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sexta-feira, 29 de novembro de 2024

Alternativas e tomada de decisões

Louis é um cara complicado, principalmente na hora de se decidir. É inteligente, estudioso, camarada, na escola assinava a lista de presença para amigos, passava cola, fazia os trabalhos e colocava os nomes de quem pedisse. Se a prova era dissertativa, reclamava da pergunta vaga. Se era múltipla escolha, sua análise era demorada. Se era questão do tipo Verdadeiro ou Falso, afirmava que o enunciado era dúbio. Demorava-se a responder e passar a cola, deixando todos ansiosos. Muitos colegas devem a ele a aprovação. Eram amigos apenas por interesses, claro. 

Pelos velhos tempos, os antigos colegas ainda o convidam para encontros no bar ou na pizzaria. Ele não mudou nada. Deixa todo o grupo louco ao decidir a marca da cerveja e levar 40 minutos analisando o cardápio. Consulta o garçom, o pizzaiolo e acaba pedindo meia quatro queijos, meia calabresa. Querem ver Louis bravo? Se o garçom pergunta seu nome, responde:

  • Me chamo “Louis” (pronuncia “luí”).
  • Luiz com “Z” ou com “S”? 
  • Não é Luiz. É Louis: L-O-U-I-S. Entendeu? – responde nervoso.

A discussão sobre alternativas, ou falta de alternativas, é longa. Ele mesmo nem sabe o que quer. Gosta é de ser do contra e de discutir. Os amigos, que antes ficavam enfezados com seus argumentos, agora se divertem com provocações. Após finalmente concluírem os pedidos, os debates começam.

  • Louis, você se estressa muito com essas atitudes lógicas. Pega leve!
  • O mundo está cheio de gente burra. Apertadores de botão. Ninguém quer pensar, analisar alternativas. Querem apenas 2 opções, escolhem uma, digitam e ponto final!

E Louis continua: Quem pede refrigerante, ouve: gelado ou sem gelo? Com limão ou laranja? Misturado ou à parte. Ninguém ousa consultar outras alternativas. Se pede um misto quente, é no pão francês ou de forma? Não pode ser baguete ou outro tipo de pão? A humanidade está ficando bipolar. Ou é uma coisa, ou outra.

Quando apresentam alguém, é casado ou solteiro? Existem mais alternativas para o estado civil, mas parece que só essas duas importam. Católico ou protestante? Será que existem só duas religiões? Destro ou canhoto? E os ambidestros? Quem morre vai para o céu ou inferno? Não tem outro destino? É pacote fechado?

Acostumados aos caprichos do Louis, eles continuam provocando o amigo por pura diversão. Um dos temas prediletos é família. Sabem que Louis é conservador e cutucam com perguntas sobre casamento e filhos. Ele sempre diz:

  • Em todos casamento, o padre pergunta se aceita ele ou ela, blá, blá, blá, até que a morte os separe. O rito só admite duas respostas: sim ou não. É impossível negociar cláusulas, condições, consultar um advogado. E se a noiva virar uma bruxa ou o noivo se tornar cachaceiro, um mala sem alça? Tem de aguentar até a morte os separe? O contrato devia ser detalhado. Aí nasce a criança. É menino ou menina? Gente, se atualiza! Faz tempo que tem dezenas de opções!

Se assunto é política, aí complica. Você é de direita ou de esquerda? Socialista ou capitalista? Até parece que só existem essas opções! Nem tudo tem de ser preto ou branco. Só de cinza, tem pelo menos 50 tons!

O tempo passou, os amigos se casaram, mas quando há um encontro da turma e avisam que o Louis estará presente, as esposas não vão e não ficam acordadas esperando. Sabem que os maridos chegarão tarde e com fome, mas vão se divertir e contar tudo no dia seguinte.

Uma semana antes da festa dos 25 anos da formatura, eles se reuniram no bar. Só rapazes, pois as esposas não suportam os argumentos do Louis e eles não querem constranger o amigo, ainda solteiro aos 48 anos. Ele continua boa pinta, culto e bem de vida, mas não se casou por conta da demora em se decidir. Nenhuma namorada aguenta. Resolveram convidar uma bela mulher para aparecer meio que “do nada”, apresentá-la ao Louis e, quem sabe, tirá-lo do atraso sexual.

Devidamente instruída, ela suportou todas as contestações e ainda o defendeu diante das argumentações dos amigos. Parece que Louis finalmente encontrou alguém que pensa exatamente como ele. Para surpresa de ninguém, encerrou a reunião assim que ela cochichou sugerindo irem a um motel para se conhecerem melhor.

Lá chegando, ela reagiu bem às ponderações quanto à escolha do quarto, quais luzes acesas e quais apagadas, TV ligada ou não e em qual canal, temperatura do ar, o lado da cama de cada um, bebidas etc. Duas horas depois, ambos ainda vestidos, ele finalmente deu-se por satisfeito e disse estar pronto para as preliminares. Louise, nome fictício, consultou o relógio e ponderou:

  • Meu bem, seus amigos me contrataram por 4 horas de trabalho e o tempo esgotou, a menos que você queira pagar por uma hora extra.
  • Melhor deixar para outro dia. Fiquei na dúvida entre Tadalafila e Viagra, optei pelo segundo, mas o efeito já está passando.

Louis cancelou a bebida e o casal deixou o quarto em silêncio, mas só até a moça do caixa perguntar: débito ou crédito? Pronto. Mais meia hora de discussão sobre formas de pagamento. Vida que segue. Ou não! Será que só tem duas alternativas?

Laerte Temple
Laerte Temple
Administrador, advogado, mestre, doutor, professor universitário aposentado. Autor de Humor na Quarentena (Kindle) e Todos a Bordo (Kindle)

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