Moro na capital paulista, esse universo à parte chamado São Paulo. Aqui, tudo é exagerado: são tantas vagas de trabalho quanto filas nos hospitais, avenidas que parecem não ter fim e, claro, um mar de carros que, nos horários de pico, transformam a cidade numa grande vitrine de faróis vermelhos — parada obrigatória, apesar da pressa. Dizem que o metrô integrado resolveu parte do problema, mas só para quem topa o desafio do transporte coletivo. Afinal, se depender do carro, prepare-se para virar parte do congestionamento.
Mas minha intenção nesta crônica é cutucar, com um pouco de humor e ironia, essa obsessão pela ostentação. Casas bonitas, apartamentos de luxo, carros importados: tudo parece gritar “nobreza” nas vitrines da cidade. Só que, convenhamos, caro leitor, a verdadeira nobreza não se mede em metros quadrados ou na cor metálica de um automóvel. Nobre mesmo é quem pratica gentileza, quem oferece um bom dia sincero no elevador, quem cede o lugar no ônibus lotado — e olha que, por aqui, isso é quase um ato revolucionário.
O problema é que, nessa selva de concreto, a pressa rouba de nós o tempo do olhar mais atento, da escuta generosa. Vivemos todos os meios estressados, preocupados em acumular riquezas e subir degraus invisíveis de uma escada social interminável. Sobra pouco espaço para aquilo que é realmente nobre — aquela solidariedade que não sai nas capas das revistas, mas que faz, ou faria, toda diferença.
Nestes tempos difíceis, a nobreza parece artigo em extinção. É cada um por si, correndo para escapar dos perigos diários. E não é exagero: andar distraído pelas ruas é pedir pra ouvir um “perdeu, playboy” e, em segundos, mediante uma arma apontada para nós, perdermos não só o celular, mas também a sensação de segurança — quando não, a própria vida. E nem as mansões escapam: são alvos dos chamados arrastões, provando que, por aqui, nem o luxo garante tranquilidade.
Aí vem a ironia: todo mundo quer ser nobre, mas falta coragem para praticar pequenos gestos nobres. E penso, sinceramente, que uma cidade verdadeiramente nobre não precisaria de grades, câmeras e vigilantes por todo canto. Seria aquela onde se pode andar de cabeça erguida, sem medo, sentindo que faz parte de uma coletividade que se cuida.
Outros países já conseguiram alcançar altos índices de segurança pública, e sempre me pergunto: por que não nós? Não estou aqui para jogar pedras na nossa polícia. Reconheço que manter a ordem em uma cidade com mais de 10 milhões de habitantes é tarefa digna de Hércules (ou de algum super-herói brasileiro). Mas gosto de ouvir histórias desses tais países “de primeiro mundo”, onde o cidadão pode ser nobre sem correr o risco de ser chamado de ingênuo.
Sonho, sim, com uma São Paulo menos violenta, onde as forças de segurança possam agir preventivamente, e não só correndo atrás do prejuízo. Sonho com um Brasil onde a nobreza não seja privilégio de poucos, mas hábito de muitos. Quem sabe, um dia, possamos dizer com orgulho que moramos em uma cidade verdadeiramente nobre — e, por que não, em um país à altura dos seus melhores cidadãos.