Tema de muita importância no atual cenário do Direito Penal brasileiro, a relação entre a posição de Réu Primário no crime de tráfico de drogas e da prisão preventiva revela-se como uma questão que merece ser discutida amplamente, tendo em vista as constantes violações do procedimento correto a ser seguido pelas autoridades.
SOBRE A PRISÃO PREVENTIVA.
Segundo a Constituição Federal brasileira, em seu artigo 5º, inciso LVII, “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”. Dessa forma, a prisão preventiva se apresenta como um dispositivo contrário a esse princípio, todavia, é necessária em determinadas situações, respaldado na garantia do cumprimento do interesse social. Dessa maneira, apesar de o indivíduo ter a sua liberdade cerceada, ele não passa a ser considerado culpado (NUCCI, 2014).
Prosseguindo, de acordo com o Código de Processo Penal a prisão preventiva poderá ser decretada pelo juiz em qualquer fase do inquérito policial ou da instrução criminal, mediante requerimento do Ministério Público, do querelante ou do assistente, ou por representação da autoridade policial, quando necessária para garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal ou para assegurar a aplicação da lei penal, devendo no caso, estarem presentes indícios suficientes de autoria, prova da existência do crime (materialidade delitiva), e, demonstrado o perigo gerado pelo estado de liberdade do acusado.
De todo modo, para que os referidos pressupostos de prisão sejam considerados, ainda há de se verificar a presença de crimes dolosos com pena privativa de liberdade máxima de 4 anos, se o investigado já tiver sido condenado por outro crime doloso, com sentença transitada em julgado, se o crime envolver violência doméstica ou ainda contra a mulher, criança, idoso, adolescente, enfermo ou pessoa com deficiência – a fim de que sejam decretadas medidas protetivas de urgência -, bem como se houver dúvidas acerca da identidade civil daquele que se investiga ou não houver elementos suficientes para esclarecê-los.
Por fim, é importante ressaltar, que com o advento do pacote anticrime (Lei 13.964/19) é vedado ao juiz decretar a prisão preventiva de ofício, ou seja, sem qualquer provocação, especialmente, levando em consideração o princípio acusatório em que cada parte possui uma posição no processo penal cabendo ao juiz, exclusivamente, o papel de julgador.
E A PRISÃO PREVENTIVA EM RÉUS PRIMÁRIOS?
De acordo com o que foi delineado anteriormente, há determinados pontos que devem ser atendidos para que haja o decreto da prisão preventiva. Assim, visto que a condição de réu primário não está presente nesse rol de requisitos, tal condição, por si só, não é suficiente para eximir o indivíduo de ser enquadrado à custódia temporária, caso sejam identificadas as condições objetivas e subjetivas para que ela ocorra.
COMO FICA A SITUAÇÃO DA PRISÃO PREVENTIVA EM RÉU PRIMÁRIO EM CASO DE TRÁFICO?
Sobre esta temática, há uma decisão bem eloquente determinada pelo Ministro Jorge Mussi. Na oportunidade, o Ministro do Superior Tribunal de Justiça esclareceu que a prisão cautelar deve ser ordenada em último caso, a fim de assegurar o processo, bem como a ordem pública e social.
Ainda no referido caso prático, de acordo com o ministro Mussi, devido à quantidade não exorbitante de droga que estava em posse do acusado no momento do flagrante, era o caso de substituição da prisão preventiva pelo comparecimento periódico em juízo, proibição de se ausentar da comarca e recolhimento domiciliar noturno. Isso resulta da constatação do ministro de que as circunstâncias do caso não possuíam elevado potencial ofensivo.
Nessa mesma linha de raciocínio, o Supremo Tribunal Federal determinou, que a prisão cautelar aplicada a réu primário que possua menos de 21 anos, em caso de tráfico de drogas — maconha, especificamente — é contraproducente.
“PENAL E PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL EM HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE MACONHA. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. PRISÃO PREVENTIVA. RÉU PRIMÁRIO. ORDEM CONCEDIDA DE OFÍCIO. 1. Inexistindo pronunciamento colegiado do STJ, não compete ao STF examinar a questão de direito suscitada na impetração. Precedentes. 2. A prisão preventiva de paciente primário, com 20 anos de idade, pelo tráfico exclusivamente de maconha, é contraproducente do ponto de vista da política criminal. 3. Ordem concedida de ofício para revogar a prisão preventiva do paciente, sem prejuízo das medidas cautelares do art. 319 do CPP. 4. Agravo regimental a que se nega provimento.”
(STF – HC: 186268 SP 0093899-65.2020.1.00.0000, Relator: ROBERTO BARROSO, Data de Julgamento: 05/08/2020, Primeira Turma, Data de Publicação: 24/08/2020).
Deste modo, conclui-se que em caso de réu primário no tráfico de drogas, é necessário que haja o preenchimento de outros requisitos para que seja decretada a prisão preventiva, não devendo ser arbitrariamente decidida de forma automática.
Ótimos esclarecimentos, parabéns.