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terça-feira, 23 de julho de 2024

O papel do STF na construção de uma sociedade livre, justa e solidária

O texto constitucional pátrio, ainda que hierarquicamente superior às demais normas nacionais, não está isento de enfrentar violações ao seu conteúdo, seja por atos do Poder Público ou por legisladores infraconstitucionais que destoam do apregoado na Carta Magna. Nesta perspectiva, a própria Constituição Federativa de 1988 apresenta em seu rol legal dois sistemas de autodefesa: o primeiro denominado de Controle Difuso e o segundo de Controle Concentrado que, conjuntamente, formam aquilo que a literatura compreende por Controle de Constitucionalidade.

Neste cenário, é oportuno destacar que apesar do Poder Legislativo ser tipicamente responsável para legislar e exercer controle sobre as normas de direito brasileiro, os Poderes Executivo e Judiciário podem assumir esta responsabilidade atipicamente nos casos de omissão e/ou inobservância dos princípios constitucionais por parte do Poder originalmente delegado para tal. Assim, o Supremo Tribunal Federal (STF), guardião da Constituição de 1988[1], exerce um importante papel na Jurisdição Constitucional brasileira como, sobretudo, garantidor dos direitos fundamentais da pessoa humana[2], na expectativa de construir uma sociedade livre, justa e solidária.

Nas palavras de Hans Kelsen (1980), esta jurisdição demonstra-se como um significativo instrumento do sistema democrático para proteger e garantir os direitos das minorias. Ressaltando que,

A simples possibilidade de impugnação perante a Corte Constitucional parece configurar instrumento adequado para preservar os interesses da minoria contra lesões, evitando a configuração de uma ditadura da maioria, que, tanto quanto a ditadura da minoria, se revela perigosa para a paz social. (KELSEN, 1980, p. 144)

Nesta perspectiva, ainda que a duras críticas e posicionamentos contrários à participação judiciária na elaboração legislativa[3], é notório que a Corte Suprema do Brasil comporta-se de modo a garantir que as normativas pátria acompanhem o desenvolvimento da sociedade brasileira sem retroagir preceitos fundamentais dispostos na Lei Maior. Figurando, portanto, “como árbitros do processo de representação das democracias contemporâneas para que as maiorias não destruam as minorias” (ALVES; BREGA FILHO, 2015, p.4).

Não obstante, o STF tem atuado de forma decisiva na resolução de conflitos que envolvem a proteção de direitos de grupos minoritários, como as mulheres, os negros, a comunidade LGBTQI+ e os povos indídenas. Nessa conjuntura, é oportuno trazer como exemplo a recente decisão do Supremo em garantir os direitos das minorias que residem nas localidades periféricas do Rio de Janeiro, ao acolher a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) de n° 635, reconhecendo e sanando as violações resultantes da então política de segurança pública do respectivo estado, sobretudo no que se dizia respeito a notória letalidade da atuação policial na região[4].

Destarte, entretanto, que a Jurisdição Constitucional “deve ser exercida em momentos excepcionais e com grande cautela, pelo risco autoritário que envolve” (BARROSO, 2019, p. 25). Todavia, apesar de não caracterizar-se como um instrumento que findará perpetuamente assuntos complexos, é fundamental para proporcionar a concretização de direitos constitucionais basilares quase que instantaneamente (CARVALHO FILHO; IOTTI, 2020).

REFERÊNCIAS

ALVES, Fernando de Brito; BREGA FILHO, Vladimir. Termidorizar a deliberação: o papel das cortes constitucionais nas democracias contemporâneas / Finishing the deliberation: the role of constitutional courts in contemporary democracies. Revista Brasileira de Direito, Passo Fundo, v. 11, n. 1, p. 124-134, ago. 2015. ISSN 2238-0604. Disponível em: https://seer.imed.edu.br/index.php/revistadedireito/article/view/948/966. Acesso em: 22 mar. 2022.

BARROSO, Luís Roberto. Os três papéis desempenhados pelas Supremas Cortes nas democracias constitucionais contemporâneas. Revista da Emerj, Rio de Janeiro, v. 21, n. 3, t. 1, p. 11-35, set./dez. 2019. Disponível em: https://www.emerj.tjrj.jus.br/revistaemerj_online/edicoes/ revista_v21_n3/tomo1/revista_v21_n3_tomo1_11.pdf. Acesso em: 23 mar. 2022.

CARVALHO FILHO, José S.; IOTTI, Paulo. Legitimidade constitucional das decisões do STF sobre direitos LGBTI+. Consultor Jurídico, 19 dez. 2020. Observatório Constitucional. Disponível em: https://www.conjur.com.br/2020-dez-19/observatorio-constitucionallegitimidade-constitucional-decisoes-stf-direitos-lgbti. Acesso em: 23 mar. 2022.

KELSEN, Hans. Wesen und Entwicklung der Staatsgerichtsbarkeit, VVDStRL 5, 1928, p. 80-81; Cf. também tradução italiana de Carmelo Geraci, ‘La Garanzia Giurisdizionale della Constituzione’. In: La giustizia costituzionale, Milão, 1980.


[1] Art. 102, CRFB/88.

[2] ADI 2.010-MC, Rel. Min. Celso de Mello, DJ 12/04/02.

[3] LEAL, Fernando. Até que ponto é possível legitimar a jurisdição constitucional pela racionalidade? Uma reconstrução crítica de “A razão sem voto”. VILHENA, Oscar. GLEZER, Rubens (Orgs.). A razão e o voto. Diálogos constitucionais com Luís Roberto Barroso. São Paulo: FGV Direito SP Editora, 2017.

[4] STF. Plenário. ADPF 635 MC-ED/RJ, Rel. Min. Edson Fachin, julgado em 2 e 3/02/2022 (Info 1042).

Autora:

Heloísa Joaquim Mendes

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