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sexta-feira, 26 de abril de 2024

Como você se sente tendo os sonhos de outras pessoas em suas mãos?

Com prefácio de Losanges Lozano, Contos para Cassandra, dedicado à escritora Cassandra Rios, reúne dez contos com a temática de fundo que consagrou a autora paulistana, a homossexualidade feminina. Não se trata de um livro erótico, mas com ênfase na afetividade numa homenagem à artista das letras falecida em 2002, sendo também um gesto contra o preconceito e a discriminação, pois todos têm o direito de viver numa sociedade em que sejam respeitados em sua existência e particularidades.

Cassandra Rios é uma dessas artistas que demonstra incrível coragem, criatividade e influência, sendo a escrita sua forma de luta. Quem não conhece sua obra pode se encantar com as dezenas de títulos que marcaram época e a consagraram no mundo das letras.

Os livros de Cassandra expressam o preconceito do qual era vítima e falam de amor, da atração que uma pessoa exerce sobre a outra, o processo de se interessar, enamorar. E o maior desejo de Cassandra Rios era ser lida: “Não quero receber troféus, honrarias ou méritos. Quero ser lida, mesmo que não gostem”.

O que mais seduzia em Cassandra era tratar o relacionamento entre mulheres como algo natural e não exótico ou ousado. Em seus romances a mulher era sujeito da própria história e a melhor forma de apresenta-la às novas gerações é sugerir a leitura de seus livros e assim o conhecimento de sua capacidade de criação e talento literário. Houve momentos na história em que apenas a arte e a ficção estiveram ao lado da mulher e a obra de Cassandra Rios se destaca muito além do preconceito e perseguição pela ditadura militar.

Com sua literatura simples, Cassandra Rios fez um retrato comportamental da sociedade da época, sendo a primeira autora a abordar de forma aberta o amor entre mulheres e falar de mulheres que sentiam desejo de um modo que mais ninguém ousava. Alvo preferencial da censura teve 70% dos seus livros publicados proibidos até 1974, numa tentativa de calar sua voz e apagar seu legado. O Estado considerava sua obra pervertida, desvio que devia ser combatido e foi um período em que as minorias viam em Cassandra uma oportunidade de obterem visibilidade na ficção. A escritora quebrou padrões e mostrou existirem leitores ávidos por conteúdo inovador mesmo quando a política e a cultura não se mostram favoráveis a avanços.

Seria extenso abordar aqui sua biografia, seus livros, a censura da qual foi vítima, seu sucesso, sua ousadia com assuntos que eram imensuráveis tabus ou sua importância para que minorias vivam hoje suas liberdades assumidas. Preferível ler seus livros. Cassandra Rios continua e será sempre sinônimo de mulher marcante, corajosa, lutadora, forte e inspiradora em todos os lugares.

Contos para Cassandra não aborda o universo ou a realidade das mulheres que amam mulheres, optando pela ficção onde o tema surge naturalmente apresentando personagens em histórias para um público irrestrito.

O autor considera essa leveza apropriada, ainda que a geração jovem veja o tema sem problemas e a geração mais madura, hoje com uma melhor compreensão. O preconceito ainda não envelheceu em nossa sociedade, não há como camuflá-lo nem o que tudo isso gera às pessoas e famílias, mas ao menos na literatura houve avanços que permitem o assunto ser abordado com naturalidade. Cassandra Rios tinha na escrita sua forma de luta e enquanto houver uma pessoa que seja perseguida, que não seja respeitada, a luta continua. Esse livro é um passo para produzirmos em nossa cultura e sociedade um gesto contra o preconceito e a discriminação. É ficção, mas quem sabe algum dia seja normal para todos andar de mãos dadas com quem se ama.

Pedidos com o autor (acsmiguelpicoli@gmail.com); Preço: R$ 25,00; Páginas: 138; Formato: 16 × 23 cm; Acabamento: Brochura; Editora FoxTablet.

Autor:

Miguel Arcangelo Picoli

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