Reforma Agrária: Uma alternativa para corrigir as desigualdades sociais no Brasil.

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A Reforma Agrária é um tema polêmico, mas, que precisa ser enfrentado de frente pela sociedade brasileira.

Para situar essa questão, vale esclarecer que, a mesma, data dos tempos de Roma Antiga quando os irmãos Graco ficaram conhecidos como os reformadores por serem adeptos desse movimento, que a seu modo de ver, seria uma maneira de favorecer as classes desprovidas.

Isso indica que conflitos acerca da terra e outros direitos dos despossuídos estavam presentes no Império Romano, e, que tais agitações inquietavam não somente seus latifundiários, mas, igualmente os governantes, que na prática eram os detentores de grandes propriedades rurais.

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Em Roma, as Guerras Púnicas favoreceram a extensão do território para a formação do império. Porém, as classes menos favorecidas não tiveram direito ao acesso às terras conquistadas por meio da guerra. Com isso, as desigualdades sociais cresceram. As classes abastadas se apossavam das terras, ainda que os camponeses tenham sido enviados ao combate e arcado com os custos das conquistas. Ou seja, apesar de as guerras terem sido importantes para Roma, não se transformaram em benefícios para os pobres. Inversamente, no decorrer do século II os camponeses perdiam suas terras para os que já eram proprietários de grandes latifúndios.

Empobrecidos, devido ao fato de terem de custear as guerras, pequenos proprietários foram compelidos a venderem suas terras aos ricos, engrossando os aglomerados urbanos. Os empobrecidos começaram a ganhar visibilidade com o advento dos irmãos Graco ao senado como representantes da plebe.

O primeiro defensor/representante dos plebeus foi Tibério Graco que teve como parâmetro político, impedir aos senadores e magistrados tomarem medidas maléficas ao povo. Uma de suas bandeiras era a reforma agraria, defendendo que se os pobres lutaram nas guerras de conquistas, também deveriam ter direitos às terras, embora possam haver controvérsias nesse sentido.

No projeto de Tibério, as propriedades rurais seriam limitadas a 120 hectares — não cabe aqui discutir a área, pois essa medida possui equivalência diferenciada —. As que excedessem a essa extensão seriam desapropriadas e entregues aos sem-terra em lotes de no máximo sete hectares. Isso gerou reação dos senadores e grandes proprietários rurais e os inimigos de Tibério e da reforma agrária aparelharam sua morte.

Após dez anos da morte de Tibério, seu irmão Caio também foi eleito tribuno plebeu, tendo sido muito mais radical, onde, além de defender a reforma agrária, também acastelava a distribuição de alimentos aos famintos, afora outras reformas que visavam favorecer os plebeus: proibição do envio de menores de 17 anos a guerras e fornecimento de kit de armas para os que fossem convocados a ela, entrega de trigo a preço acessível aos pobres, por exemplo.

Temendo que Caio angariasse poder, o senado aprovou lei que permitia a execução de pessoas que representassem risco a Roma.

Caio morreu em 121 a.C. e sua morte não foi esclarecida. Seus seguidores sofreram perseguições e muitos foram mortos.

Na atualidade, na União Europeia, apesar da não existência de grandes latifúndios, a questão da reforma agrária tem sido tema de discussão com debates sobre o futuro de sua Política Agrícola Comum (PAC), numa busca de novos rumos para sua agricultura, ainda que a tendência seja a produção por meio de mecanismos industriais. Por outro lado, as posições em prol de uma reforma agrária ecológica e sustentável têm ganhado forças, principalmente em relação ao uso de agrotóxicos.

No contexto de redefinição das linhas da Política Agrícola Comum, na União Europeia estão em discussão as que têm como centro perspectivas e projetos para o futuro da humanidade.

Nesse grupo, agricultores ligados à Organização de Pequenos Camponeses e outras associações tem exigido preservação do clima e da natureza, apoio às pequenas e médias propriedades produtivas, melhores condições no cuidado com os animais, fim das exportações subvencionadas, comércio mundial justo, variedade de sementes, acesso à terra e alimentos para todos, vislumbrando que os setores populares têm grandes perspectivas e projetos para o futuro e estão engajados no movimento de reforma agrária naquela parte do mundo.

No Brasil, no que tange a essa temática, tudo está parado — exceto o incentivo do atual governo aos incêndios/derrubada da Floresta Amazônica e invasão das terras indígenas —, onde 50% das terras brasileiras estão sob posse de apenas 2% da população.

Por esse motivo, não é preciso muito esforço para que se enxergue centenas de famílias acampadas e nenhum investimento público voltados aos assentamentos, cruciais para dar dignidade a essa gente, como: crédito para produção; habitação rural; educação e saúde.

