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quarta-feira, 24 de julho de 2024

Walküren – As Três Marias

Capítulo Quarenta e Cinco

Três dias se passaram desde que Juvêncio e Torquato armaram seu acampamento próximo da cachoeira. Se não havia sinal das garotas, pelo menos o Jurupari também não deu o ar de sua graça pelos arredores. Nesses três dias os dois companheiros ficaram pescando e colhendo frutos que havia próximo do local… nada de caça de qualquer porte… o motivo era um só… não atrair a atenção dos bichões que, com certeza, caminhavam por ali… no entardecer do terceiro dia, quando o sol já estava se pondo no horizonte, Juvêncio notou três corpos boiando no rio. Tratou de se atirar na água e resgatar os corpos… eram as garotas, desfalecidas.

Com a ajuda de Torquato, içou as meninas até a margem do rio. Estavam molhadas até a alma, como se costuma dizer… colocaram-nas próximo ao fogo, para secarem as roupas e se esquentarem.

Aos poucos as moças foram acordando. Quando interrogadas sobre o que acontecera, o máximo que  conseguiam era balbuciar que não faziam ideia do que estava acontecendo.

Enquanto elas se recobravam, Juvêncio resolveu fazer um churrasco com o resto do charque que sobrara. Quando as moças estavam prontas, sentaram-se ao lado dos dois rapazes e partilharam a refeição.

Depois de comerem e descansarem um pouco, Juvêncio resolveu fazer a pergunta que estava lhe incomodando…exatamente o que teria acontecido com elas, durante o tempo em que estiveram desaparecidas? As moças o olharam, surpresas… não tinham a menor ideia do que ocorrera…

Vendo que as moças não sabiam o que falar, resolveu deixar o assunto para mais tarde. Com certeza, quando chegasse a hora elas  se manifestariam… deveriam estar sob algum encantamento, e ele com certeza se quebraria na hora certa.

Depois de comerem e descansarem mais um pouco, era hora de voltar para a cidade. Selaram seus animais, verificaram se tudo estava correto e partiram em direção à cidade. A noite já estava fechada, por assim dizer, e o bom senso recomendava não saírem a campo daquela forma. Mas seguiram em frente assim mesmo.

Nenhum incidente ocorreu durante o trajeto que fizeram. Depois de algum tempo, finalmente avistaram a  cidade. Bem, a menos que acordassem a dona da pensão onde estavam hospedados, teriam que dormir na estrebaria… considerando o adiantado da hora, resolveram optar por essa solução…

Logo que os primeiros raios de sol apareceram no horizonte, Juvêncio e sua turma se dirigiram para a delegacia. Santana levou um susto ao ver aquela turma, que já considerava estar no outro mundo, apresentar-se a sua frente. Quando Juvêncio e sua turma chegaram, Santana estava a um quarteirão da delegacia. Com um olhar de assombro abriu a porta, permitindo a entrada de todos. Estava curioso, queria saber o que tinha ocorrido…

– Acredito que não preciso perguntar, não é mesmo?

– Sobre?…

– O que aconteceu com vocês… e como voltaram… ilesos…

– Na verdade, não foi fácil. Avistamos o Lagartão perto da serra da Mãe D’água…

– E ele não pegou vocês?

– Estranho, não é mesmo? Mas, não… ele não nos encontrou…

– Engraçado… ele está fazendo um estrago dos infernos nas redondezas…

– Já apareceu algum morto?

– Está brincando, não é? Seja lá o que for, está fazendo uma carnificina na região…

– Está tão ruim assim? 

– O dia que tem menos mortos, tem três, quatro…

– Está brincando…

– Bem que eu queria… só na primeira noite, foram treze vítimas…

– E…?

– Como sempre, nenhuma pista…

– Mas alguma coisa deve ter…

– Olha, o doutor tem certeza de que o lagartão é o responsável pelas mortes…

– Mas…?

– Mas ele não consegue explicar a falta de sangue nas vítimas e nos locais do ataque… deveria haver respingos… mas não há nada.

