Márcia não gostava muito de gente.
Mesmo que muita gente gostasse da Márcia.
Não é que ela não gostava daquela gente, em si.
Talvez só um pouquinho.
Mas a verdade mesmo é que ela gostava de si.
Gostava de uma tarde em silêncio,
só com o som da televisão,
onde, por decreto Marciano,
sempre está passando um filme bom.
Nem sempre de boa qualidade,
mas sempre bom;
Bom pra Márcia.
Que é o que importa.
Quase só o que importa.
Com exceção de seus filhos e,
claro, de uma boa refeição.
Quando dá, uma boa viagem.
Daquelas que ela vê nos filmes.
De preferência,
em um lugar sem muita gente.
Fora de temporada.
O hotel só pra ela.
(E pros filhos.)
Não precisa de mais nada.
Nem ninguém a mais.
Márcia gosta assim;
Gosta mais de si,
e de ser assim;
E quem a conhece, também.