Homens abortam?
Josualdo Alves Martins é um jovem mecânico de 24 anos. Nasceu sem conhecer o pai. Na certidão de nascimento consta o nome de seu progenitor : João Neves Martins. Dona Leda Alves, sua mãe, sempre afirmou não saber o paradeiro do pai, visto ter sido abandonada por João quando Josualdo estava com oito meses de nascido.
Josualdo cresceu forte pois sua mãe se esforçou muito para criá lo bem. Quando tinha 10 anos menino ainda, nasceu nele a necessidade e a ânsia de procurar o pai. Sentia vergonha por não poder apresentar o pai nas cerimônias do colégio. Nas partidas de futebol, todo mundo tinha, na torcida, um pai. D. Leda procurava compensar a ausência do pai, mas o Josualdo era o filho do vento, um filho sem pai!
Nem D. Leda e nem Josualdo sabiam que ali bem perto deles morava o João Neves. Depois de ter abandonado a mulher há décadas, João, o Pé de Vento, como era conhecido, tinha percorrido o Brasil quase todo. Não parava em lugar nenhum por mais de dois anos. Ia atrás de aventuras e emprego. Parecia cigano, sem pouso seguro.
Pois é, o Pé de Vento morava no mesmo bairro que a sua progênie. Mas nunca procurou saber do Josualdo. O passado estava morto em seu coração. Depois de muitos tropeços, João nem sabia quantas mulheres grávidas ele tinha deixado pra trás.
Dizem que o destino, se é que existe tal coisa é, dizem, uma trama de vários cruzamentos. No copo e na vida, devemos beber o conteúdo até a última gota. E assim foi…
– Arrasta a cadeira aí e senta. Vamos beber! – disse João.
– Não posso. Tenho que seguir para casa. Não tenho todo o seu tempo para desperdiçar em um bar.
– dizia isso enquanto tentava se desvencilhar.
– Meu irmão, preciso te falar…É coisa séria! Estou gravemente doente e preciso de um lugar para morar.. Não posso mais morar sozinho. Preciso de alguém que cuide mim.
– Você quer uma mulher ou uma empregada? Apontava o seu ex companheiro de esbórnia.
– A gente faz as escolhas erradas e depois, quando velho e doente, não tem quem nos estenda a mão…
O outro que não era um bom ouvinte, saiu de fininho. João bebeu mais dois copos, pegou o chapéu na mesa, ajeitou as roupas e saiu meio tonto e cambaleante.
A aposentadoria mal dava para pagar as suas despesas. Novo ainda em seus 67 anos, mas diabético, precisava urgente arranjar um lugar para pousar as suas misérias: as físicas e as morais.
D. Leda ainda estava em pleno viço nos seus 53 anos. Só teve um filho em sua vida, o Josualdo. Ele, sem pai, ela, sem marido seguiram em frente quando abandonados. Ela pegou o touro à unha. Quando caía, levantava.
D. Leda era muito orgulhosa de si mesma. Quando olhava para o filho, sentia uma triunfante sensação de missão bem cumprida. O filho era a sua riqueza, apesar de estarem nos extratos mais baixos de uma classe média.
– Josualdo, você vem pro almoço?
– Não, mãe. Preciso finalizar uns consertos que já estão com a data de entrega atrasada.
– Mas não exagera. Volta cedo!
Meia hora depois que Josualdo, D. Leda saiu também. Precisava fazer umas compras no mercadinho do bairro. Pegou a lista de compras e saiu a pé. Mal sabia o que a esperava: um susto ou uma maldição?
Como sempre fazia, pegou o caminho por trás da sua casa, o que era o mais curto. Foi meio distraída. Subia e descia as calçadas. Passou na banca de jornal, na frente do mercadinho e o seu coração bateu acelerado! Não podia ser ele Mas desgraçadamente era o João, o das tristes memórias. A triste figura estava encostada na banca de jornal, lendo um jornal popular. O coração de D. Leda bateu aos saltos!
O que fazer? O susto foi tão grande que chegou a despertar a atenção do João, que não a reconheceu mas sorriu um sorriso cafajeste – Viu assombração, dona? Ela se esquivou e saiu pra dentro do mercado. Ele a acompanhou com o olhar.
D. Leda precisava se recuperar. Sentou numa cadeira e tomou um refrigerante gelado. Quando se recuperou saiu pela porta dos fundos do mercado.
Andou com pressa. Quase correu! Chegou em casa esbaforida. Oh, meu Deus! Oh, meu Deus! Não posso voltar para aquele inferno de vida! Quantas e quantas noites deixei de dormir pensando naquele desgraçado? Mesmo antes dele desaparecer, sumir pelo mundo, o meu sofrimento foi grande. Ele passava noites inteiras fora de casa. Mesmo grávida, eu não podia contar com ele. Não, não! Eu não mereço voltar ao inferno!
Decidida e altiva, D. Leda engoliu o pão mofado de um amor insepulto e seguiu a sua vida. Nada disse ao Josualdo que continuou ignorando o paradeiro do pai.