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sábado, 27 de julho de 2024

Apropriação cultural e bom senso

“Isso é apropriação cultural”, foi o que eu ouvi a poucos dias quando disse que já tinha colocado tranças (box braids). O que me fez ter ouvido essa sentença, é porque sou uma mulher branca de cabelos cacheados. O que literalmente não significa nada, tendo em vista o fato de ser eu uma brasileira.  

O Brasil é formado por um povo miscigenado, uma mistura de vários povos de regiões diferentes do mundo. E, como baiana, possuo sim ascendência negra, o que é o mais provável, afinal, é no nordeste que se concentra a maior população negra do Brasil. 

Precisa- se estudar muito pouco de genética pra entender que cada traço do nosso corpo é formado de acordo com genes escolhidos dos nossos pais, porém, de maneira aleatória. Meu pai carrega traços dos seus bisavôs, os quais passou para mim, posso não expressar, mas meu filho pode herdar e configurar seu fenótipo. Assim é para a cor dos olhos, altura, patologias e também para cor da pele e textura dos cabelos. As características do genótipo negro é dominante, mas não é excludente. 

Não preciso fazer um teste de ancestralidade pra entender que a cor da minha pele e a textura dos meus cabelos não exclui minha origem genética de povos negros. Não preciso ir muito longe pra entender que sou descendente de negros, índios e brancos, mas com um teste de ancestralidade poderíamos ver que muitas pessoas com fenótipos afros possuem menos origem étnica de povos negros do que uma branquinha de cabelos lisos e nariz fino. 

E isso não é motivo nem de honra nem de desonra, somos um povo, brasileiros, seres humanos, segregar negros de brancos agora, não será nada diferente do que foi feito a décadas atrás. Não precisamos fazer um novo apartheid, em um novo contexto e de uma nova forma na história. 

De acordo com o mestre em antropologia, Messias Basques: “Apropriação cultural ocorre quando tomamos para nós aquilo que originalmente pertencia ao mundo e ao dia a dia de outras pessoas. Mas sem que haja um interesse em ouvir, dialogar e aprender com essas mesmas pessoas sobre os usos e costumes relacionados às coisas que despertam o nosso interesse.”

Então, vivemos em mundo globalizado, onde o comum está sendo o entrelaçamento entre os povos, de costumes e culturas, até de vírus mortais. Não há como andar pelas ruas de uma grande metrópole no Brasil e não encontrar comida japonesa. Estrangeirismo no Brasil é algo tão usual como chamar um cachorro quente de hot dog.  A moda, os negócios, os relacionamentos e até mesmo a religião, tudo está sendo influenciado e compartilhado. O Islamismo é uma religião do Oriente Médio, no entanto, no Brasil, existem mais de 1 milhão de mulçumanos, e não são apenas pessoas oriundas ou descendentes de países mulçumanos, mas brasileiros conversos a esta religião. Seria essa uma apropriação religiosa? 

Os termos, costumes e sentenças deveriam passar pelo crivo do bom senso. Quando não usados com clareza, rótulos não servirão para definir, mas para segregar. 

Não culpo quem me disse tal coisa, sei que é, como muitos, repetidores de opiniões alheias, destituído de entusiasmo por opiniões próprias mediante diligente análise. 

Autora:

Ellen Tavares

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