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quinta-feira, 25 de julho de 2024

A inteligência artificial chega à diplomacia

A prática da diplomacia tradicionalmente envolvia o poder de barganha, canais secretos de comunicação e a empatia entre os negociadores. Mas uma nova era está chegando, na qual os insights desapaixonados gerados por algoritmos de inteligência artificial (IA) e técnicas matemáticas, como a Teoria dos Jogos, desempenharão um papel crescente nas negociações entre as nações.

Quem faz essa afirmação é o professor Michael Ambühl, antigo ministro de relações exteriores da Suiça e um dos fundadores do   primeiro centro para aplicação da ciência na diplomacia.   Ambühl complementa dizendo que   os avanços recentes em IA e aprendizado de máquina mostram que essas tecnologias agora têm um papel significativo a desempenhar na diplomacia internacional.

O uso de IA nas negociações internacionais está em um estágio inicial, com o uso de aprendizado de máquina para avaliar a integridade de bases de dados e detectar notícias falsas, de forma a garantir que o processo diplomático tenha bases confiáveis. No futuro, essas tecnologias poderão ser usadas, por exemplo, para identificar padrões nos dados econômicos que sustentam os acordos de livre comércio.

O centro do qual Ambühl é um dos fundadores, o Lab for Science in Diplomacy, também se concentrará na “engenharia de negociação”, na qual técnicas matemáticas existentes, como a Teoria dos Jogos, são usadas para ajudar a orientar uma discussão ou para criar diferentes cenários antes de iniciar as conversas.

Essas ferramentas não são novas. A Teoria dos Jogos foi desenvolvida na década de 1920 pelo matemático húngaro-americano John Von Neumann, inicialmente para formalizar o conceito de “blefe” no pôquer e, posteriormente, para avaliar cenários de ataque nuclear durante a Guerra Fria. No entanto, até recentemente, tais técnicas não eram usadas na área da diplomacia, “não por falta de tecnologia, mas sim por falta de conhecimento – diplomatas não estão acostumados com isso”, disse Ambühl. 

Mas, à medida que o mundo se torna mais experiente em tecnologia e dados, aqueles que ignoram os métodos quantitativos correm o risco de se colocarem em situações de inferioridade. Ambühl disse que, como principal negociador da Suíça na UE, fez simulações com base na Teoria dos Jogos antes das negociações que levaram a Suíça a aderir ao acordo de Schengen, uma convenção entre países europeus sobre   abertura de fronteiras e livre circulação de pessoas e a uma série de acordos com a UE sobre impostos, comércio e segurança. As simulações indicaram que se as negociações ocorressem como um pacote, e não sequencialmente, a Suiça seria beneficiada; por essa razão o governo suíço insistiu nesse formato para as negociações, tendo obtido sucesso.

Adotar uma abordagem matemática também pode ajudar a “desemocionalizar” os conflitos, como aconteceu em 2005, quando o Irã negociou com a ONU uma redução do   número de centrífugas que produzem combustível para armas nucleares. O assunto foi discutido com base em números, chegando-se a uma solução satisfatória.

Essa abordagem   mais científica não significa abandonar os métodos tradicionais, pois não se pode negociar bem não se souber fazer isso.

|No entanto, há risco de que essas novas abordagens possam gerar problemas, com IAs mal construídas levando a soluções diplomáticas que são matematicamente corretas, mas têm consequências desastrosas no mundo real – não se pode ir à guerra porque um   algoritmo decidiu isso; eles devem ser apenas   ferramentas de apoio à decisão.

Mas como não se pode confiar cegamente na IA, também não se pode confiar cegamente nos políticos – é preciso fazer uma combinação inteligente de novas tecnologias e na análise política.

Autor:

Vivaldo José Breternitz, Doutor em Ciências pela Universidade de São Paulo, é professor, consultor e diretor do Fórum Brasileiro de Internet das Coisas

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