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terça-feira, 23 de julho de 2024

Walküren – As Três Marias

Capítulo Cinquenta e Oito

Depois de muito pensar, Juvêncio chegou à conclusão de que não conseguiria encontrar o covil de sua caça. Afinal, era um ser mágico, e com certeza seu local de descanso era protegido por algum tipo de encanto. O máximo que nosso amigo conseguiria era deduzir mais ou menos o local em que Anhangá poderia aparecer em sua próxima incursão. As três Marias, com certeza, deveriam saber onde tal coisa ocorreria. Mas elas jamais lhe contariam… estavam sob um encanto, e não tinham como escapar deste.

Pelo que Matilde lhe contou, o lugar sagrado da fera deveria ser muito antigo. E, provavelmente, estaria intocado por mãos humanas a séculos. Aí estava a chave para descobrir o que desejava…. encontrar um pedaço da floresta inexplorado.

Juvêncio começou a pensar sobre o assunto. Lembrou-se de uma história que ouvira, de um dos benzedores que visitou, logo que chegou à cidade. Foi na época em que desconfiava que algum feiticeiro da região pudesse ter invocado a entidade, por algum tipo de vingança. Que bom se fosse realmente isso… ah, sim, quanto à história…

Havia uma parte da floresta, perto das montanhas, que era um matagal fechado… poucas pessoas se arriscavam a pôr os pés nessa parte da mata, e das que ousavam se embrenhar pela floresta, somente uma ou outra retornava. A maioria sumia sem deixar nenhum vestígio… o que tornava essa região…”especial”… era o fato de que os cães se recusavam a vasculhar a área. Nenhum perdigueiro entrava naquele pedaço de chão. Quando os donos, impacientes, prendiam os animais na coleira e tentavam arrastá-los mata adentro, os bichos simplesmente empacavam, como é costume dos burros fazer. E nada… mas nada, mesmo… os convencia a entrar ali…

Bem, era uma pista. Que valia a pena investigar. Mas não naquele dia. A noite já estava chegando e não era aconselhável entrar em terreno desconhecido assim, sem estar preparado… por esse motivo, nosso amigo montou Tornado e retornou para o povoado… descansaria a noite, e de manhã voltaria para explorar aquela região. Mas antes teria um dedo de prosa com Matilde. De repente, ela poderia saber de alguma coisa importante.

Depois de muito pensar, resolveu convidar Matilde para jantar na pensão, quando então conversariam sobre o assunto. E também chamaria as três Marias para participarem da conversa. Embora estivesse ciente de que elas não ajudariam em nada sobre as investigações, sua esperança era de que, ao falarem sobre algo que tivesse a ver com o caso, Izabel confirmasse o fato. Das outras duas não adiantava esperar nada… elas realmente seguiam as ordens de seja lá quem for. Mas o encanto sobre Izabel, ao que parecia, era mais fraco… e ela acabava sempre dando alguma pista importante sobre os fatos… 

– Isso é tudo o que descobri, Juvêncio… e não foi nada fácil…

– Entendo, dona Matilde… é uma história contada de pai para filho, é natural que alguns pontos se percam…

– Elas conferem com alguns pontos dos desenhos que te falei…. existe um lugar que já foi usado para adorar esse… esse…

– Essa entidade. Eu sei… o problema é a gente descobrir onde fica isso…

– Olha… se eu fosse arriscar um palpite… seria na região da serra, perto da queda d’água…

– Na floresta “encantada”?

– Sim… dizem que naquele lugar lúgubre tem um rio que corta toda a extensão da mata…. e há várias quedas d’agua em seu percurso…

– Vale a pena dar uma olhada…

– Aposto que o senhor vai para lá amanhã…

– Assim que raiar o sol…

– Posso ir contigo?

Era Izabel, se oferecendo para acompanhar o delegado.

– Sabe que não pode vir sozinha… suas parceiras teriam que vir, também…

Izabel se vira para suas amigas…

– E então, meninas? Que tal sair dessa pasmaceira?

As duas concordaram. Afinal, elas também já estavam cansadas de ficar o tempo todo paradas… precisavam de ação. Seu corpo pedia isso.

– Tudo bem, então… amanhã, logo cedo, estou pegando estradão…  

– Juvêncio… posso ir com vocês?

– Pode ser perigoso, Matilde. Não sabemos o que vamos encontrar….

– Já provei que sou mais dura do que pareço. Eu sei me cuidar.

– Eu sei, dona Matilde… mas é que… eu me preocupo com a senhorita…

Matilde sorriu. Então o delegado sentia alguma coisa por ela… isso a deixava feliz, pois ele também a atraia. Desde a primeira vez que o viu, sentiu alguma coisa que não sabia… nem queria… explicar. Sim, ele tinha algo que Matilde simplesmente adorava… e a deixava fascinada.

Deveria ser umas quatro horas da manhã… o galo cantava alto, avisando que logo o sol nasceria. Mas as estrelas ainda brilhavam no céu. Juvêncio levantou, foi fazer sua higiene pessoal… ainda era muito cedo para o pessoal da pensão, mas como ele era um cliente especial, a cozinheira já preparava um desjejum não só para ele como para suas companheiras de viagem…

Embora morasse a algumas quadras da pensão, Matilde resolveu juntar-se ao grupo de aventureiros desde o desjejum. Assim teria certeza de que não ficaria de fora daquela pequena excursão. Depois de tanto tempo atrás de uma escrivaninha, sentia necessidade de participar efetivamente de uma caçada… mesmo que fosse ao sobrenatural.

Depois de se saciarem e pegarem um farnel para a viagem… afinal, se tudo desse certo só retornariam à noite… finalmente chegou a hora de partir. Verificaram suas armas e munição… nenhuma bala de chumbo fazia parte de seu equipamento… bem como as armas de corte… todo o arsenal era de prata, pois embora o aço seja o metal mais forte, a prata era o único material letal para o inimigo que iriam caçar.

Finalmente estavam a caminho da mata. O local que iriam investigar ficava a umas duas horas de cavalgada lenta, sem forçar os animais. E assim foram, os animais trotando, sem pressa de chegar ao destino. Quando chegavam ao pé da montanha, o sol começava a escalar o céu…

Mais meia hora cavalgando entre as árvores e chegaram à parte lúgubre da floresta. Parecia estarem em outro mundo… arvores com galhos retorcidos davam ao local um ar ainda mais sinistro do que o esperado. Juvêncio desmontou, sacou seu facão e começou a abrir uma passagem entre a vegetação. Devido à formação dos arbustos e cipós por ali espalhados, o grupo achou melhor deixar suas montarias na parte da floresta iluminada pelo sol. Entrariam a pé na parte escura. Essa parte realmente era escura, pois as copas das árvores se entrelaçavam de tal forma que impediam a entrada dos raios de sol. O cheiro da vegetação em decomposição era muito forte. Embora fosse a fonte de nutrientes necessários para a vida da floresta, a impressão de que estavam em um vale da morte era forte… a sorte estava lançada…

Tania Miranda
Tania Miranda
Trabalho na Secretaria de Estado de Educação do Estado de São Paulo e minha função é "Agente de Organização Escolar", embora no momento esteja emprestada para o TRE-SP, onde exerço a função de "Auxiliar Cartorário". Adoro escrever, e no momento (maio de 2023) estou publicando meu primeiro livro pela Editora Versiprosa...

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