O Que Você Queria

Ela nunca entendeu o porquê de tudo aquilo. E por ter sido sempre assim, a rotina já não dava mais o brilho que imaginou que suas oportunidades dariam. 

Quando teve a primeira chance de ir morar com seus tios no sul da França, a pequena Mariana foi mais com birra do que qualquer outra coisa; afinal, teria de deixar sua família aqui.

A escolha não era dela e ela acabou indo. Se pudesse escolher, iria ficar ali, com seu pai, sua mãe e suas duas irmãs, Cláudia e Rafaela. Elas ficaram no Brasil.

A vida com seus tios era difícil; ela não entendia o idioma, achava a comida ruim e achava que a sala de estar de onde moravam fedia a carpete molhado, mesmo sem cachorros ou gatos na casa. 

Na escola era um pouco melhor por conta dos alunos estrangeiros, que lá eram muitos. Com a barreira do idioma, porém, não teve muitas chances de fazer amizades muito além daqueles que falavam português ou pelo menos arranhavam no inglês. 

Em suma, vivia uma vida solitária. Seu maior conforto era quando chegava a noite e ela podia ligar para seus pais, toda noite terminando a conversa com um pedido para voltar.

Mariana sentia saudade da textura do chão do quintal de sua casa no Brasil, onde mais de uma vez já ralou o joelho e chorou no colo de sua mãe e avó. 

Sentia saudades do cheiro da chuva molhada batendo nas árvores que cercavam seu portão, e do latido do cachorro insuportável do vizinho quando o carro dele chegava fazendo barulho em sincronia com o pôr do sol. 

Após alguns anos ela aprendeu o francês, além de se arriscar em alguns outros idiomas como o espanhol e o italiano. Mas ainda assim, nada se comparava ao português. 

Quando pôde escolher onde faria faculdade, Mariana escolheu voltar ao Brasil. Se despediu de seus tios e dos poucos amigos que fez e voltou para onde acreditava que seria feliz.

De volta em casa, tudo estava como ela se lembrava. Houve uma grande festa de recepção para ela, e Mariana pôde rever todos os seus amigos que deixou para trás.

Em um certo momento da noite, após os convidados já terem saído, perguntou ao seu pai o porquê de a mandarem para a França.

Ele a olhou no olho, com muito carinho, e lhe disse:

“Era o que você queria.”

Mariana o olhou com o mesmo carinho de volta e o abraçou.

Logo em seguida, foi dormir em sua cama mais uma vez.