Há quem diga que autoestima é fundamental. Que nada! O verdadeiro combustível humano, sobretudo para o mimado, é a deliciosa arte de diminuir o próximo. Afinal, de que adiantaria acordar de manhã se não fosse para lembrar ao colega do lado que ele nunca vai ser tão bom, tão bonito ou tão iluminado quanto você? Isso, claro, se você, assim como sugere a frase, já percebeu que não sente um valorzinho sequer dentro de si mesmo—mas como admitir isso sem descer o nível dos outros, não é mesmo?
O espetáculo da vida moderna é este: pessoas que se dedicam, com suor e afinco, à nobre tarefa de rebaixar os demais. Quantos doutorados em menosprezo já vimos por aí? O sorriso torto ao ver alguém se dar bem, o comentário sutil (ou nem tanto) carregado de veneno, a opinião que ninguém pediu, mas é lançada como granada camuflada de conselho. Diminua, anule, debique. Quem sabe assim a sensação de vazio suma na fumaça do ego inflado artificialmente.
Talvez Freud tivesse nos poupado muito tempo se, ao invés de cavar o inconsciente, sugerisse logo a passagem por um departamento de RH — lá, pelo menos, a especialização em minar a confiança alheia é quase um critério de seleção. E a beleza dessa engenharia emocional? Simples. Se o mundo parece grande demais, trate de fazer todo mundo pequeno o suficiente para caber no seu bolso inseguro e mimado. Orgulho da nação, prêmio Nobel da mediocridade.
Naturalmente, não basta ser mimado—é preciso competir. O esporte predileto desse personagem é a eterna disputa para provar que é o melhor, o mais popular, o mais visto, ainda que ninguém ao redor esteja jogando esse jogo patético. Tenta ser campeão numa corrida em que só ele está na largada e na plateia, elevando a própria mediocridade a troféu. Compete com quem nem percebe a competição, disputa atenção com quem não quer disputar nada, busca o pódio em arenas onde só existe sua insegurança desfilando. Tudo, claro, gira ao redor do seu egocentrismo ácido; para esse tipo, o universo é apenas um palco onde sua autoimagem capenga encena um drama infinito e cento por cento particular. Nada escapa à obsessão egocêntrica: tudo, todos, toda ação e emoção só existem para reverberar seu desejo de destaque.
Mas a podridão interna não fica só no teatro da vaidade. Esse personagem, quando convencido de que há “rivais” à altura — ou mesmo rivais somente na sua cabeça mimada e egocêntrica — passa à ação concreta: além de diminuir, passa a prejudicar. É o mestre dos factóides, das pequenas mentiras, da queda de braço invisível. Alimenta a obsessão até que, incapaz de vencer por mérito ou alguma qualidade real, beira a psicopatia: se entrega à tarefa de inventar falhas, destruindo reputações e fabricando picuinhas. O rival torna-se obsessão vital, quase uma missão de vida, até que o adversário seja esmagado — e, claro, que toda a plateia, verdadeira ou inventada, reconheça o brilho pálido de seu vazio interior.
Em algum ponto, claro, a autoconsciência ameaça bater na porta. Mas logo é expulsa: “Aqui não, que autoestima é coisa para fracos; forte é quem cria falhas inexistentes nos outros, porque precisa de um teatro de defeitos ao redor para disfarçar sua própria ausência de qualidades.” O sujeito que precisa desesperadamente destacar-se, dar show e ser visto — e, sem talento ou mérito reais, reconhece que jamais brilhará por luz própria. Então, pega emprestada qualquer sombra alheia, apaga focos, desenha defeitos no quadro dos outros para que, ao menos por contraste, pareça alguém digno de nota.
Porque no fundo desse teatro, a única plateia que realmente importa é composta pelo próprio ego mimado, sentado na primeira fileira, aplaudindo cada vez que alguém é diminuído, e você pode se convencer—mais uma vez—de que serve para algo.
Então, siga firme! Diminua, apague, e acima de tudo, jamais permita que o outro brilhe. Talvez, só talvez, um dia o espelho devolva um reflexo que não seja só vazio com verniz de arrogância. Ou não. Mas quem se importa? O importante é jamais largar essa vocação suprema: profissional de diminuir o outro. Certificado na parede, medalha no peito e vazio garantido no peito.


Parabéns, o conhecimento nos dá a chave para abrir as portas onde a mediocridade e a intolerância são as fechaduras.