Prezados atendentes
Sei que vocês são pessoas bem atarefadas, portanto serei breve. Esclareço que falo da sua pesada carga de trabalho com conhecimento de causa, e não para usar de falsa polidez, pois, nos últimos dias, visando à resolução de um problema relacionado ao serviço oferecido por sua empresa, entrei em contato via telefone por algumas vezes e tive de aguardar, em média, vinte minutos. Isso mesmo. Vinte minutos escutando uma música clássica interrompida a intervalos regulares por uma voz feminina monocórdia que dizia o seguinte: “Nossos atendentes continuam ocupados. Por favor, aguarde”. E olhe que, quando liguei anteriormente para a empresa, sempre escutei essa frase – e a tal música! Portanto, se vocês, que só vivem ocupados, não têm um labor extenuante, não sei mais o que dizer!
Escrevo para registrar que o problema persiste. Sei que esse não é o meio adequado para lhes comunicar isso; sei que o correto seria ligar de novo, mas descarto esse caminho porque, além da hercúlea dificuldade em falar com vocês por telefone, cheguei à conclusão de que não há confiança recíproca e, dessa forma, prefiro registrar por escrito o meu descontentamento. Vocês não confiam em mim, pois, sempre que entrei em contato para tratar de outros assuntos, tive de fornecer diversos dados pessoais até todos aí se convencerem de que eu era eu mesmo. De minha parte, não lhes devoto confiança pelo princípio da reciprocidade e também porque, em determinada ocasião, um de vocês, insuflando esperança no meu peito, me veio com o gerundismo “vou estar verificando”, mas desapareceu logo em seguida ao som de mais música clássica até a ligação cair.
A propósito, nada contra essa louvável tentativa de usar Beethoven para agradar ao cliente, mas creio que gostar de música clássica pressupõe um refinamento cultural considerável; nessa toada, quando o ouvinte é semelhante a mim, um pobre indivíduo de educação mediana, e ainda por cima com o pensamento voltado para os créditos do celular pré-pago que escoam pelo ralo enquanto em vão espera uma resposta, a coisa não funciona muito bem. Registrem aí: sua empresa, além de desorganizada, acabou com qualquer possibilidade de eu gostar de Beethoven. Acrescento que se escutar aquela musiquinha de novo é bem possível que eu seja tomado por impulsos homicidas irrefreáveis. Serei conhecido, graças a vocês, como “o homem que matava ao som de Für Elise.”
E, repito, o meu problema ainda não foi resolvido! Vou estar cancelando o serviço.
Autor:
Ataíde Alves de Menezes Júnior