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quinta-feira, 21 de novembro de 2024

Filosofia: “A Mãe Da Heresia”

Devido alguns cristãos, que sei lá por qual motivo fazem parte de um grupo de filosofia, terem, repetidas vezes, criticado comentários meus, dizendo-me que a “filosofia é a mãe da heresia”, não pude deixar de, com “ironia socrática”, concordar, dizendo: “Com toda certeza, pois tal palavra, que vem do Latim HAER?SIS, com raiz no Grego ??????? (translitera-se “airesis”) significa “escolha”, “opção”. Trata-se de uma linha de pensamento que visa a liberdade, a autonomia de pensamento, coisa que defrontava os credos ou sistemas dogmáticos de religiões, principalmente do Cristianismo, que não admitia pensamento diferente do que era pela Igreja determinado como o certo. Filosofia é, neste sentido, “Mãe da heresia”, isto é, da liberdade para escolher, para optar pensar de maneira igual ou diferente de outras pessoas ou do que organizações religiosas determinam. Convém ressaltar que, o Cristianismo (de linha católica e de linha protestante) persevia pessoas de fora e, principalmente, de dentro da comunidade eclesiástica, que ousassem divergir das doutrinas impostas.

Seguem algumas declarações de antigos sacerdótes católicos, sobre “hereges na da Igreja”:

São Cipriano: “Pela espada espiritual os orgulhosos e contumazes perecem, quando são expulsos da Igreja. Pois eles não podem viver sem, visto que a Casa de Deus é uma, e ninguém pode ser salvo exceto na Igreja.”; Orígenes: “Deus não só entregou o delinquente nas mãos dos inimigos por meio de seus apóstolos; mas também através daqueles que governam a Igreja, e têm o poder não só de desligar, mas também de ligar, são pecadores entregues à destruição da carne, quando por suas ofensas eles são separados do Corpo de Cristo … e são expulso da Igreja pelos sacerdotes.”; Santo Ambrósio: “E assim o bom Mestre … vem com uma vara, porque tira o culpado da sagrada comunhão. E bem se diz que ele foi entregue a Satanás, que está separado do Corpo de Cristo … Pois é necessário também sequestrar um gravemente decaído, para que um pouco de fermento não corrompa todo o pão.”; São Gregório: “Nada haja de comum para vós com ele, mas ele seja separado em todas as coisas da vossa fraternidade e comunhão. Pois … melhor é expulsar do rebanho do Senhor as ovelhas enfermas, do que pela doença de alguém perder aquelas que estão sãs.”.

Muitos cristãos e não cristãos foram condenados à morte pela própria Igreja, e não refiro-me, apenas, à Igreja Católica. João Calvino, por exemplo, um dos mais famosos teólogos da reforma no Séc. XVI, orquestrava condenação e morte de não poucas pessoa, incluindo cristãos que divergiam das ideias reformistas ou de dógmas compartilhados por reformistas e católicos, como, na época, o da Santíssima Trindade, entre outros. Destaco, aqui, a perseguição que Calvino desencadeou contra católicos quando prefeito de Genebra, como uma espécie de ?inquisidor protestante?; levando muitos à morte, como também os luteranos haviam feito em relação aos católicos na Alemanha. Destaque ainda maior deve ser dado à morte de Miguel Servet, que fora levado à fogueira sob ordem de Calvino, em 1553.

Miguel Servet nasceu em Villanueva de Sigena, Espanha, em 29 de Setembro de 1511; atuou, durante a maior parte de sua vida, como médico, tendo sido formado em Paris, e era também teólogo e considerado filósofo de linha humanista. Miguel Servet se posicionou, conceitualmente, contra muitas doutrinas cristãs, embora fosse também cristão, e por ser médico, dissecou alguns cadáveres humanos, de famílias cristãs e não cristãs, para entender melhor as questões implicadas em certos adoecimentos e para, com isso, descobrir curas. Porém, como havia a doutrina de ser, o corpo (de cristãos) “Templo do Espírito Santo”, era terminantemente proibida a dissecção de corpos humanos, sendo permitido apenas com os de animais, pessoas de outras religiões e de ateístas. Em 27 de outubro de 1553, João Calvino apoiou e chefiou a condenação do herege Miguel Servet, que foi queimado em uma estaca nas redondezas de Genebra, por suas heresias doutrinárias. Calvino, um dos principais adeptos da doutrina de predestinação da alma, esteve intensamente envolvido para a efetivação da morte de Servet. Fato é, que a morte de Servet havia sido planejada por Calvino muito tempo antes de Servet ser capturado pelos em Genebra, pois Calvino escreveu a Farel, em 13 de fevereiro de 1546 (sete anos antes de Servet ser preso) dizendo: ?Se ele (Servet) vier (à Genebra), eu nunca o deixarei escapar vivo se a minha autoridade tiver peso.?. Durante o julgamento de Servet, Calvino escreveu: ?Eu espero que o veredicto seja pena de morte.?. E como sua autoridade, na época, era inquestionável… Mas antes desta condenação, Servet tinha enfrentado julgamento da Inquisição Francesa, e fugira antes do processo ser cinalizado, sendo condenado. Então viajou à Itália, cometendo o erro de passar e parar em Genebra, onde foi denunciado por Calvino e seus comparças do movimento reformista. Ele foi pego um dia depois de sua chegada e condenado como herege por se recusar à retratação; foi queimado em 1553. Por ironia do destino, ao fugir para Viena, Servet parou em Genebra e, inocentemente, decidou assistir um sermão de Calvino, pois simpatizava-se com o movimento reformista. Ele foi, obviamente, reconhecido e preso depois do culto.

Entre o período em que Servet foi preso em 14 de agosto até sua condenação, segundo John F. Fulton, Michael Servetus Humanist and Martyr (Herbert Reichner, 1953), p. 35.), Servet permaneceu ?[?] em um atroz calabouço, sem luz ou aquecimento, pouca comida e sem facilidades sanitárias.?

É digno de nota que os calvinistas de Genebra colocaram madeiras semiverdes em torno dos pés de Servet e uma coroa de enxofre em sua cabeça. Assim, as chamas demoraram mais a se intensificarem, potencializando o sofrimento de Servet.

Se a filosofia é “a mãe da heresia”? Não tenho dúvidas de que sim…

Autor:

Cesar Tólmi – Filósofo, psicanalista, jornalista, pós-graduando em Neurociência Clínica e MBA em Recursos Humanos, Coaching e Mentoring, artista plástico autodidata, escritor e idealizador da Neuropsiquiatria Analítica integrada aos campos clínico, forense, jurídico e social.

E-mail: cesartolmi.contato@gmail.com

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