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sexta-feira, 19 de abril de 2024

Semipresidencialismo: a reinvenção do golpismo

Parece que o Brasil precisará, ainda, de muitas décadas para se tornar uma nação democrática sem as ameaças de mudanças de regras em meio ao jogo.

Exemplo disso é a defesa do atual presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira, que nos últimos dias, em meio à enxurrada de pedidos de impeachment do presidente Jair Messias Bolsonaro, está pronunciando aprovação de emenda constitucional a fim de implantar no país o parlamentarismo às avessas, por meio do semipresidencialismo, sistema governamental onde o poder executivo central é entregue a membros do Congresso Nacional.

O proponente da Proposta de Emenda Constitucional (PEC), Samuel Moreira da Silva Júnior (PSDB-SP) argumenta que com esse sistema a sociedade ficaria menos abalada, considerando que para substituir o chefe do executivo não será necessária abertura de processo de impeachment de presidentes da república, pois, em casos de crise na governabilidade central — que poderão, inclusive, ser produzidas pelos congressistas oportunistas — basta trocar o primeiro ministro.

Não se pode negar que a pretensão do Congresso Nacional é um movimento para subtrair o poder dos presidentes da república.

Ao que tudo indica, a Terceira Via está abrindo mão da democracia a fim da conservação do poder por meio da eleição de maioria de congressistas de seu bloco político, pois, o modelo em proposição obrigará o chefe de governo — capacho do grupo detentor do maior quantitativo de deputados — a dividir o poder com essa maioria.

Quanto aos presidentes, se a PEC prosseguir e for aprovada, terão funções restritas à Defesa e Relações Exteriores. Serão apenas figuras simbólicas. Estátuas de ornamentação de espaço. Pior: o povo os elegerão, mas não será governado por eles, pois, o governo (poder executivo) caberá ao primeiro ministro e seu ministério, composto por elementos indicados pelos presidentes — sem poderes —, que somente comporão o gabinete se passarem pelo crivo dos congressistas.

Na realidade trata-se de manobra para aumentar o poder do presidente da Câmara Federal e torna-lo o político mais poderoso do país, tanto o atual como os posteriores.

A esse respeito, e em tempo atual, cabe observar que enquanto a sociedade está concentrada na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Covid-19, os deputados federais, liderados por Lira — que já concentra muitos poderes—, estão aprovando projetos de interesses do atual presidente da república e que certamente impactarão a vida dos brasileiros, o que os meios de comunicação têm denominado de ‘Rolo compressor de Arthur Lira’

Ocorre que a PEC está longe de atingir as assinaturas necessárias para sua tramitação, o que indica a dificuldade no seu prosseguimento. Isso pode ser compreendido como ponto positivo, pois, se aprovada, o povo perde o direito de escolher quem deve governa-lo.

Porém, não se pode duvidar que esse movimento, da maneira como tem sido cogitado, carregue a intenção de impedir possíveis avanços progressistas no país e colocar em xeque interesses de grupos tradicionalistas, presentes no Estado Brasileiro.

Vale ainda rememorar que a mudança de sistema de governo já foi testada em dois plebiscitos no século XX, sendo um em 1963 e outro em 1993, quando em ambos, o povo brasileiro optou pelo sistema presidencialista, frustrando o intento daqueles que pretendiam manter a manipulação do poder central do país.

Ainda que a proposta esteja em etapa inicial de debate e cogite a implantação do sistema a partir 2027, não se pode duvidar de possível manobra para antecipar a imposição do modelo pretenso. E a aprovação, por meio do Congresso, de uma demanda reprovada duas vezes pela sociedade será uma fraude contra o povo e revelará que os congressistas estão com medo dele. Ao que parece, a pandemia da Covic 19 está terminando pelas bandas do Planalto. O mal que ronda por lá agora é uma epidemia: a demofobia.

Em conclusão, a opção pelo semipresidencialismo é a reinvenção dos árduos golpes até agora aplicados na vida política brasileira. Cabe ao povo e aos movimentos democráticos se posicionarem em estado de alerta se quiserem manter o direito, arduamente e conquistado em tempo muito recente, de escolher um presidente com poder de governar.

Autor:

Pedro Paulino da Silva, graduando em Ciências Sociais e Mestre em Educação.

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