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quinta-feira, 25 de setembro de 2025

Bom Xibom Xibombom – a mesma dança da desigualdade, só que em ritmo de axé

“Bom xibom, xibom, bombom.” Quem nunca cantou esse refrão grudante que atire a primeira pedra — ou pelo menos dê uma sambadinha! A música “Bom Xibom Xibombom”, do grupo As Meninas, estourou nos anos 90 com aquela batida dançante típica do axé, mas seu real talento não está só no ritmo: é uma crítica social camuflada sob o charme da levada nordestina. E pasmem: ela continua tão atual que poderia sair direto das rádios em 2025, falando da nossa velha e boa desigualdade com o mesmo gingado.

“Analisando essa cadeia hereditária, quero me livrar dessa situação precária.” Eis a frase que já começa mostrando que não se trata só de festa. A “cadeia hereditária” não é DNA musical, mas a cadeia que passa de geração em geração — a desigualdade social cravada no Brasil como samba no pé. Se depender desse ritmo, parece que o problema vem dançando com a gente há gerações.

O refrão que não enjoa declara: “Onde o rico cada vez fica mais rico e o pobre cada vez fica mais pobre.” Se a desigualdade fosse um hit pop, essa frase seria o sucesso do verão eterno. A ironia musical aponta para o óbvio, só que com a suavidade de uma melodia que entra na cabeça sem esforço — diferente de debates políticos, que cansam só de tentar entender.

E ainda tem aquele desejo tão humano (e brasileiro!) expresso na letra: “Mas eu só quero educar meus filhos, tornar um cidadão com muita dignidade, eu quero viver bem, quero me alimentar, com a grana que eu ganho, não dá nem pra melar.” Em resumo, esse é o pedido básico que as pessoas fazem enquanto rebolam no meio daquela batida contagiante. Quem falou que protesto não pode ter gingado?

A “cadeia hereditária” cantada pela música poderia muito bem ser o samba de roda do pensamento do sociólogo português Boaventura de Sousa Santos, que ensina com elegância que as desigualdades sociais não são mera sorte ou azar do destino, mas uma coreografia estrutural e secular. Segundo Boaventura, vivemos num palco onde o pensamento dominante traça uma linha invisível entre os que são vistos, ouvidos e valorizados — e os que ficam na sombra, esquecidos e invisibilizados, como quem dança lá no fundo, sem microfone. Enquanto a música diz que “o de cima sobe e o de baixo desce”, Boaventura explica que essa dança desigual é comandada por sistemas históricos de poder e saber que perpetuam a exclusão, quase como uma coreografia que ninguém se atreve a mudar de verdade.

Talvez o segredo do sucesso e da atualidade dessa música seja exatamente essa combinação: enquanto o “Bom Xibom Xibombom” faz a gente mexer o corpo, revela algo que não mudou nem com os avanços tecnológicos e governos trocados. O rico sobe, o pobre desce, e a gente fica aqui, num ritmo que mistura festa com samba da resistência.

Dá pra discordar? Fica a dica para quem quiser um remake: só arranjar um DJ para remixar a desigualdade num ritmo animado e a gente vai dançar junto, afinal “bom xibom xibombom, ninguém segura esse país não”!

Querendo ou não, a música é a verdade brasileira que a gente prefere dançar a escutar — e isso é talvez o que a torna eternamente atual.

Manuel Flavio Saiol Pacheco
Manuel Flavio Saiol Pacheco
Doutorando e Sociologia e Direito pela Universidade Federal Fluminense (UFF), Mestre em Justiça e Segurança pela Universidade Federal Fluminense (UFF), Especialista em Desenvolvimento Territorial pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ).. Possui ainda especializações em Direito Tributário, Direito Constitucional, Direito Administrativo, Docência Jurídica, Docência de Antropologia, Sociologia Política, Ciência Política, Teologia e Cultura e Gestão Pública e Projetos. Graduado em Direito pela Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ). Advogado, Presidente da Comissão de Segurança Pública da 14º Subseção da OAB/RJ, Servidor Público.

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