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quinta-feira, 2 de outubro de 2025

Todo mundo fala de IA, mas quase ninguém está usando direito

Por Bruno Campos de Oliveira, COO da ADSPLAY

Hoje, é impossível abrir o LinkedIn sem ver alguém postando sobre inteligência artificial. Gente testando prompt, mostrando prints do ChatGPT, celebrando ferramentas, prevendo o fim do mundo ou o fim dos empregos. Mas, quando a gente troca a timeline por uma sala de reunião, o papo muda.

Porque uma coisa é “usar IA”. Outra, bem diferente, é usar no trabalho gerando valor real, executando tarefas complexas. E não apenas produzindo texto e imagens. Existe um mito confortável de que IA é um botão. Aperta, resolve e pronto — adeus planilha, adeus retrabalho, adeus gente. Não é assim. Fazer IA que funciona é como criar uma criança. No começo, chora por qualquer coisa, precisa de supervisão 24/7 e enfia a mão onde não deve. Aí aprende a falar… e fala umas barbaridades. Na adolescência, questiona tudo, faz drama, “alucina”. Só depois de muito cuidado, rotina e limites claros é que vai ganhando autonomia.

Com agentes de IA é idêntico. A gente treina um MVP em meia hora e quer substituir o CEO. A realidade é menos glamourosa: para um agente executar com excelência, ele precisa de contexto, dados limpos, feedback contínuo, processo e… paciência. Sem isso, ele fica eternamente no berçário. 

Ferramenta nova vira vitrine rápido. É o post do time testando prompt, o print do “olha que louco”, o hack do momento. Tudo isso é ótimo para começar. Mas a empresa vive de rotina, não de truque. Rotina pede qualidade consistente. Qualidade consistente não nasce do nada. Ela é construída. E construção, por definição, é repetição: medir, ajustar, medir de novo. É chato? Às vezes. É o que separa demonstração de produto de produto que paga a conta? Sempre. 

Sem poesia, em português claro:

Contexto: a IA precisa conhecer seu negócio. Vocabulário, catálogo, políticas, jeitos e “não-jeitos”. Se ela não sabe como sua empresa chama um produto, vai responder como a internet chama — e isso pode custar caro.

Dados: documentos atualizados, bases tratadas, fontes confiáveis. IA come dado. Se o prato vem estragado, a resposta vem junto.

Processo de feedback: quem é o “pai/mãe” desse agente? Quem revisa as primeiras 100, 500, 1.000 respostas? Quem fecha o ciclo, corrige, etiqueta e ensina a melhorar?

Objetivo claro + métrica simples: “produzir briefing publicitário 100% dentro do template”. Por que sem norte, qualquer rota serve. E ela pode te levar a lugar nenhum

Governança: limites do que pode e do que não pode, logs de conversa, segurança de dados, trilhas de aprovação. Profissionalizar cedo evita apagar incêndio depois.

Mas vale a pena? Muito. Porque, ao contrário de pessoas, quando a IA aprende mesmo, ela não esquece. Ela roda de madrugada, não pede aumento, não chega atrasada porque choveu, não se distrai com notificação. E o mais interessante: aprendizado compõe. Quanto mais você ensina hoje, mais rápido ela aprende amanhã.

Isso cria um efeito bola de neve de produtividade. O primeiro mês parece lento. No terceiro, a curva vira. No sexto, você se pergunta como fazia sem. É aí que a adoção deixa de ser moda e vira infraestrutura.

Nos últimos 12 meses, vejo três armadilhas comuns que empacam os projetos:

  1. Piloto sem dono: começam “só para testar” e ninguém é responsável pelo pós-demo. O projeto não morre, fica em coma.
  2. Escopo ambicioso demais: tentam começar pela tarefa mais complexa da companhia. A chance de frustração é alta. Comece pequeno, crítico e mensurável.
  3. Confundir autonomia com abandono: “botei o agente no ar, agora ele se vira”. Não. Autonomia é resultado de acompanhamento, não a ausência dele.

Bem mais complexo que um post de LinkedIn. Leva tempo? Leva. Dá trabalho? Bastante. E é exatamente por isso que, quando funciona, vira vantagem competitiva difícil de copiar. 

IA não substitui liderança, senso de dono ou estratégia. Mas pode dar o maior ganho de produtividade e eficiência que já vimos na história da humanidade.
É comparar a capacidade de produção de um artesão com a de uma fábrica, depois da revolução industrial.

Então, a pergunta que importa: Você está criando uma IA com contexto, rotina e cuidado ou se está brincando? Porque usar IA “de vitrine” é fácil. Construir IA “no chão de fábrica” dá trabalho. E é justamente esse trabalho que paga o bônus no final do ano.

Cristiane Marsola
Cristiane Marsola
Jornalista com quase 30 anos de experiência em redação e agências de relações públicas

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