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segunda-feira, 3 de novembro de 2025

Adultização: entenda a nova lei e os impactos na saúde mental de crianças e adolescentes

Advogado explica como o Estatuto Digital amplia a fiscalização e prevê punições de até R$ 50 milhões, enquanto psicóloga alerta sobre os limites da exposição precoce para garantir uma infância mais protegida.

A proteção da infância no ambiente digital ganhou um novo capítulo no Brasil com a sanção da Lei 15.211/25, que institui o Estatuto Digital da Criança e do Adolescente (ECA Digital). A legislação surgiu em resposta a um debate nas redes sociais gerado a partir das denúncias do influenciador Felipe Bressanim Pereira, conhecido como Felca. Em vídeo, ele trouxe à tona a chamada adultização infantil, prática que expõe crianças e adolescentes a comportamentos e situações inadequados para sua faixa etária, especialmente em redes sociais e plataformas digitais.

O ECA Digital estabelece normas específicas para reduzir os riscos de exposição de menores, para prevenir a exploração comercial, a utilização de imagens em redes de pedofilia, a divulgação de apostas e a veiculação de conteúdos com conotação sexual, mesmo que implícita. A lei também reconhece que o ambiente digital se tornou parte central do cotidiano da nova geração, o que motivou a criação de novas regulamentações.

Conteúdo sob monitoramento

De acordo com as novas regras, vídeos, fotos e propagandas com crianças e adolescentes passarão a ter fiscalização mais rígida. Ainda que não haja nudez explícita, o material poderá ser considerado inadequado se oferecer riscos de exploração. A legislação prevê também a remoção de conteúdos prejudiciais das plataformas digitais.

O advogado em Direito Digital, Carlos Eduardo Holz, destaca que a nova legislação estabelece três pontos centrais para proteger crianças e adolescentes no ambiente digital: a vinculação do perfil ao de um responsável, a verificação de idade mais rigorosa e a fiscalização de conteúdos com teor de adultização.

“Qualquer conteúdo que prejudique a imagem da criança ou do adolescente, seja pejorativo, exploratório ou até mesmo uma publicidade feita de forma indevida, deve ser observado com muita atenção. Os pais precisam se preocupar e se atentar a esses pontos para evitar o risco de perder o perfil da rede social,” afirmou.

Responsabilidade das plataformas digitais

Um dos pontos centrais da lei é a responsabilização das empresas de tecnologia. Redes sociais, aplicativos de vídeos curtos e plataformas de streaming deverão implementar sistemas mais eficazes de verificação de idade, além de comprovar que existe acompanhamento de um responsável legal sempre que crianças ou adolescentes estiverem expostos em conteúdos digitais. O objetivo é impedir que a participação de menores na internet ocorra de forma desprotegida. 

O advogado explica que a nova lei muda a forma de responsabilização no ambiente online. Segundo ele, no mundo físico há atuação de órgãos como o Conselho Tutelar e o Ministério Público, mas no digital essa função passa a ser complementada pela Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD).

“É importante a responsabilização das plataformas. Precisamos proteger as crianças e adolescentes e, quando isso é descumprido, surge a questão: quem é o responsável? Quem deve adotar as medidas? Quem fiscaliza?”, questiona Holz.

O especialista ressalta que a lei prevê punições severas para empresas de tecnologia que não cumprirem as regras.

“Se a plataforma descumprir, haverá multa de até R$ 50 milhões e, em caso de reincidência, ela pode ser banida ou retirada do ar pela Anatel. É um ponto de muito alerta: terá que ser cumprido. Caso contrário, as consequências serão bastante drásticas para essas empresas”, esclareceu.

Educação digital e saúde mental

O ECA Digital também busca promover uma educação digital preventiva, envolvendo famílias, escolas e sociedade na criação de um ambiente online mais seguro. Especialistas ressaltam que a lei pode contribuir para reduzir os impactos emocionais e sociais da exposição precoce, fortalecendo a saúde mental e o desenvolvimento equilibrado das novas gerações, como explica a psicóloga jurídica Thayse Duarte: 

“A gente tem visto casos recentes que ganharam muita repercussão, mostrando crianças e adolescentes expostos a padrões estéticos, de comportamento e até emocionais que não correspondem à sua idade ou etapa de desenvolvimento. Essa exposição precoce pode trazer impactos negativos profundos, afetando a construção da identidade, a autoestima e até a saúde mental.

Por isso, quando falamos em estabelecer limites para o uso da imagem de crianças e adolescentes, trata-se de proteção. É uma forma de supervisão responsável: pensar em como essa criança ou esse adolescente vai usar a plataforma digital, garantindo um ambiente mais seguro.

Essa nova legislação vem justamente para frear práticas exploratórias e promover uma relação mais saudável e consciente com a tecnologia. Não é proibir, mas orientar o uso, fortalecendo a proteção da infância.

É essencial que famílias, escolas e até as próprias plataformas entendam que proteger a infância é garantir o direito da criança de viver plenamente sua fase de desenvolvimento, com saúde, segurança, dignidade e, claro, tempo para brincar”.

Um novo olhar do Judiciário

Outro avanço está na orientação de que o Judiciário adote uma postura mais sensível diante de casos envolvendo a exposição digital de menores. Ao julgar essas situações, magistrados deverão considerar não apenas os aspectos legais, mas também os direitos fundamentais e os impactos de longo prazo sobre a vida das crianças e adolescentes. Thayse destaca também a importância de um olhar sensível com esta temática: 

Quando a gente pensa no papel do Judiciário nesses casos de exposição digital de crianças e adolescentes, é importante destacar que esse olhar precisa ir além da norma, além da simples legalidade. A prioridade deve ser sempre absoluta: o interesse da criança e do adolescente.

Isso significa que cada decisão judicial precisa considerar também os impactos emocionais, sociais e subjetivos que essa exposição pode causar. Afinal, os efeitos não se restringem à infância, eles podem se estender para a vida adulta.

É fundamental reforçar que não estamos falando apenas de “imagem”. Trata-se de uma violência simbólica contra a infância, contra o direito de ser criança.

Por isso, o Judiciário deve atuar com sensibilidade, garantindo uma escuta qualificada e mantendo um compromisso ético. É reconhecer que o ambiente digital também é um território de cuidado, que exige supervisão e proteção especial, justamente porque envolve pessoas em desenvolvimento.

No fim das contas, é sobre assegurar a proteção integral e garantir que cada criança tenha o direito de viver plenamente sua infância, inclusive no mundo virtual.

 A íntegra da Lei 15.211/25 – Estatuto Digital da Criança e do Adolescente está disponível no portal oficial do Governo Federal.

Fotos dos especialistas:https://drive.google.com/drive/folders/1o-L0_WikKq1_Qu-9tGdRf8f_wNvDvVbK?usp=sharing

Sobre Carlos Eduardo Holz: Carlos Eduardo Holz é formado pela UFRJ, especialista em Direito Digital e atua na defesa de consumidores e influenciadores vítimas de abusos e fraudes em plataformas digitais.

Autoria:

Deivianne Jhasper

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