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quarta-feira, 5 de novembro de 2025

Brasil em “modo beta”: Como IA e SaaS estão reprogramando a produtividade no país

O Brasil está vivendo um ponto de inflexão tecnológico raro. De um lado, o país tornou-se um dos maiores pólos de uso de Inteligência Artificial no mundo. De outro, desponta como terreno fértil para a consolidação de softwares SaaS (Software como Serviço) como motor da digitalização empresarial – ainda que possa ter muito o que avançar   em relação a outros países, como os Estados Unidos e a Europa. 

O retrato vem do cruzamento de duas fontes que ajudam a entender essa virada: o Relatório de Transformação Digital 2025 da Atlantico e o estudo LatAm AI Benchmarks 2025 da SaaSholic. Segundo a Atlantico, 82% dos brasileiros já possuem identidade digital pelo Gov.br, e o sistema gera R$ 9,7 bilhões em economia fiscal por ano. Isso não é um dado burocrático: é infraestrutura. É o tipo de base que viabiliza que bancos, fintechs, seguradoras e startups integrem dados públicos e ofereçam serviços personalizados em escala.

Não é à toa que o Atlântico chama o Brasil de “frontrunner digital da América Latina”: um país onde a conexão entre população, infraestrutura e empresas cria um ecossistema de inovação espontâneo, principalmente orientado à produtividade. Além disso, mais de 80% dos brasileiros usam as redes sociais todos os dias e passam 9 horas onlineEssa hiperconectividade é o combustível de um mercado que testa, erra e ajusta em tempo real, antes de regulamentar. 

Depois do fenômeno polêmico das bets, em 2026 veremos a proliferação do live commerce, com a vinda do TikTok Shops e outras iniciativas que tornarão o 2º maior mercado de influenciadores digitais em potenciais máquinas de venda de produtos e serviços. Além disso, o país está entre os três maiores mercados de uso de ChatGPT no mundo – mesmo que ainda as empresas não possuam uma visão clara de como usar IA dentro de suas organizações. 

De acordo com a pesquisa da SaaSholic, 87% das startups latino-americanas já utilizam IA em seus produtos ou operações, e apenas 3% não têm planos de adotar. Mas há um dado ainda mais relevante: mais de 60% das startups fundadas desde 2023 nasceram “AI-first”, ou seja, com a inteligência artificial como parte estrutural do modelo de negócio. Não se trata mais de “usar IA”, e sim de pensar empresas com IA desde o primeiro dia. Logo, as corporações que ainda não possuem uma estratégia central clara de uso de IA e potenciais aplicações, correm risco real de obsolescência.

Podemos ver como exemplos os casos como o da Clicksign, que lançou o “Click.AI” para automatizar processos de assinatura e qualificação de leads, ou o da hiSofi, que substituiu humanos por agentes verticais de IA em cobranças, com custos 80% menores e 6x mais conversões, mostram o tamanho do salto operacional possível, conforme o levantamento LatAm IA SaaS Scenario 2025.Isso porque a onda de IA está intrinsecamente ligada à maturidade do modelo SaaS. Ainda segundo a SaaSholic, as empresas que adotaram essa tecnologia em seus processos reportam ganhos de até 50% em receita e ou produtividade às que ainda estão nos estágios iniciais. 

Nosso país se destaca por um traço cultural: enquanto em outros mercados há resistência à automação, por aqui há curiosidade. O consumidor brasileiro testa primeiro, ajusta depois um comportamento que as empresas B2B também incorporaram. Ferramentas de gestão, marketing, vendas e atendimento em nuvem não são mais promessas de eficiência: são o novo “básico operacional”.

Em um país onde 58% dos consumidores já compraram online semanalmente, mas com ticket médio ainda baixo, a digitalização virou questão de sobrevivência, não de status. É justamente nesse ambiente competitivo, de margens apertadas, que SaaS e IA mostram seu poder real: fazer mais com menos, mais rápido e preciso.

O relatório do Atlântico resume bem: o Brasil é pragmático. Enquanto outros países discutem o impacto ético ou regulatório da IA, 25% dos brasileiros já a utilizam diariamenteÉ o tipo de dado que explica por que o país, mesmo sem ser polo global de pesquisa, se tornou laboratório de aplicação — testando em larga escala soluções que depois ganham o mundo.

Se essa criatividade for bem canalizada, podemos sair do papel de “campo de testes” para o de exportadores de eficiência. As startups brasileiras já estão provando que é possível criar tecnologia com impacto global a partir de desafios locais, como a inclusão financeira, a cobrança inteligente e o uso de IA em varejo e logística.O que se desenha à frente é um Brasil em modo beta — testando, iterando, evoluindo. 

Um país que aprendeu a usar a fricção como combustível e que tem na combinação entre SaaS e IA um novo vetor de produtividade. A pergunta que fica é simples e estratégica: vamos transformar essa curiosidade digital em vantagem competitiva duradoura ou continuaremos sendo o país que adota primeiro, mas captura valor por último?

Autor:

João Chebante é CEO da Sinergis, empresa brasileira especializada em revenda de software e consultoria estratégica para a transformação digital. 

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