Se Friedrich Nietzsche, esse velho sabotador de ídolos, despertasse de seu sono trágico e passeasse pelos corredores ensurdecedores do Brasil contemporâneo, provavelmente riria alto — um riso daqueles que não pedem licença, mas ferem como chicote. Afinal, o filósofo que denunciava o rebanho moral e as ilusões da fé encontraria, em pleno século XXI tropical, um espetáculo digno de circo romano: um “mito” que se erige como novo profeta, conduzindo massas hipnotizadas pela retórica do ressentimento.
Que ironia sublime: Nietzsche, o inimigo declarado dos falsos profetas e do cristianismo domesticador, toparia com um messias de bermuda, cercado não de discípulos da grandeza, mas de soldados do WhatsApp, ungidos por correntes de fake news e alimentados por um moralismo que é só máscara para a mais densa mediocridade. Eis a vontade de poder reduzida a corrente de zap — eis o eterno retorno transformado em corrente de pix para apoiar “o mito”.
Nietzsche talvez diria, com seu sarcasmo corrosivo, que o bolsonarismo é a prova viva de que a humanidade, em vez de caminhar rumo ao Übermensch (além-do-homem), resolveu retroceder ao Homo WhatsAppensis (o homem-domado-do-zap). Uma malta que confunde virilidade com berros, força com grosseria, e profundidade com slogans repetidos como mantra. Que gado curioso! Até para ser rebanho, falta elegância…
Ah, e como Nietzsche adoraria destrinchar a teatralidade cristã do bolsonarismo: pastores aos berros, deputados beijando bíblias entre uma rachadinha e outra, e fiéis exaltando moralidade enquanto aplaudem a necropolítica. O filósofo, que denunciava a mortificação da vida em nome de um além-mundo fictício, veria aqui a tragédia de um povo que prefere cultivar seus salvadores farsescos a afirmar a vida em sua crueza e potência.
E o que dizer do “mito” em si? Nietzsche, olhando para Bolsonaro com sua típica compaixão cruel, talvez visse não um super-homem, mas um boneco inflável político, inflado pelos sopros da ignorância coletiva e esvaziado de qualquer projeto que transcenda o trivial: memes, armas e ressentimento. Que Nietzsche o chamaria de “síntese escandalosa da má consciência tupiniquim” não é difícil supor.
No fundo, Nietzsche riria — riria até chorar. Pois o espetáculo é tragicômico: multidões clamando por libertação enquanto ajoelham diante de mais um falso profeta; um povo que, em vez de criar novos valores, recicla o entulho de velhas moralidades ressentidas.
Não, o Brasil nietzschiano ainda não chegou. Seguimos presos à roda de mulas moralistas, parindo ainda mais ressentimento e nostalgia de ditadores. Mas talvez, quem sabe, o riso de Nietzsche seja justamente a chave de saída: rir do “mito”, rir do gado, rir da própria tragédia. Pois onde tudo fede a morte, só resta à filosofia gargalhar para sobreviver.
Parabéns, uma crônica concisa sintetizando o surgimento de mais um pseudo ídolo da direita, em nosso pais, onde boa parte dos votantes, veneram falsos profetas… só dando uma gargalhada, rir é pouco!