
Sabe, a gente se acostuma tanto a resolver as coisas no calor do momento, tipo um comentário rápido nas redes, um pedido de delivery com um toque no app, ou até um clique que evita uma conversa de verdade. E, sem nem notar, acabamos passando pro Estado o controle sobre o que antes resolvíamos no dia a dia, entre amigos ou família. É engraçado pensar nisso, né? Como o Supremo Tribunal Federal foi se infiltrando devagarinho na nossa rotina íntima. Quase como aquele tio sabichão que sempre tem a resposta na ponta da língua, mas que, de tanto ajudar, vira consulta pra tudo, até pro que daria pra decidir num almoço de domingo descontraído.
Essa invasão tem até nome chique: judicialização da política. Um troço que pegou força ultimamente e, no começo, parecia só uma rede de segurança. Se o Executivo e o Legislativo pisassem na bola com direitos básicos, tinha ali uma instância pra dar um jeito. A Constituição de 88, com aquele ar todo cidadão, transformou o Judiciário num guardião ativo, não só um juiz de brigas particulares. Era uma ideia legal, tipo um colchão emocional contra abusos de poder.
Só que o tempo voa. Hoje em dia, o STF tá decidindo sobre vacinação obrigatória, políticas de educação, descriminalização de certas coisas, novos tipos de família e até como rolam as políticas públicas. Não é que o Supremo seja metido a besta, querendo mandar em tudo, não. É mais a sociedade que corre pra lá sempre que as expectativas não batem com o que a política normal oferece: debate aberto e voto.
A Constituição diz que os Poderes são independentes e harmônicos (artigo 2º, pra quem curte detalhes precisos). Cada um com seu papel, mas ninguém pode se esconder. Quando o Legislativo foge de temas polêmicos e o Executivo mira só na próxima eleição, o povo acaba, quase por instinto, batendo na porta do Supremo.
E eles abrem, claro. Porque ignorar uma ação que grita violação de direitos ia contra o artigo 102, que os coloca como os grandes protetores da Carta. O que era exceção virou rotina. Em vez de leis debatidas no Congresso, a gente tem decisões judiciais que valem pra todo mundo, tecnicamente impecáveis, mas que nem sempre conversam com o que o povão pensa.
Talvez o equilíbrio que falta seja esse: ver que o Judiciário é crucial pra barrar excessos e assegurar direitos, mas que a democracia respira de participação, de convencimento, de brigas que levam a acordos. Não é fácil, admito. Discutir aborto, meio ambiente ou liberdade de expressão pede peito (e a gente nem sempre tem). É tentador jogar pro STF essa coragem pronta, enquanto a vida segue no piloto automático.
Mas é nesse gap entre precisar decidir e temer o papo reto que a política murcha. E quando ela recua, o Supremo avança, não por ego, mas por obrigação constitucional.
Quem sabe chegou a hora de pegarmos de volta um pedaço dessa responsabilidade coletiva? De aceitar que certas escolhas, por mais duras, precisam vir do voto e da conversa honesta. O STF vai seguir vigiando nossos direitos (graças a Deus por isso), mas uma sociedade crescida sabe que nem toda dor vira processo. Algumas merecem virar diálogo mesmo.
No fundo, democracia é isso aí: a habilidade de decidir em grupo, mesmo quando a gente discorda feio.