Existem famílias acampadas há mais de meia década à beira de estradas e em áreas ocupadas em situação desesperadora, vítimas de violência dos grandes latifundiários e do agronegócio que somente estão interessados em acumular capitais (e terras).

Cabe ressaltar que esses grupos de resistência têm sofrido verdadeiros massacres por latifundiários sob a proteção de quem deveria lhes garantir a vida, a polícia instituída, representante de um Estado que utiliza a brutalidade no trato das reivindicações sociais, onde os algozes de sujeitos de direitos não sofrem impunidade devida, o que remete à certeza de que ao Estado brasileiro não interessa uma política de Reforma Agrária.

Por aqui, o que se assiste não é falta de ações por parte dos trabalhadores na terra. Os defensores de uma Reforma Agraria ‘factum et legemno país têm movido ações no sentido de denunciar a existência dos grandes latifúndios brasileiros que não estão cumprindo sua função social conforme previsto no artigo 184 da Constituição Federal.

Não restam dúvidas que uma das saídas para a crise, a diminuição das desigualdades sociais, e, para resolver o problema de milhares de famílias que não possuem condições de produção, e ainda, daqueles que foram expulsos da terra no Brasil, precisa passar por um processo de Reforma Agrária vasta, massiva e popular.

Vale salientar que a crise demonstra que o modelo adotado pelas empresas transnacionais, pelos bancos, pelo governo e pelo Estado para o campo brasileiro — o agronegócio — por si só, não melhora a vida dos trabalhadores rurais, bem como, não garante a soberania alimentar, pois, esse modelo não cria emprego e desemprega nos momentos de crise, adota baixas remunerações e despreza as leis trabalhistas — se é que ainda se possa falar disso depois da de/forma Trabalhista e Previdenciária —, além de utilizar mão de obra escrava.

A isso pode ser somado o fato desse modelo não produzir alimentos para o povo, quando grandes extensões de terras são utilizadas na monocultura de soja, eucalipto, cana-de-açúcar, pecuária intensiva de exportação, deteriorando o ambiente com excesso de agrotóxicos e transgênicos, onde, por meio de empresas estrangeiras, o país é controlado por associações de latifundiários que se apropriam das terras que deveriam ser destinadas à Reforma Agrária, uma política pública eficiente na geração de emprego e renda no campo e na garantia de produção de alimentos, e, que se implantada, colocaria os interesses do povo brasileiro no centro dos interesses do país.

Entretanto, não é possível vislumbrar a possibilidade de um projeto de reforma agrária em um país que somente admite desapropriação de áreas acima de 510 hectares, improdutivas ou por desejo de seu proprietário — cansado da especulação — sejam destinadas à distribuição entre os que a querem como forma de sobrevivência de si e de outros.

Nesse quesito, os irmãos Graco, há 18 séculos, estavam a anos luz à frente do Brasil e de grande maioria dos políticos que se instalam em Brasília, pois, no que trata da questão de redistribuição de terras — além de outros pontos cruciais em favor das classes menos favorecidas — nada anda.

Como se não bastasse a inexistência de uma legislação de reforma agrária pertinente ao país, dados do Relatório Violência Contra os Povos Indígenas do Brasil de 2019, indicam, igualmente, uma situação cruel e de inquietação em relação às terras indígenas, que cada vez mais têm sido expropriadas em todo território brasileiro, denotando violência, por meio da blefe e lentidão na regularização, conflitos relativos a direitos territoriais, invasões, exploração ilegítima de recursos naturais e danos diversos à herança cultural dos povos nativos que ainda resistem/sobrevivem por aqui. O peso de preleções preconceituosas e racistas do atual governo, instigando a população contra indígenas, quilombolas e sem-terra tem sido cada vez mais acentuado.

Acerca da demarcação das terras indígenas, o atual governo está cumprindo, à risca, sua promessa de ignorar o assunto, o que mostra claramente sua intenção, e, daqueles que o apoiam, de retirar dessa gente o direito de uso de terras.

Conforme o relatório mencionado, o Brasil obteve destaque mundial no que diz respeito às tragédias ambientais com incêndios criminosos responsáveis pela destruição de grandes territórios de povos indígenas, além de ter aumentado o índice de violência, suicídios e mortalidade infantil.

Enfim, a violência e os conflitos em volta da luta pela terra são antigos conhecidos dos povos indígenas e das comunidades tradicionais do Brasil, e, independentemente de qualquer situação, irmãos Graco continuam morrendo nesse território — e na América Latina —. E, por incrível que pareça, seus algozes não são investigados e punidos.

Autor:

Pedro Paulino da Silva. Graduado em Ciências Sociais pela FAFI Cachoeiro de Itapemirim e Mestre em Educação Pela Universidade Federal do Espírito Santo

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