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terça-feira, 23 de julho de 2024

O golpe está em curso

Esqueçam a narrativa da “possibilidade de golpe”, porque, infelizmente, o golpe já está em curso. A reunião do presidente com os embaixadores no Palácio do Alvorada, na tarde do último dia 18, não deixa qualquer margem de dúvida.

O TSE trabalha sob constrangimento porque, justamente, existe uma possibilidade nada desprezível de ruptura democrática atrás dos seguidos ataques do presidente à legitimidade do processo eleitoral brasileiro.

No começo de junho Bolsonaro anunciou em live que eles irão à guerra, caso precisem. Eles quem?

Não ele, com certeza, talvez nem as Forças Armadas diretamente (talvez), mas não custa lembrar que os setores sociais favoráveis ao seu governo já vêm se preparando para cenários de conflito há alguns anos. Sua base de apoio orgânica passou por um processo de depuração significativo de 2013 para cá.

A morte do petista Marcelo Arruda, antecedida por dois ataques à bomba, para além de todas as análises possíveis, sinaliza que a violência política se ampliou desde as últimas eleições.

O afastamento da delegada responsável por investigar o caso, Iane Cardoso, pelas mesmas práticas odiosas que o assassino de Marcelo Arruda, Jorge Guaranho, cometia nas redes sociais, e o suicídio do funcionário da Itaipu, Claudinei Coco, diretor da associação onde ocorreu a festa, deixaram dúvidas que, infelizmente, não se encerram no caso.

O Ministério Público e a Polícia Civil do Paraná estão investigando se há relação entre a morte de Marcelo e o suicídio de Claudinei, se houver, tudo leva a crer que exista uma rede organizada por pessoas dispostas a promoverem a guerra anunciada por Bolsonaro.

Se existem pessoas, existem organizações, se existem organizações, qual o papel dos agentes de Estado dentro das mesmas?

Cabe aos responsáveis investigarem.

***

Pois bem, se houver qualquer tentativa de ruptura democrática, tudo leva a crer que se dará ainda no primeiro turno. Algumas circunstâncias indicam isso:

  1. – Os prognósticos apontam que Bolsonaro não tem possibilidades de vencer Lula em nenhum cenário eleitoral apresentado, aliás, demonstram que o petista tem chances reais de vencer ainda no primeiro turno. Bolsonaro está ciente disto, as Forças Armadas também.
  2. – Algumas agências noticiaram que no dia 8 de julho o presidente deu uma declaração reafirmando que os militares devem se preparar para eventuais conflitos internos diante de um cenário que o país seja entregue “à outra ideologia”, ou seja, em caso de derrota. Mas por que os militares devem se preparar?

Não é papel das Forças Armadas intervir em conflitos senão sob circunstâncias muito bem delimitadas pela lei.

Declarações dessa natureza deixam outras dúvidas, haverá conflitos?

Como Bolsonaro sabe?

Aliás, o que o presidente sabe que nós não sabemos?

Se o presidente afirma categoricamente que existe possibilidade real de conflitos durante as eleições, isso indica que existe uma estimulo às hostilidades contra adversários políticos a fim legitimar o uso da força.

*Não é necessário dizer que o presidente da república também é o chefe das forças armadas*

– Declarações anteriores demonstram que tanto Bolsonaro quanto as FFAA não têm nenhum pudor em passar por cima do Estado de Democrático de Direito. Para as FFAA Bolsonaro é seu comandante “natural”, dado que o presidente é um militar. Mourão, inclusive, afirmou que as Forças Armadas “não respeitam” Lula, então… –

  • – Todo os discursos contra as urnas eletrônicas não são contra as urnas em si, mas contra o sistema democrático como um todo. O histórico das forças armadas latino-americanas, especialmente as brasileiras, demonstram que os militares não têm qualquer apreço por sistemas políticos de representação popular, seja qual for o modelo.

*Bolsonaro, no dia da morte do ex primeiro-ministro japonês, Shinzo Abe, afirmou com todas as letras que, para seu governo, os inimigos do Brasil são “internos”, uma espécie de macarthismo requentado que tem como alvo os insatisfeitos com seu governo*

*Em 64 não existiam urnas eletrônicas, por exemplo, e mesmo assim o sistema de representação foi questionado pelos militares, então, atrás de toda a narrativa do presidente, existe um desapreço profundo à democracia*

  • – Se as tentativas golpistas do último 7 de setembro não lograram êxito, é bom não subestimar as possíveis tentativas deste ano. Em 2022 a Independência completa seu bicentenário e, depois de dois anos de pandemia, os grandes desfiles militares voltarão a acontecer a menos de um mês do primeiro turno (talvez sejam os maiores que já tivemos).

*A data é simbólica para os apoiadores do presidente, que já começou convocar sua base de apoio para manifestações durante o evento*

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É IMPOSSÍVEL PREVER

Mas desde meados do último semestre que alguns analistas alertam para a necessidade de todos os setores comprometidos com a democracia, organizações de classe e movimentos sociais irem às ruas durante o processo eleitoral.

Ciro Gomes, logo após a fatídica reunião de Bolsonaro com os embaixadores, também reafirmou essa necessidade.

Não há o que se discutir, isso deve ser ponderado com a seriedade que o assunto demanda.

***

Até o momento o único impacto sensível do patético espetáculo do presidente da república e seus generais, foi o de submeter o Brasil ao escárnio internacional, além de colocar o país, líder econômico regional (e uma das maiores economias globais), ao constrangimento diante dos seus pares.

A reunião do dia 18 também demonstrou que a inépcia das instituições responsáveis por imputar medidas mais severas contra ações dessa natureza, é uma reorganização de forças. O TSE e a PGR, ainda que não estejam falando a mesma língua, estão tentando se articular de maneira apropriada para a situação. Já que não existem precedentes de atos semelhantes cometidos por um chefe de Estado.

*As bravatas do presidente, devidamente refutadas pelo TSE, não convenceram a diplomacia internacional, a carta da embaixada dos EUA, publicizada no último dia 19, foi enfática. O corpo diplomático estadunidense reafirmou que as potências ocidentais não enxergam com bons olhos um golpe militar no maior país da América Latina*

As duras críticas que o presidente sofreu da sua base de apoio demonstram que a reunião do presidente o isolou ainda mais. O generalato brasileiro nos envergonhou internacionalmente ao transformar a mentira em prática diplomática, um vexame que seus apoiadores menos fanatizados não estão dispostos a passar.

Apesar de Bolsonaro ter um histórico de rejeição junto a maioria dos líderes Ocidentais. A repercussão dos últimos eventos cristalizou a imagem do brasileiro como uma espécie de caudilho populista grosseiro, inconveniente e mentirosos. Persona non grata entre aqueles que apreciam a democracia.

A postura antidemocrática do presidente já motivou uma série de ações contra o mandatário, que já é vítima de inquérito no TSE, que o investiga por divulgação de informações fake news, desde agosto do ano passado. Todavia, por mais que seja importante, é fundamental estar consciente de que qualquer medida contra o presidente não acontecerá em prazo útil até as eleições.

Assim sendo, só existe uma força que pode, neste momento, barrar qualquer tentativa de ruptura democrática.

O povo nas ruas.

Nada mais, nada menos. Afinal, existe um golpe em curso.

Autor:

Elenilton Cunha 

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