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terça-feira, 28 de outubro de 2025

O encanto que não se compra

Ana estava sentada na rede de sua varanda, quando recebeu o telefonema da vizinha a chamando para ir tomar um café com ela.

Marta, uma senhorinha de seus quase oitenta anos, sempre foi muito prestativa e atenciosa e Ana sentia-se muito confortável e acolhida por ela.

As conversas tidas com aquela senhorinha sempre foram muito animadas e Ana estava precisando justamente disso naquela tarde: animação.

Levantou-se da rede, trocou o pijama favorito por uma roupa leve e seguiu até a casa ao lado. Ao tocar a campainha, Marta veio toda serelepe recebê-la.

Ana estava meio desmotivada naquele dia por enes fatores, mas não deixou-se levar pela desmotivação. Na verdade, ela estava precisando mesmo de companhia e Marta era a pessoa ideal.

Ao entrar na casa de Marta, Ana sentiu o delicioso perfume de café coado na hora; a mesa posta com deliciosos pães de queijo assados naquele instante, torradas, frutas, pães, e uma manteiga que Ana não conhecia ainda.

Conversa vai, conversa vem, Marta pergunta à Ana se ela já tinha experimentado pão de queijo com manteiga ao que Ana acenou negativamente.

Marta deu um sorriso tão gostoso dizendo: “Experimente! Depois disso, você nunca mais vai comer pão de queijo sem manteiga. É meu predileto!”

Ao experimentar aquela combinação nunca feita antes, Ana se maravilhou com o gosto e sentiu-se teletransportada para sua infância. Foi como se ela pudesse sentir a presença de sua avó materna fazendo os quitutes que ela tanto amava. Naquele momento ela voltou a ser criança com um simples gosto que sentiu.

Aquela deliciosa manteiga derretida no pão de queijo foi uma das melhores experiências sentidas por ela por tê-la feito voltar ao tempo.

Ana não experimentou só um pão de queijo com manteiga, mas vários que perdeu as contas. O gosto delicioso do pão de queijo já era de se esperar, mas aquela manteiga, ah!, aquilo era pura iguaria.

Aquela tarde voou e Ana despediu-se calorosamente de Marta e, claro, pediu para anotar o nome da manteiga para poder comprar para consumir em sua casa. Marta deu uma gargalhada gostosa e disse: “Eu sabia que você ia gostar!”.

Ao chegar em casa, a primeira coisa que Ana fez foi pegar o carro e ir direto ao mercado comprar aquela manteiga que tinha despertado tantas sensações gostosas. Foi em um, outro até que achou num terceiro mercado.

Ana parecia uma criança ao chegar em casa com as compras. Seu esposo vendo a algazarra de Ana ao chegar em casa foi ao encontro dela e quis saber o motivo de tanta empolgação ao que ela respondeu animadamente que havia encontrado a manteiga dos seus sonhos e tirou da sacola a dita cuja mostrando para o marido como se fosse um troféu.

Ele, não entendendo nada, viu que era uma simples manteiga, mas para Ana era mais que isso. Aquela gordura animal tinha feito um verdadeiro milagre naquela tarde na vida dela e ela queria que aquele sentimento perdurasse e por esse motivo foi em busca daquela sensação que era vendida no mercado.

No dia seguinte, Ana acordou mais animada que nos dias anteriores e foi para cozinha fazer seus quitutes. Montou a mesa como se fosse receber alguém muito importante, tirou do armário as xícaras guardadas nas caixas que havia ganhado de presente em seu casamento, ou seja, há mais de dez anos, e lamentou-se não ter feito isso antes, mas, enfim, o momento era aquele.

Ao terminar de montar a mesa, Ana foi toda empolgada chamar seu esposo para dividir a mesa com ela, ao que ele atendeu de pronto.

Ana não parava de falar para o esposo o quanto aquela manteiga era deliciosa e estava ansiosa por ver a reação dele também.

Mas algo não saiu como estava no script de Ana: o gosto sentido no dia anterior não se repetiu. Ana comeu outro pão de queijo com a tão falada manteiga, mas nada acontecia. Era apenas uma manteiga como outra qualquer.

O esposo de Ana, vendo a tristeza estampada no rosto dela, quebrou o silêncio e disse: “Você caiu na cilada da manteiga deliciosa da vizinha, né?”.

Ana não entendeu o comentário do esposo e não conseguindo disfarçar sua decepção perante aquela realidade que se desenhava à sua frente, sentiu a tristeza tomar conta do seu ser. Tudo o que Ana queria era ter aquela sensação da tarde anterior, mas aquilo havia se perdido no meio do caminho.

Mas, ao sentir o abraço do esposo, Ana compreendeu na fala dele que os sentimentos processados no dia anterior não estavam no sabor da manteiga, mas na magia de quando a vizinha dispensou o melhor dela para Ana fazendo com que sentimentos inigualáveis brotassem. Naquela manhã, a manteiga já não tinha o mesmo encanto. O sabor era o mesmo das outras, mas o coração, não. Faltava Marta, faltava o afeto.

Consciente do quão privilegiada foi por ter tido aqueles sentimentos e o carinho dispensado por Marta, Ana teve a certeza de que Marta havia dado o melhor dela para Ana fazendo com que ela tivesse mais que um momento especial e isso aqueceu seu coração novamente.

Patricia Lopes dos Santos
Patricia Lopes dos Santos
Escritora, autora do livro "Memórias de uma depressiva", mãe de Sofia, Duda e Átila, me aventuro na escrita, onde me encontro totalmente.

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