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sábado, 20 de dezembro de 2025

À Luz da Lei: A Prisão Preventiva de Bolsonaro como Imperativo da Justiça e o Insólito Teatro do Rompimento da Tornozeleira

A prisão preventiva do ex-presidente Jair Bolsonaro representa não apenas um gesto emblemático de defesa das instituições democráticas, mas também o cumprimento do princípio republicano de que todos são iguais perante a lei. Aqueles que, por força do cargo ocupado, julgavam-se imunes à responsabilidade jurídica por atos seus agora enfrentam uma realidade inescapável da responsabilização. A decisão judicial que converteu em preventiva a prisão domiciliária até então em vigor amparou-se em fundamentos robustos. Risco concreto de fuga, descumprimento reiterado de medidas cautelares e a clara tentativa de dificultar a atuação jurisdicional por meio da mobilização de apoiadores para tumultuar e obstruir a fiscalização estatal com proposta o cerne dessa medida. O ex-presidente não apenas violou a tornozeleira eletrônica, utilizando segundo confessou um ferro de solda na mais caricatural demonstração de desprezo à ordem judicial. Ele também recorreu ao já patético repertório de curiosidade, descontrole emocional e estresse medicamentoso para circunstância o injustificável. O Brasil de fato nunca esteve tão perto de um roteiro tragicômico. Manda-se um homem à cadeia e à porta da delegacia seu grupo político, a despeito de todo cinismo, organiza uma vigilância que rapidamente degenera em tumulto e agressões. Essa conduta serve de escudo prático para as hipóteses de evasão, sobre a qual o Judiciário de maneira prudente e rigorosa se precaveu.

A atuação do Estado decorre nesse cenário de uma necessidade técnica de garantir a efetividade da justiça penal. Qualquer outra pessoa que violasse a tornozeleira eletrônica diante de uma reportagem já transitando e sob vigilância judicial seria inexoravelmente privada de sua liberdade sem alarme ou vitimismo. O Judiciário ao decretar a prisão preventiva do ex-presidente atendeu aos requisitos legais clássicos do artigo 312 do Código de Processo Penal. Especialmente a garantia da instrução criminal, a ordem pública e a aplicação da lei penal guiaram essa escolha. Neste episódio Bolsonaro não foi apenas reincidente no descumprimento das medidas, mas chegou ao grau máximo de afronta ao romper o instrumento de monitoramento. Ele se posicionou ainda como vetor de instabilidade potencial. Incentivou publicamente a aglomeração e inflou seus apoiadores em frente à sede da Polícia Federal, não hesitando em expor terceiros ao risco físico e jurídico para viabilizar sua própria narrativa de mártir. O espetáculo de seus adeptos praticando agressões e hostilidades, transmitido em tempo real do cenário da Superintendência da PF, provou-se combustível extra para o fundamento cautelar da prisão. Não se tratou de mero capricho da autoridade responsável. Nenhum réu comum merece, muito menos recebe, benevolência semelhante em situações análogas. O presente caso por seu simbolismo é necessário para reafirmar com justiça que não pode haver exceção à regra universal. Se rompeu a tornozeleira, afrontou decisões judiciais e instigou tumulto, será preso preventivamente, seja qual for o nome estampado no RG.

Mais risível hoje é o argumento de que Bolsonaro teria sido vítima de um acesso de curiosidade científica ou de um inexplicável especial emocional ao usar solda para violar deliberadamente a tornozeleira, como alega sua defesa. O Judiciário data venia não é laboratório da tragicomédia política nacional. Argumentos assim que beiram a puerilidade apenas reforçam a extrema necessidade de adoção das medidas mais graves possíveis para impedir a perpetração de novas tentativas de intervenção da justiça. No final das contas deboche maior é a da própria realidade, em que direitos e garantias fundamentais são constantemente manipulados para proteger a reprodução de condutas criminosas. A prisão preventiva de Bolsonaro, portanto, não era apenas possível. Era absolutamente obrigatório sob qualquer ponto de vista técnico-jurídico. A alternativa significaria a negação absoluta do Estado Democrático de Direito, a leniência diante da desordem institucional e o enfraquecimento completo da autoridade judicial. Que sirvam de aviso àqueles que acreditam que a exceção, sobretudo quando disfarçada de curiosidade científica, pode se converter em regra sem consequências.

A legislação brasileira não apenas prevê o agravamento da pena para quem viola a tornozeleira eletrônica, como converter essa violação em indicativo jurídico claro do risco de fuga. Essa base serve para a decretação da prisão preventiva. Assim a tentativa ou o rompimento do equipamento eletrônico monitora a desobediência às medidas judiciais. Acarretam a perda de benefícios como prisão domiciliar e a implementação imediata de medidas restritivas mais graves. É o que aconteceu com Bolsonaro, que consciente de sua situação processual buscou desqualificar o instrumento judicial enquanto alimentava um espetáculo de tumulto e violência por seus simpatizantes em frente à Polícia Federal. Em um sistema jurídico cuja força reside na impessoalidade e universalidade da lei não poderia haver tratamento especial que confundisse abordagens com regras. Essa é uma demonstração inequívoca de que o Estado Democrático de Direito existe e pode sim alcançar todos sem distinção. Garantir o primado da lei e a proteção da sociedade contra o arbítrio e o caos representam a cerne dessa descoberta.

Manuel Flavio Saiol Pacheco
Manuel Flavio Saiol Pacheco
Doutorando e Sociologia e Direito pela Universidade Federal Fluminense (UFF), Mestre em Justiça e Segurança pela Universidade Federal Fluminense (UFF), Especialista em Desenvolvimento Territorial pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ).. Possui ainda especializações em Direito Tributário, Direito Constitucional, Direito Administrativo, Docência Jurídica, Docência de Antropologia, Sociologia Política, Ciência Política, Teologia e Cultura e Gestão Pública e Projetos. Graduado em Direito pela Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ). Advogado, Presidente da Comissão de Segurança Pública da 14º Subseção da OAB/RJ, Servidor Público.

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