Juvêncio fica pensativo por alguns momentos. Olha para as moças, mas fica desanimado ao ver que as mesmas não esboçam nenhuma reação… ainda estão em um estado de estase, e parece que o mundo real está longe de seus pensamentos…

Não demora muito e as notícias de novos ataques chegam à delegacia. De pronto Juvêncio resolve partir para um dos locais do ataque, junto com a sua equipe. “Quem sabe”, pensa ele, “se no local dos fatos as meninas não acordam”…

Depois de uma meia hora de cavalgada, Juvêncio e sua turma chegam ao seu destino. No local, dois corpos. Como os outros, sem uma só gota de sangue, nem nos corpos, nem nos arredores. Isso intriga o Justiceiro. Ele resolve examinar os corpos mais de perto. Percebe que, junto ao corte no pescoço, há uma substancia esbranquiçada, parecendo cera de abelha… ou sebo de carneiro. Bem, era uma substancia gordurosa….

Tomando cuidado para não destruir nenhuma evidência, Juvêncio começou a examinar o solo em volta do corpo… e os resquícios daquele material engordurado ainda permaneciam no solo… mas com o calor do sol, que estava subindo aos céus, iam pouco a pouco desaparecendo…

Quando Juvêncio resolveu manipular um dos corpos, Izabel fez-lhe sinal para não se mover. Intrigado, parou no ato. Do corte no pescoço da vítima saiu algo parecido com uma lesma, mas de dimensões gigantescas. O estranho animal misturou-se ao solo e simplesmente sumiu. Juvêncio ficou sem ação. Era a primeira vez que via tal ser em sua vida. E, pelo jeito, a dieta daquele bicho era… sangue!

Uma sanguessuga? Não dava para acreditar. Mesmo porque, embora o tamanho do animal fosse desproporcional, não justificava a drenagem total dos fluidos sanguíneos das vítimas.  Juvêncio ficou realmente encafifado com aquilo. Mas, pelo menos tinha uma pista a mais do que tinha quando chegou na cidade…

Resolveu examinar o outro cadáver. Nada. Estava limpo. Nenhum sinal da substância gordurosa que encontrara no primeiro. E quando foi examinar uma segunda vez a primeira vítima, percebeu que não havia mais nenhum sinal da substância sobre o corte. O mistério só aumentava… Não era possível que aqueles vermes (seriam vermes?) estivessem presos ao lagartão… afinal, se ele tinha sangue frio, a última coisa que deixaria aderir em sua pele escamosa seria uma criatura gelatinosa, como a que Juvêncio encontrou ali…

Resolveu acompanhar os corpos até o necrotério. Iria pedir para o doutor examinar os cadáveres, a procura de qualquer indicio que pudesse… se conseguisse localizar algum traço de gordura nos cortes, por menor que fosse, já teria alguma coisa com o que trabalhar…

Uma meia hora depois já estavam nas portas do necrotério.  O doutor estava com um ar abatido. Também, pudera… já a uma semana que trabalhava exaustivamente, tentando determinar, sem sucesso, a causa real da morte das vítimas. Claro que o fato de terem a cabeça quase decepada era o motivo principal de seu passamento, mas devia ter alguma coisa a mais que estava lhe escapando. Mas agora, com a descoberta de Juvêncio, talvez ele pudesse ter uma ideia mais clara do que estava acontecendo…

Tania Miranda
Tania Miranda
Trabalho na Secretaria de Estado de Educação do Estado de São Paulo e minha função é "Agente de Organização Escolar", embora no momento esteja emprestada para o TRE-SP, onde exerço a função de "Auxiliar Cartorário". Adoro escrever, e no momento (maio de 2023) estou publicando meu primeiro livro pela Editora Versiprosa...

2 COMENTÁRIOS

    • Sinceramente, Rodrigo… nem mesmo eu sei… a história vai surgindo de acordo com o momento que escrevo. Se você notou, até agora não houve nenhuma presença física do monstro em questão. Porque simplesmente não sei qual a aparência dele. Mas como já estamos na reta final, logo Juvêncio e as três Marias vão se encontrar com a fera, e então finalmente saberemos como ela é… ah, e no final de novembro estreia minha nova novela aqui na Tribuna… “Walküren, o Jardim do Infinito”… espero contar com você em mais essa história…Muito obrigada pelo elogio. Foi meu mais lindo presente de aniversário (sim, estou apagando mais uma velinha hoje, dia 20…)

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