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quarta-feira, 24 de julho de 2024

Walküren – As Três Marias

Capítulo Trinta e Cinco

– Meninas, vamos dar uma parada?

– Acho bom… os cavalos estão cansados…

– Além disso… não sei vocês, mas eu já estou com fome…

– E então, Bel? Sabe onde estamos?

– Não faço a menor ideia… mas reconheço o lugar…

– Eu, também… e você, Graça?

– Meninas, esse é o lugar em que nos encontramos nos sonhos.

Realmente, era onde toda vez que as três tinham um sonho sincronizado, acabavam se encontrando. Mas estavam tão acostumadas com a situação que nem se preocuparam com isso. Como disse, elas já conheciam o lugar em que se encontravam. Sabiam onde estava cada pedra, cada ramo de árvore… era como se tivessem vivido ali a vida toda. Graça escolheu um lugar para deixar os cavalos pastarem. Rosa tratou de pegar uma vara para pescar, pois sabia que o rio era rico em peixes. Enquanto isso, Izabel tratou de recolher um pouco de lenha, limpar um pedaço do lugar e montar acampamento. Não estavam com pressa de chegar onde quer que fosse… portanto resolveram que passariam a tarde por ali, apreciando a natureza.

Na verdade, elas não tinham a menor noção do porque estarem ali. Simplesmente seguiram o impulso e se perderam pela estrada. “Se perderam” não é bem o termo. Embora não tivessem a menor ideia do porquê, sabiam que deveriam ir para algum lugar, onde teriam que fazer alguma coisa… estavam sendo guiadas por uma força superior à sua vontade. 

Izabel nem se despediu de seus filhos. Para o marido disse apenas que precisava partir, e que talvez não voltasse mais. Pediu para que ele conversasse com sua irmã, para que ela cuidasse definitivamente de seus filhos. Não foi ver sua mãe, embora soubesse que poderia ser a sua última oportunidade. Quanto à Rosa, chegou na Escola portando as armas na cintura. 

Quando a Diretora a viu assim trajada, levou um susto. Mas logo se recompôs. Ouviu o que sua funcionária tinha a dizer e, no final, a dispensou do serviço. Claro que ficou chateada, pois Rosa era muito querida pelas crianças. Conseguir uma substituta para ela não seria fácil… mas era o que Rosa desejava, então fazer o que?…

Graça? Para ela foi um pouco mais simples… Não tinha família nem emprego… na verdade, era empregadora. Simplesmente nomeou sua empregada doméstica como dona de tudo aquilo que lhe pertencia. Não pretendia voltar para a Capital. Para morar e trabalhar, não… visitar a sua dedicada auxiliar, talvez…

Depois de saborearem os peixes pescados por Rosa, as três se espreguiçaram e resolveram tirar uma soneca. Apesar do sol forte, a sombra das árvores e a brisa do vento deixavam o local aconchegante. Logo, as três estavam ressonando. O que, se pensarmos bem, não é uma coisa muito inteligente de se fazer em um lugar ermo… mas é claro que seus sentidos estavam ligados, e ao ouvir um relincho, as três se puseram de pé, como impulsionadas por uma mola. Armas em punho posicionaram-se defensivamente, procurando o que teria causado a reação de sua montaria. Apenas o silêncio em a sua volta. Mas os animais estavam agitados, portanto tinha que estar acontecendo alguma coisa nos arredores…

– Meninas….

– O que foi, Graça?

– É só eu, ou vocês também estão notando algo estranho?

– Como assim?

– O céu… a cor do céu está diferente…

– Você tem razão…

– E tem mais uma coisa…

– Já sei… não estamos sozinhas…

– Isso… e sabem o que a gente tem que fazer?

– Cair fora daqui?…

– Com certeza… Rosa, você arreia nossos cavalos enquanto eu e a Bel cuidamos da nossa segurança…

E assim fizeram… Enquanto Rosa preparava as montarias, Graça e Izabel ficavam ao lado da amiga, prontas para qualquer eventualidade que ocorresse. Mas que não ocorreu.  Quando tudo estava pronto, as três montaram seus animais e saíram em passo lento, cautelosas. Olhavam todos os lados, uma mão nas rédeas e outra na coronha da arma. E assim seguiram, até que a sensação de algo… ou alguém… próximo, passou. Passada a sensação de perigo, resolveram apressar o trote dos animais… quanto mais rápido chegassem em um povoado, melhor. Dali a umas duas horas a noite cairia e elas não queriam estar sozinhas no campo quando esta chegasse.

O sol estava descendo no horizonte, quase se escondendo atrás das montanhas, quando avistaram as primeiras casas de Espírito Santo… não, elas não sabiam que era para lá que se dirigiam. Mesmo quando andavam perseguindo bandidos, atrás de recompensas, nunca haviam atravessado aquelas paragens. Mas ali estavam. E sentiam que tinham chegado ao seu destino…

Quando entraram na rua principal as poucas pessoas que estavam por ali não puderam deixar de notar as três garotas. Eram bonitas, vistosas. É claro que Rosa, com seus cabelos dourados, chamava atenção. Izabel, miúda, mas com traços fortes, cabelos negros como a noite e uma tez parda não passava despercebida. E Graça, pele alva e cabelos castanhos, olhos de uma intensidade sem igual, fazia com que todos se voltassem para admirá-la. E as três seguiram para o estábulo público, onde deixariam seus animais descansarem durante a noite.

Animais acomodados, era hora de procurarem um lugar para dormir… e comer também, é claro. Quando entraram na primeira pensão que avistaram, uma certa pessoa estava em uma mesa dos fundos… e quando as viu, quase não acreditou… Adivinha quem era? Sim, isso mesmo… era o Juvêncio!

As três moças escolheram uma mesa e pediram o jantar. Enquanto esperavam chegar seu pedido, examinaram o local, para certificar-se que estavam em segurança. Notaram que o delegado da cidade chegou, acompanhado de mais duas pessoas, e se dirigiu para o fundo da sala. Ele sentou-se e começou a conversar com alguém que já estava ali… não deram muita atenção, pois seus pratos estavam sendo servidos em sua mesa. O frango assado com macarrão ao sugo (era o prato do dia) em sua frente não deixou dúvidas… atacaram seus pratos como se estivessem a um mês sem comer…. bem, uma comida bem feitinha, como aquela realmente a um bom tempo não comiam, pois estavam na estrada já a alguns dias…

Terminada a refeição, dirigiram-se para o quarto que haviam alugado para passar a noite. Quando estavam próximas da mesa onde se encontrava o delegado, alguém as chamou pelo nome. Viraram-se instantaneamente e a surpresa estampou-se em seus rostos. Afinal, não esperavam encontrar nenhum conhecido naquele fim de mundo…

Tania Miranda
Tania Miranda
Trabalho na Secretaria de Estado de Educação do Estado de São Paulo e minha função é "Agente de Organização Escolar", embora no momento esteja emprestada para o TRE-SP, onde exerço a função de "Auxiliar Cartorário". Adoro escrever, e no momento (maio de 2023) estou publicando meu primeiro livro pela Editora Versiprosa...

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