos vivendo uma revolução tecnológica e esse contingente de pessoas está excluído deste processo.

Nós, do projeto Enxergando o Futuro, que ensina braille a distância e de graça a pessoas com deficiência visual, enfrentamos dificuldades de toda a ordem, mas mantemos o projeto em pé. O projeto nasceu em 2019, na minha cidade, Duartina (SP), de forma presencial logo após eu, uma mulher atualmente com 10% de visão, ter aprendido braille e constatar a importância de saber o sistema de leitura dos pontos. Veio a pandemia e, então, precisamos encontrar uma alternativa para continuar.

Adotamos uma plataforma online e hoje temos alunos de todo o Brasil e até do exterior estudando braille no Enxergando o Futuro. Para isso contamos com uma equipe de voluntários. Após efetuar a matricula, o aluno é adicionado a um grupo de WhatsApp com, no máximo, 20 participantes. Ali, eles recebem todo o apoio e orientações dos voluntários para entrar na plataforma on-line do Enxergando o Futuro.

O curso é feito em módulos em três módulos. No módulo 1, os novos alunos recebem conteúdos de áudio e vídeo para aprender a produzir as celas pré-braile artesanalmente. As celas são confeccionadas em espuma vinílica acetinada (E.V.A), tampas de garrafas, bolinhas de gude ou de papel, que serão utilizadas durante todo o curso. Nesta etapa, o aluno pode precisar de um vidente (família ou amigo) para assistir aos vídeos que ensinam a fazer as celas pré-braile e, então, ajudar o novo aluno a fazer o material pedagógico.

Quando todos do grupo estão com o material pedagógico pronto (as celas pré-braile), as administradoras iniciam a liberação dos módulos para que os alunos aprendam a ler em braile. A cada módulo, aprendem as primeiras letras em braile, as primeiras sílabas, a formarem as primeiras palavras. A plataforma do Enxergando o Futuro, por ser uma tecnologia para acessibilidade, descreve em áudio o passo a passo para que os alunos executem as atividades.

À medida que vão finalizando as atividades, os alunos são orientados a postar em foto e vídeo o que fizeram no grupo para que os administradores do projeto façam as correções. Há, inclusive, o passo a passo de como fazer foto e vídeo para os alunos que eventualmente não estejam familiarizados com esses recursos.

Assim, conforme a alfabetização pelo método progride, inicia o módulo 2. Neste módulo, os alunos vão ter contato com a prancheta, outro material pedagógico que consiste em regletes negativas (folha de um papel mais espesso que o sulfite) e a punção (espécie de pinça para furar o papel e, assim, escrever em braile). Primeiramente, os alunos vão colocar em prática o que aprenderam com o material pedagógico reciclável e ler as palavras escritas em braile nas regletes. Esta é a etapa de desenvolver o tato.

A próxima etapa é começam a escrever em braile usando a reglete e a punção. Da mesma forma, os alunos seguem postando suas atividades na plataforma para correção das administradoras. Ao entrar num estágio mais avançado, os alunos entram no módulo 3. Cada um recebe uma apostila em braile. Nesta etapa, as aulas são individuais e por vídeo por meio da plataforma Zoom para que cada um exercite o aprendizado nas modalidades leitura e escrita. Em média, os alunos levam dois anos para concluir o curso.

Recentemente, mais uma turma concluiu o curso. Foram 13 pessoas, de várias partes do Brasil, que aprenderam o sistema tátil de leitura. Com certeza, o braille vai facilitar e melhorar suas vidas.

Nós, do Enxergando o Futuro, seguimos lutando por educação de qualidade para todos e que o braille um dia seja também disponibilizado na rede pública de ensino! A educação é a forma mais rápida e simples de transformar a vida de uma pessoa, de uma comunidade e até de um país. É um dos pilares mais importante na construção de um mundo melhor, que é o que todos nós buscamos. Ela é primordial na vida de todos, inclusive na dos deficientes.

Autora:

Daniela Reis Frontera é empresária, mulher de baixa visão, paratleta e palestrante. É a idealizadora do projeto Enxergando o Futuro, que ensina braille de graça e a distância por meio de plataforma online.

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