De dentro de um caminhão, no distrito industrial de Pequim, sai um homem. Esse homem se chama Mário. Durante dois meses, Mário precisou mentir para sobreviver. Dentro de um navio por 45 dias, se entranhou dentre os contêineres. Ao chegar na China, se viu diante do estranho fato de que não chegou no porto de Pequim (Posteriormente, descobriu que Pequim não tem litoral) e teve de se entranhar num caminhão. Agora, no reino das mentiras, Mário terá um difícil objetivo: encontrar a verdade.
Mário anda pelo parque industrial e olha atentamente, buscando por suspeitas, que entreguem a verdade ou a mentira. No horizonte, avista um grupo de operários. Eles olham, surpresos para Mário, que pergunta:
— Pra falar a verdade, eu nem sei o que eu tô fazendo. Parece que, sei lá, tem um cara escrevendo a minha vida. Tipo assim, eu vim do outro lado do mundo pra “procurar os 64 caminhos” e nem sei mais o que fazer.
— ????????????- Reclamou um homem.
-Oh! Você fala chinês. Faz sentido. — Um silêncio constrangedor tomou conta do espaço. De dentro de uma fábrica saíram três homens. Um usava um terno e os outros dois vestiam jaquetas rasgadas e seguravam e pés de cabra. O homem de terno disse:
— Diga-me com quem tu andas e direi quem tu és.
— Com quem tu andas e direi quem tu és. — Respondeu Mário certeiramente e, de certa forma, estupidamente. O homem deu um sorriso do canto da boca e disse:
— Bem-vindo de volta Hernandez. Ganhou uns quilinhos e perdeu o cabelo, né? Mas, no fundo, não mudou nada. Venha, já lhe esperávamos a um tempo. — O homem entrou na fábrica e chamou Mário. Lá dentro, moveu um piso quebrado, que escondia uma escada que levava ao subterrâneo. Em seguida disse:
— Precisamos mover as nossas operações para este lugar para fugir das regulamentações. Mas retirando o medo de fecharem a fábrica, conseguimos dobrar a produtividade. — O homem apontava para mesas de produção com crianças, que faziam brinquedos, liquidificadores, chaveiros e todos os tipos de produtos. — Recomendo que você faça o mesmo em Assunção.
— Para onde tudo isso vai?
— Aqueles pacotes ali na frente vão para o Canadá e para a Inglaterra. Esses aqui vão para os Estados Unidos, México e Haiti. E aqueles ali são um agradecimento para você Hernandez, o maior desse projeto. Se não fosse pelo seu site…
— Qual é o site mesmo? — Interrompeu Mário — É que eu tenho tido muito trabalho, e eu não me lembro de todos eles.
— Ora, o site tem o mesmo nome do seu grande projeto: os 64 caminhos! Durante anos, o ramo de falsificações esteve em declínio. Então, veio você e unificou-nos em 64 caminhos de comércio seguro e anônimo. A falsificação nunca esteve tão forte e isso é graças ao nosso grande líder Solano Hernandez!
— Bem, — Disse Mário acanhado — os 64 Caminhos tomaram um rumo que eu não esperava.
— O que há de errado chefe?
— Várias coisas. Por exemplo,- Mário refletiu um pouco antes de falar- não está sendo fácil passar nas alfândegas. Essa visita agradou-me muito, mas estarei retornando ao Paraguai para resolver esse e mais outros problemas. Não costumo andar com muito dinheiro, pois o senhor sabe como são essas autoridades, portanto lhe peço um empréstimo para que eu possa pagar um avião de volta.
— Claro, claro. Estarei te providenciando alguns yuans.
— E uma última coisa. Eu gostaria que alguém aqui em Pequim me fizesse uns cartões de visita. Mas com urgência: quero que me entreguem assim que eu pisar em Assunção.
E mais tarde, naquele mesmo dia, Mário embarcou num avião para o outro lado do mundo. Acomodou-se na primeira classe e se sentiu esclarecido. Só precisava mesmo do seu próprio endereço.
Os 64 Caminhos(3)
