Ao longo da história, o crescimento populacional sempre respondeu a fatores externos: guerras, epidemias, desastres naturais.
A peste negra, entre 1346 e 1353, dizimou até metade da Europa.
O “baby boom” do pós-guerra, por outro lado, foi reação à sobrevivência — uma explosão de vida depois do trauma.
Mas agora, vivemos algo sem precedentes.
A humanidade não desacelera porque precisa. Desacelera porque quer.
Pela primeira vez, a crise demográfica não nasce da escassez, mas da escolha coletiva de não ter filhos.
Segundo dados da ONU, o mundo poderá atingir seu pico populacional antes de 2100 — e, a partir daí, entrar em declínio.
A Coreia do Sul já tem a menor taxa de natalidade do planeta: 0,72 filhos por mulher.
A China já registra perda de população.
O Brasil caminha no mesmo ritmo, com apenas 1,67 filhos por mulher, número abaixo da taxa de reposição (2,1).
O fenômeno não é biológico.
É comportamental.
Ter filhos virou sinônimo de custo alto, exaustão emocional e conflito com os ideais modernos de liberdade, autocuidado e performance.
A nova geração valoriza experiências, carreira, viagens, autonomia — e não vê na maternidade ou paternidade um projeto viável.
Só que isso cobra um preço.
A queda da natalidade mundial afeta a economia, o mercado de trabalho, os sistemas previdenciário e de saúde.
Com menos jovens entrando no jogo, sobra para os mais velhos manterem a engrenagem funcionando.
Estamos diante de um mundo que envelhece sem reposição.
Um futuro com escassez de cuidadores, professores, profissionais da saúde e inovação.
A pergunta que ecoa é direta:
Quem cuidará de nós, se não haverá mais “nós” no futuro?
Se antes o desafio era conter o excesso, agora é lidar com o vazio geracional.
E um mundo sem filhos é, no fundo, um mundo sem continuidade.
Sem legado.
Willians Fiori é neurocientista, psicanalista e especialista em longevidade, demografia e comportamento geracional. Professor no Hospital Israelita Albert Einstein e autor do livro Diversa-IDADE, atua como consultor em empresas e instituições que querem compreender as transformações demográficas e seus impactos sobre o futuro do trabalho, da saúde e da sociedade.