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sexta-feira, 3 de maio de 2024

Walküren – As Três Marias

Capítulo Sessenta e Um

– Eu queria saber onde Epimeteu e Prometeu estavam com a cabeça quando criaram vocês, criaturas mortais…

Anhangá olhava para Juvêncio e Matilde, quando disse isso…

– E vocês, Moiras, por que os estão protegendo?

– Porque ainda não é a hora do embate entre vocês… Eles entraram em paz em seu reduto…

– Verdade… estão desarmados… pelo nosso código, não posso fazer nada contra eles… 

– Sabe que não confiamos em você…

– Por quê?  Eu sei que não posso contradizê-las…

– Mas você está com fome… e a fome é péssima conselheira…

– Você sabe que eu adoro os humanos…

– Sim, servidos no altar, não é mesmo?

O ente olhou maliciosamente para Graça….

– Me diga uma coisa, Átropis…. você vai cortar a linha desses mortais?

Rosa respondeu rispidamente a ele, enquanto Graça permaneceu calada, lançando lhe um olhar gélido…

– Cale-se, Cronos… sabe que não nos é permitido discutir assuntos do Olimpo na presença de mortais.
– Mas esse é um assunto que me interessa…de repente, eles podem ser meu repasto desta noite….

Desta vez é Izabel que resolve intervir…

– Cronos, não se esqueça de quem somos e o que podemos fazer…

– Eu jamais esqueceria, adorável Cloto…

– E se você não nos obedecer, acabará em Hades, tenha certeza disso….

– Calma, Átropis… você pode ter o poder de vida e morte sobre os humanos, mas comigo a coisa é diferente…

Desta vez estava respondendo a Graça, que havia lhe chamado a atenção… Rosa resolveu falar, também.

– Cronos, você sabe que nosso poder é maior que o seu. Então, façamos o seguinte… fique tranquilo, e apenas nos escute…

– E o que teria para me dizer, oh, doce Láquesis?…

– Rosa riu alto… gargalhou, na verdade. Juvêncio e Matilde se espantaram, pois nunca haviam visto a professorinha rir daquela maneira. Tudo bem, Matilde não a conhecia, mas Juvêncio, sim… e realmente ficou espantado com a reação da mesma…

– Cronos… escute com atenção… nós vamos deixar os mortais andarem livremente por seu Santuário. E você nada fará contra eles…

– Me dêem uma boa razão para isso…

As três moças dirigiram um olhar gélido para o ente…que ficou petrificado por alguns segundos. Então olhou novamente para o casal e acentiu com a cabeça…

– Tudo bem, tudo bem… não posso quebrar a ordem das coisas… mas saibam que estou com muita fome.

– Seus dias de caça terminaram, você sabe disso.

– Não, eu não sei. Estou a milênios nesse plano e sempre tive liberdade para colher meu alimento…

– Mas seu ciclo se encerrou. Você retornará a Hades. Sabe disso.

– Não… eu não sei de nada. E daqui a uma lua retornarei para minha caçada, para aplacar a fome que me devora e poder me recolher ao mundo dos sonhos…

– Você sabe porque trouxemos esse mortal até sua presença?

– Eu deveria?

– Te explicaremos… a muito a ordem do mundo foi subvertida. E esse mortal é a sua Nêmese… será responsável por te enviar ao reino dos mortos…

O ser começou a gargalhar. Era como se tivesse ouvido a maior das piadas. Como as três moiras esperavam que um relés mortal fosse capaz de vencer a ele, um dos deuses criadores do mundo?

Izabel olhou novamente para Cronos e falou…

-Temos muitos nomes, você sabe disso. E fomos convocadas para acompanhá-lo até a morada dos deuses e heróis que passaram deste para o outro plano…

– Outro nome? E qual seria, deusas do destino?

– Alguns povos nos chamam de Walküren… os anjos da morte…

– Que eu saiba, apenas Átropis merece tal alcunha…

– Você não entendeu… Quando o tempo de um campeão… seja ele deus ou mortal… se completa nesse plano… bem… além de tecelãs do fio da vida, também somos aquelas que acompanham essa alma até seu destino do outro lado.

– Você está dizendo…

– Não estou dizendo nada. O que estou te explicando é que o tempo dos deuses antigos nessa terra já passou… e que você em breve terá um embate com esse homem. E levaremos aquele que for derrotado para os eternos campos de caça…

– O Jardim do Infinito?…

– Sim, Cronos… o Jardim do Infinito… e você, como Senhor do Tempo, sabe que não podemos mentir…

– Mas já está decidido que o derrotado serei eu?

