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domingo, 24 de novembro de 2024

Imposto de Renda: não deixe para a última hora!

Madaleno anda preocupado e não sabe o motivo. Ontem ele jantou, assistiu TV, tomou remédio para pressão, colesterol, diabetes, triglicérides e artrite reumatoide, dentre vários outros que não lembra para que servem. Só esqueceu de tomar o remédio para a memória. Não dormiu bem e acordou preocupado com o que teria prejudicado seu sono. Pegou o jornal no hall social e leu: Hoje, último dia para entrega do Imposto de Renda. É isso! Esqueci da droga do Imposto de Renda! Foi direto para o computador.

            O escritório estava uma bagunça e Madaleno decidiu botar ordem. Depois, força, foco e fé na declaração. Não levaria mais que 1 ou 2 horas, mas o laptop pediu para atualizar o sistema operacional e ele achou melhor atender.

  • Atualização iniciada. Tempo estimado: 40 minutos.
  • Droga! Esqueci de atualizar. Mas ainda tenho tempo.

Madaleno precisava de um cafezinho. Pôs água na caneca, acendeu o fogo, viu as plantas secas na varanda e decidiu aguar. Retirou folhas mortas, limpou o piso e voltou à cozinha: a água evaporou. Pôs mais na caneca e foi ver o computador. Tela preta. Esqueceu de ligar na tomada e a bateria não aguentou. Maldita memória! Ligou o laptop na tomada e refez o processo.

O porteiro ligou avisando para colocar o lixo no corredor. O saco plástico estourou, ele arrumou outro, mas teve de limpar a meleca no piso. Pegou balde, pano, produtos de limpeza e limpou tudo. Abriu a porta e o faxineiro já tinha passado. Recolocou o saco na lavanderia e voltou para a cozinha. A água quase evaporou, mas sobrou um pouco para fazer um café curto.

O interfone tocou novamente. O manobrista disse que seu carro está brecado e ele esqueceu de deixar a chave no quadro. O elevador demorou e quando porta abriu, dona Carmela apontou que ele está sem máscara. Velha doida, pensou. Esqueceu que não é mais obrigatória. Voltou para pegar a sua, mas não lembrava onde guardou. Improvisou um lenço no rosto e desceu pela escada. Quando retornou, o café estava frio.

O computador ressuscitou. Tudo pronto para começar, exceto pelo alerta do antivírus vencido. Entrou no site para iniciar a compra, mas não lembrava a senha. Eita memória de galinha! Recuperou a senha e agora era só lembrar onde está o cartão de crédito. Após 28 minutos:

  • Compra finalizada com sucesso. Deseja instalar agora?
  • Não! Só comprei para colecionar! Claro que quero instalar, seu idiota!
  • Tempo estimado: 10 minutos. O computador será reinicializado.

A campainha tocou. Madaleno abriu a porta da sala e não viu ninguém. Tocou novamente e ele se zangou porque não lembra a diferença dos toques. Droga de memória! Era o porteiro no hall de serviço entregando o livro: “Exercícios de memória – como melhorar a memória e a concentração.” Ele não lembrava dessa compra. Assinou o protocolo e sentiu o estômago reclamar de fome. Viu o ímã de geladeira com o número do delivery e pediu almoço.

Voltou ao computador. Desta vez tudo certo. Ia acessar o site da Receita Federal quando viu 78 e-mails não lidos. 72 eram vendas: mangueira mágica, remédios para impotência, planos de saúde, aumento de pênis, mais planos de saúde, operadora de celular, Tarô digital etc. Cinco eram cobranças de contas  que esqueceu de pagar e um não abria. Forçou abrir e o laptop travou. Ele tinha se esquecido de desinstalar o antivírus antigo e refez todo o processo.

Enquanto aguardava, o interfone tocou: entrega de comida. No andar térreo, lembrou da máscara. Voltou, viu a porta da cozinha aberta e o cachorro do vizinho demarcando território junto ao fogão. Tentou espantar o animal,  levou uma mordida e não lembra onde está o band-aid. Pesquisou mordida de cão no Google, ligou para a farmácia, pediu remédios e band-aid. 

A portaria interfonou para ele ir buscar a comida, já fria. Reaqueceu no micro-ondas, ligou a TV e o telejornal lembrou do prazo para a declaração de renda. Largou tudo, foi para o computador e entrou no site da Receita:

  • Atualize o aplicativo Jawa para baixar o software do IR.
  • Droga, por que eles não lembram a gente antes?
  • Instalação do Jawa em andamento. O computador será reinicializado. Tempo estimado: 15 minutos.

Voltou à cozinha e almoçou comida fria. Retornou ao escritório e finalmente começou a preparar a declaração, mas não lembra onde estão os comprovantes. Após meia hora procurando, resolveu telefonar para o contador.

  • Alô Nicola! Tudo bem? Preciso dos comprovantes de rendimentos.
  • Estão aqui comigo. Por que precisa disso?
  • Helôu-ou! É para fazer a declaração de renda, ora bolas! Hoje é o último dia! Será que eu preciso te lembrar de tudo?
  • Madaleno, você me trouxe os comprovantes há um mês! Fiz sua declaração e entreguei na semana seguinte. Esqueceu?
  • Alô! É da farmácia? Qual é o melhor remédio para a memória que vocês têm?

Conhecem alguém assim? Esquecido e atrapalhado? Eu conheço, só não me lembro quem é. Agora vou encerrar este texto porque esqueci de fazer a declaração de renda e não acho os comprovantes.

Laerte Temple
Laerte Temple
Administrador, advogado, mestre, doutor, professor universitário aposentado. Autor de Humor na Quarentena (Kindle) e Todos a Bordo (Kindle)

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