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sexta-feira, 28 de fevereiro de 2025

Cara, Tereza.

Escrevo-lhe, minha fiel amiga, para lhe dizer que a solidão se apoderou da minha existência. Mas veja, utilizarei desse sentimento atormentador para conseguir me expressar. Não se engane, esse não é um desabafo qualquer, é sobre as minhas mortes. Dedico as mais diversas crises de ansiedade que eu tive, porque eu estava sozinha e quase morta. Estar sozinho não é a melhor opção, mas é uma escolha. Não quero que você, Tereza, carregue essa dor, porque o fardo de ser eu deve pertencer somente a mim. Tenha a concepção que fui obrigada a expor a minha vida trágica e sem cor. Quero que saiba, de início, que quero rosas negras e velas vermelhas em meu caixão de pedra, bem como quero que o silêncio prevaleça.

Certa vez eu vi uma rosa despedaçar. É algo triste, acredite. Suas pétalas vibrantes impõem poder e resistência. Ela adquire uma cor pálida, padecendo sobre uma superfície dolorosa e sem vida. Cuidar de uma rosa é uma tarefa complicada, somente pessoas responsáveis podem fazer isso. A primeira pétala de uma rosa indica o nascimento da dor, o seu primeiro trauma. O trauma é como um espelho quebrado, que se não for recolhido com cuidado, lhe corta profundamente. O vidro é afiado, nele você pode ver a beleza, mas também a dor, a amargura, a ingratidão, a insuficiência, tudo aquilo que você conhece.

Estou caminhando a tanto tempo, Tereza. Dias intensos e sem descanso. As minhas emoções me tornam mais forte, cada dia mais forte. Talvez eu esteja pensando em como exteriorizar toda essa dor que prevalece em minha alma. A seletividade é presente, eu enxergo isso todos os dias. Noites intensas, intensas noites. Onde você estava quando eu precisei de você? Eu sou de vidro, não me deixe cair. Eu sou de porcelana, não me arranhe. Os meus olhos vêem os mínimos detalhes, assim como o meu corpo denuncia o que eu sinto. Vejo, vejo, vejo, mas ninguém me vê. Tal contradição me persegue. A estrela mais brilhante, mas invisível. Estou sob uma chuva de cacos pontiagudos, mas eu não estou sangrando, eu não estou. Eu estou vazia. Eu sou um jardim sem flores. Eu sou a floresta sem árvores. Eu sou o rio sem água. Vazia eu era, uma era vazia, que vazia prevaleceu. Eu morri quatro vezes, quatro personalidades nasceram, quatro pessoas surgiram.

Minha casinha, tão pequenina, tão maltratada. Eu vi raios cair sobre ela, eu vi pessoas atirarem pedras sobre ela. Ela sobreviveu, mesmo com todo o tormento. Lá eu estava, sentado, assistindo a chuva cair. Era a noite mais triste, eu podia ver a dor estampada naquele céu negro. A última gota d’água caiu sobre o chão, e, como um suspiro, minha vida foi levada. A quinta pessoa nasceu e junto com ela o nascer do Sol. Vivi para contar. Contei, mas não consegui me expressar. Expressei parte da dor. Dor que poucos vêem, vêem mas não sentem. Eu tenho um barquinho, ele é em formato de coração, somente pessoas que me entendem tem o privilégio de entrar nele. Sou poeta quando a melancolia prevalece. Me despeço todos os dias, porque, talvez, todas essas facas que estão em meu corpo, se tornem flores quando o desencarne acontecer. Vazia eu era, uma era vazia, que vazia ela prevaleceu.

Com extrema solidão, Cisne.

Autoria:

Lise

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