– Não. Nada nesse plano é decidido até que tal fato se realize.

– Mas você sabe que tudo que tem início, também tem um fim…

– Você mesma disse que nada está decidido, ainda… portanto, pode ser que meu tempo nesse plano ainda não acabou…basta que o mortal não me derrote.

– Isso a gente não pode te dizer… e você sabe disso…

Cronos olhou para Juvêncio com desdém… agora que o conhecia, saberia como se defender daquele mortal e continuaria nesse plano por mais alguns milênios. Já havia sido expulso dos Campos Elísios uma vez. Não permitiria ser expulso da terra, por nada no Universo. Por ele, acabaria com a ameaça naquele momento mesmo. Mas sabia que tinha suas limitações. Nem mesmo Zeus, Deus supremo do Olimpo, conseguia bater de frente com as Parcas. Portanto, tudo o que ele poderia fazer era obedecê-las… afinal, elas trouxeram seu inimigo até seu templo. Agora ele sabia quem deveria combater.

Juvêncio tinha mil perguntas para fazer, martelando sua cabeça. Porém, desde que colocou os pés naquele recinto, não conseguia pronunciar uma única palavra. Gostaria de responder ao Anhangá… gostaria de perguntar-lhe porque os nativos o chamavam por esse nome. Mas não conseguia articular seus pensamentos. Izabel percebeu seu desejo e resolveu matar sua curiosidade, dando ao deus caído a chance de explicar-se.

– Cronos, poderia explicar à sua Nêmesis porque os nativos te chamam de “Anhangá”?

– Como você, também sou conhecido por muitos nomes. E desde que fui aprisionado nessa terra, de tempos em tempos tenho que saciar minha fome. Eu recebi esse nome dos filhos deste solo quando apareci na primeira vez e fiz minha primeira colheita. Como por acaso minha primeira vítimas eram caçadores, criaram o mito de que eu estava defendendo a natureza. Eu estava me defendendo. Matando minha fome.

– Mas você só ataca de tempos em tempos… por que?

– Oh, isso? É que, depois de algum tempo eu caio em um sono profundo. E só desperto quando a fome volta a atacar…

Juvêncio ficou satisfeito com a explicação. O fato de o monstro cair em sono profundo depois de saciar sua fome era uma boa explicação. Era um vampiro, com certeza. Mas era um vampiro diferente. Que poderia ser morto tranquilamente com balas de prata. Bem, por ora sua trégua estava valendo. E pelo que havia entendido, não lhe seria permitido caçar o monstro em sua toca. Teria que se preparar para a luta em campo aberto. Nada mais justo, pensou. Afinal, era uma caçada. Onde os papéis de caça e caçador estavam misturados, e não tinha como definir quem iria caçar quem. Os dois eram caça… e os dois eram caçadores. Que o melhor entre os dois fosse agraciado pela deusa da vitória.

As três Marias fizeram uma deferência ao anfitrião. E devagar, lentamente, começaram a movimentar-se em direção à saída do Templo. Conforme caminhavam, os guarda do Templo iam fechando o caminho, de forma que não poderiam retornar à sala do trono mesmo que quisessem. Mas não queriam. Juvêncio agora sabia a extensão do poder de seu oponente. E sabia que nada garantiria sua vitória contra o mesmo, além de sua astúcia.

Saber quem era realmente seu inimigo não resolvia todos os problemas do condado. Afinal, de que adiantava saber que seu oponente era um deus? Juvêncio sabia que, quando viesse para o ataque, ele viria com força total… e extravasaria toda a sua fúria…

Finalmente chegaram à saída da caverna. As três Marias devolveram as armas de Juvêncio e de Matilde e Rosa agitou sua mão em frente aos olhos dos dois… no mesmo instante o casal caiu em um sono profundo…

Tania Miranda
Tania Miranda
Trabalho na Secretaria de Estado de Educação do Estado de São Paulo e minha função é "Agente de Organização Escolar", embora no momento esteja emprestada para o TRE-SP, onde exerço a função de "Auxiliar Cartorário". Adoro escrever, e no momento (maio de 2023) estou publicando meu primeiro livro pela Editora Versiprosa...

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