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segunda-feira, 22 de abril de 2024

Walküren – As Três Marias

Capítulo Quarenta

– Isso é impossível, meu amigo!

– Eu juro, Doutor Carneiro…eu vi a fera… com esses olhos que a terra um dia há de comer…

– Não tenho porque duvidar de você, Delegado… o problema é que esses bichões a muito que desapareceram da terra…

– Eu sei o que vi… e era um daqueles dimo … damo…

– Dinossauro… sim, pela sua descrição eu diria que é um dino… o problema é que eles foram extintos a séculos…

– Para um bicho que morreu a tanto tempo aquele que eu encontrei estava bem de saúde…

– Você mesmo disse que não achou nem sinal das pegadas da fera….

– Sim, isso mesmo… mas eu sei bem o que eu vi. Estava a menos de vinte metros do bicho…

Apesar do ceticismo, Doutor Carneiro não conseguia disfarçar sua euforia… afinal, se Juvêncio estivesse certo e o animal avistado por ele fosse realmente um sáurio, seria a sua glória. Tinha que dar um jeito de, confirmada a visão do delegado, capturar a fera viva… para expô-la para a comunidade científica. Ele ficaria famoso com tal achado… Mas primeiro era necessário encontrar o animal…

– Tem uma coisa que me intriga, doutor…

– O que, meu amigo?

– Se esse lagartão for o responsável pelas mortes…

– O que é que tem?

– Bom, ele não me pareceu ser um bebedor de sangue…

– E?…

– E é isso, doutor… eu acho que o bichão é a… ferramenta… utilizada para as mortes em questão… mas…

– Mas…?

– Mas isso não explica os cadáveres completamente sem sangue, doutor!

Carneiro tinha que concordar com Juvêncio. Mesmo que o bicho fosse real… e o bom doutor ainda não estava convencido disso… havia o problema de encontrarem os corpos com seu precioso líquido totalmente drenados… e até onde o doutor sabia, os sáurios não bebiam sangue… ou seja, mesmo que se confirmasse a existência do dino, o mistério perdurava….

– Tem mais uma coisa que me preocupa…

– O que, delegado?

– Não consegui encontrar as três moças pelos arredores…

– Com certeza, devem estar bem…

– Gostaria de compartilhar de sua confiança, doutor…

– Olha, pelo que você disse, elas não são novatas nesse tipo de coisa…

– Doutor, todo mundo é novato frente ao desconhecido…

– Certo, certo… o que eu quis dizer é que as três tem jogo de cintura para se safarem em caso de perigo…

– Espero que o senhor esteja certo…

O doutor não estava tão otimista quanto fazia parecer ao Juvêncio. Pelo que o Delegado dissera, as três estavam perdidas em uma floresta onde um animal pré-histórico caminhava livremente. Não era o melhor dos cenários.Mas tinha uma coisa que o doutor, assim como o delegado, não conseguia entender… se o animal era realmente um sáurio, deveria ter sangue frio. Portanto, sua hora de caçar seria durante o dia, não à noite. E todos os ataques, pelo que se percebeu até o momento, ocorreram quase de madrugada, justamente quando a temperatura costuma cair mais que o esperado… sim, o delegado estava certo… as contas não batiam.

Juvêncio ficou pensando se não era melhor continuar com sua linha antiga de investigação… procurar estudar as lendas da região. De repente poderia encontrar a chave para o mistério… caramba, esse caso tinha mais chaves que um castelo encantado… o problema é que até agora ele não conseguia entender o que se passava ao seu redor.

No começo tudo parecia um caso de vingança de uma raça oprimida contra o que seria a raça opressora. No final das contas, essa linha de argumento caiu por terra. Porque? Ora, se esse tipo de ataque vinha de um tempo mais distante que a própria fundação do povoado… a fundação da cidade… não poderia ser a vingança de um feiticeiro em ação….

Ficavam as histórias contadas pelos povos originários da região… Anhangá, Jurupari… bem, pelo menos tinha alguma coisa para trabalhar… pena que ele não podia interrogar uma lenda… ou podia? 

Lhe restava a opção de continuar ouvindo as histórias dos moradores da cidade… as histórias de sempre…traição conjugal, disputa de terras… sim, motivos para alguém desejar se vingar havia, e muitos… O problema era descobrir a quem interessava espalhar o terror e o medo pela região… 

Sim, Juvêncio estava realmente preocupado. Afinal, embora tivesse, a princípio, imaginado que com a chegada das moças na cidade as coisas ficariam mais simples, pegou-se agora preocupado com o destino delas. Bem, já era noite e o bom senso recomendava ficar quieto em seu canto até o amanhecer… quando o dia clareasse, voltaria a bater as pistas de Izabel e Companhia…

Juvêncio resolveu conversar com Torquato e Santana. Não iria acrescentar nada em sua história, mas era sempre bom ouvir a opinião de outras pessoas. E de repente Torquato poderia ter alguma ideia salvadora para o problema que Juvêncio não conseguia ver…

Os dois ainda estavam no gabinete de Santana. Juvêncio os cumprimentou, já os convidando para acompanhá-lo no jantar… convite aceito de imediato. E lá foram os três em direção à pensão… iam conversando sobre as amenidades do dia a dia. Juvêncio resolveu que só falaria sobre sua incursão pela campina durante o jantar…

Quando estavam já a mesa, esperando ser servidos, Juvêncio resolveu iniciar a conversa que realmente o interessava…

– Santana, posso te fazer uma pergunta?

– Claro, doutor… a vontade…

– Primeiro, vamos deixar esse negócio de “doutor” de lado…

– Certo… o que queria perguntar?

– O senhor conhece bem a fauna da região, creio eu…

– Com certeza… em meus momentos de folga gosto muito de caçar… e posso te dizer quais os tipos de caça se encontra por aqui…

– Eu acredito… lagartos, tem muitos por aqui?

– Com certeza… e alguns bem grandes…

Juvêncio se animou…

– Grandes quanto?

– Já peguei lagarto com até três quilos… meu amigo, que carne boa esses bichos tem…

O ânimo inicial se dissipou… 

– Não, não… estou falando de um lagarto um pouco maior…

– Maior, quanto?

– Com uns dois metros de altura?

– Dois metros de altura?!  Que raio de lagarto é esse?

– E com pés parecidos com o das aves…

Santana e Torquato deram risada…

– Por acaso esse… lagarto… tem bico, também?

– Estou falando sério, Santana. Você nunca viu nenhum bicho assim?

– Não. É sério. Pensa bem… se tivesse um lagarto desse tamanho por aqui, todo mundo já o teria visto…

– Bom, eu não sei o que dizer… eu vi um desses bichos hoje.

Torquato e Santana quase pularam da cadeira…

– Jurupari!

– Não sei se era o Jurupari, Torquato. Eu sei que o vi, a pouco mais de vinte metros de distância de mim…

– Onde você viu isso?

– Sabe a Serra da Mãe D’água?

– Sim, claro…

– Foi lá perto… 

Tania Miranda
Tania Miranda
Trabalho na Secretaria de Estado de Educação do Estado de São Paulo e minha função é "Agente de Organização Escolar", embora no momento esteja emprestada para o TRE-SP, onde exerço a função de "Auxiliar Cartorário". Adoro escrever, e no momento (maio de 2023) estou publicando meu primeiro livro pela Editora Versiprosa...

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