Encontrei um amigo no barzinho que fica em frente à universidade. Eu, sóbrio (não bebo), e ele completamente bêbado. Parou-me e me pegou de conversa. Forneceu amigavelmente uma cerveja, mas recusei educadamente, pois não frequento mais esse ambiente – apesar de não ir, escrevi uma crônica a respeito desse mesmo bar. Mas é assunto para outro dial. Vamos ao que interessa.
Estava descendo da universidade para ir embora quando esse caro amigo me chamou para conversar. Ele estava sentado na mesa, acompanhado de colegas e de uma loura gelada – bom para passar o tempo, combinando com o ambiente. Quando ele me parou, perguntou-me: “Cara, vejo suas postagens em redes sociais acerca dos livros que lê. Não tem nenhum para me indicar aí, não? Aquele da capa azul, como chama? Nelson Rodrigues, não é? É bom mesmo? Indicações vindas de você são obrigatórias e muito bem-vindas!” Respondi, no momento, que Nelson Rodrigues é um autor indispensável, como dramaturgo e cronista.
Nesse dia, eu queria voltar para casa a fim de fazer minha leitura noturna e escrever alguma crônica. Estava, no entanto, sem ideias para escrever. Elas não surgem do nada, mas de minhas observações do dia a dia. Todavia, elas fugiram de mim. Talvez se tenham cansado de estarem em minha cabeça cheia delas, pois não havia mais espaço para que se acomodassem bem. Se eu as expulsei? Claro que não! São ótimas inquilinas que trabalham para mim diariamente. Não ficam um dia sem serviço, quando ainda estavam aqui… Esse ofício exige muito da mente, o de escrever. Mas a minha já se encontra exausta – bastante, para ser franco com os senhores.
E quanto ao barzinho com meu grande amigo? Já estava me esquecendo! Bom, no caso que aqui relato, é da noite de uma quinta-feira fria. Eu compreendo o meu caríssimo amigo que, sentado na mesa de um bar e tomando uma cerveja, precisou aguardar seu ônibus voltar. Mas sobre o que eu escreveria sobre esse dia, exatamente? Nada no dia a dia me motiva a tanto. Tudo parece preto no branco – acordar, escovar os dentes, almoçar, ir ao trabalho, depois à faculdade e retornar para casa. Que inspiração surge dessa monotonia, meus caros? É tudo linear. A vida parece retilínea: nascemos, crescemos e morremos. Creio que estou indo para a morte. Por isso a vida perdeu sua cor – estando agora cinzenta. Não a vejo mais como anteriormente.
Voltemos ao bar, pois meu fluxo contínuo de pensamentos parece estar cansando vocês. Enquanto eu estava na companhia dos meus livros e ele de uma loura, linda, maravilhosa, que me recordo dos velhos tempos da noitada: gelada e com sabor amargo – sentia-o na boca, começando a amargar e finalizando com o seu doce, que deixa o sujeito fora de si, bastante louco. Essa loira de que falo é perigosa, uma femme fatale. Personificação semelhante a uma mulher: enlouquece-nos como ela, deixando-nos desvairados, deslumbrados.
Meu Deus, um breve encontro com um grande camarada me fazendo ter devaneios! O ambiente do bar, com uma caixinha de som tocando música agradável, o aroma da cevada no ar e o gosto que não senti diretamente, mas pela empatia com meu colega que, sorvendo-a demasiadamente, fez-me sentir o seu amargor que nos faz, de início, fazer uma careta e – depois de uma, duas, três goladas – cantar loucamente e de maneira estridente como Kurt Cobain, dançar como um boneco de posto de gasolina (movendo os braços e chacoalhando o corpo todo de alegria) e conversar sobre quaisquer coisas. Para bêbado, qualquer assunto é válido.
Depois de passar uns bons minutos – que mais pareciam horas, pois passaram rapidamente – minha carona chegou e fui para casa. No caminho, pensava no meu amigo que aguardava o ônibus e, para passar o tempo, estava acompanhado de uma loura gélida, que o aquecia nessa quinta-feira fria como a cerveja que ele tomava. Tive que dizer adeus. Mas, como diz um escritor: “Dizer adeus é morrer um pouco.” Morri um bocado nesse dia. Há amigos que são eternos e dignos de serem homenageados – como nesta crônica.