Sou imenso. Em minhas águas acolho, protejo e ofereço lar a incontáveis espécies.
Minúsculos seres microscópicos, gigantes apelidados de monstros, criaturas ainda não descobertas por vocês, todos cabem em meu ventre salgado.
Já pensaram que em mim está o fim? Não os culpo. Na verdade, sou início e desfecho, depende do olhar.
Sobre mim, vi sorrisos, choros, disputas, nascimentos e infelizmente, muitas vidas se partindo.
Alegro, acalmo, inspiro, mas também causo medo. Não por maldade: às vezes é preciso, e um dia vocês entenderão.
Lendas nasceram e morreram em meu azul profundo. Mistérios e belezas ainda dormem em minhas entranhas.
Como vibro ao ver a vida surgindo em minhas marés!
Mas também já presenciei batalhas sem sentido, e me perguntei: por quê?
Entristece-me ao ver existências se apagando em mim.
Objetos lançados ao acaso me ferem, ferem meus filhos.
Eu choro, sim, eu choro, quando vejo peixes engasgados, tartarugas presas em plásticos, o brilho de seus olhos apagando e partindo.
Meu sal disfarça as lágrimas, mas elas estão aqui.
Já vi arpões atravessarem meus grandes filhos, tingindo-me de sangue. Como dói.
Nem todos são cruéis. Há quem lute por mim, quem se organize para me limpar, e eu reconheço cada gesto. Mas ainda são poucos.
Eu permito que se divirtam em meu corpo líquido. Eu deixo.
Nunca se esqueçam: Eu permito.
Respeitem-me, e eu os respeito.
Não me alegra a morte de vocês. Por isso, quase sempre devolvo os corpos, em luto.
Mas paciência tem limite. Quando me revolto, muitos temem, fogem, com razão.
Roubaram meu espaço, matam meus filhos por ignorância, e despejam sujeira sem pensar.
Eu aviso antes de devolver. Ainda assim continuam.
Parem.
Eu acolho como a um filho cada um que me ama, teme e cuida. Abraço com carinho quem entende e zela por mim.
Ainda não sabe quem sou?
Prazer.
Sou o Mar.
