Aos 5 anos de idade já entendia que ser bobo vem do ser. Sim, ser! Jamais consegui expressar o que é ser bobo. Mas, refletia muito. Um turbilhão em minha mente que não transpassava para a fala. Ficava ali, pela caixa craniana mesmo.
Mas, num sábado ensolarado, no dia 9 de setembro de 2023, preparava-me para dar aulas sobre independência do Brasil. Ao arrumar minha bolsa para sair de casa, peguei meu estojo, caderno de anotações e, lá estava ele em cima da minha cabeceira de cama. Um box que eu comprara de livros da Clarisse Lispector. Selecionei “Clarisse na cabeceira. Crônicas”. Já havia garantido minha distração no metrô-Rio.
Fui lendo e lendo… Li “Banhos de mar”, “come, meu filho”, “Mineirinho”, “por detrás da devoção”, “perfil de um ser eleito” e lá estava ele, o danado: “Das vantagens de ser bobo”. Oi? Vantagens? De ser bobo? Será que Clarisse também acha que ser bobo é bom?
Logo, voltei à minha infância, mais específico, em falas de meu progenitor. “Você é muito bobo, muito burro…” “Você tem que ser mais esperto. Senão, nego vai te engolir lá fora” “Anda direito”, “come direito”, “Presta atenção”, “Isso está errado”, Você tem que ter maldade”, “o mundo é maldoso”, “Lá fora você vai apanhar!”.
Mesmo convivendo com essas falas e ações coercitivas exigindo mudanças no ser, eu sentia que ser bobo era apenas ser. Eu vim assim, era essencialmente assim. Era meu jeitinho de ser.
Mas, o que é ser bobo? Ao invés de ambições, ver o pôr do sol e sentir o vento batendo em todo o corpo, assim, vendo, ouvindo e tocando o mundo. Nunca esperar o pior das pessoas. Acreditar nas pessoas. Ser ingênuo. Liberdade e sabedoria para viver. Ser dotado de boa-fé, priorizar paz, estar em estado de tranquilidade, viver num mundo criativo idealizado, montado e organizado por si mesmo. Ser bobo é reconhecer que não se sabe sobre tudo, mas buscar sempre saber, ser bobo é ser amável, é ser amado e em troca amado ser, ser bobo é ser leve, ser sonhador, ser bobo é potencializar suas virtudes, mesmo que elas não sejam bem-vistas nesse mundo. Ser bobo é um ato de resistência, coragem, autenticidade, amor. Ser bobo é vencer e nem notar que venceu. Ser bobo é ser autêntico por ser o que se é. Ser bobo é ser.
Autor:
Emanuel Avila
