Estes dias recebi pelo whatsapp uma postagem da professora Adriana Polato com o seguinte texto:
“Os cientistas da linguagem deveriam ter mais valor, se pensássemos que tudo neste mundo acontece pela mediação da linguagem. Nossa consciência se forma na e pela linguagem.
Nossos atos se efetivam na e pela linguagem.
Pela linguagem, alteramos nossas consciências sobre o estado das coisas e de nós. Pela linguagem, tornamo-nos conscientes de quem somos, de quem são os outros para nós e em nós! Pela linguagem, somos e existimos. E se houvesse mais consciência sobre a importância do papel da linguagem, haveria mais ética e responsabilidade ao enunciar.”
Neste país, talvez neste mundo, tão polarizado, tenho me distanciado das redes sociais, evitando participar de qualquer embate ideológico extremista e, normalmente, desprovido de verdadeira inteligência. Porém, ao me deparar com uma formulação tão bem construída, consciente e pertinente, não resisti ao ímpeto de escrever este pequeno texto.
A Linguagem: Pilar da Consciência, Ação e Ética
O comentário da professora Adriana ressoa profundamente com a essência do que entendemos sobre o papel da linguagem em nossas vidas e na própria constituição do ser humano. É um lembrete poderoso de que, longe de ser apenas uma ferramenta de comunicação, a linguagem é o tecido fundamental de nossa realidade.
Como bem pontuado, nossa consciência não se forma isoladamente, mas sim na e pela linguagem. É através dela que organizamos pensamentos, percebemos o mundo, construímos e reconstruímos significados. Mais do que isso, nossos atos se efetivam na e pela linguagem. Uma ideia só se torna um plano, uma intenção só se materializa em ação, muitas vezes, após ser articulada, debatida e negociada linguisticamente. Mesmo em nosso mundo interior, o pensamento é, em grande parte, um diálogo silencioso conosco mesmos.
A linguagem nos permite alterar nossa consciência sobre o estado das coisas e sobre nós mesmos e os outros. É no intercâmbio verbal, na enunciação e na escuta, que nos tornamos conscientes de quem somos e de quem os outros são para nós. Nossas identidades são moldadas em um processo dialógico contínuo. Como o próprio Mikhail Bakhtin nos ensinou, “A vida é, por natureza, dialógica. Viver significa participar do diálogo: interrogar, atender, responder, concordar etc. Neste diálogo, o homem participa por inteiro e por toda a vida: com os olhos, os lábios, as mãos, a alma, o espírito, o corpo, os atos. Ele se investe totalmente na palavra, e a palavra investe-o em tudo.” (M. Bakhtin, em “Estética da Criação Verbal”).
Essa perspectiva bakhtiniana sublinha que a linguagem não é neutra; ela está sempre carregada de sentidos, de vozes, de histórias. Cada enunciado que proferimos é uma resposta a enunciados anteriores e antecipa respostas futuras. Compreender essa natureza dialógica e responsiva da linguagem é crucial.
É exatamente por essa compreensão profunda que a afirmação de que “se houvesse mais consciência sobre a importância do papel da linguagem, haveria mais ética e responsabilidade ao enunciar” faz tanto sentido. A ética e a responsabilidade não são adereços externos à linguagem, mas intrínsecas ao ato de enunciar. Se reconhecemos que cada palavra tem o poder de construir, desconstruir, informar ou desinformar, de aproximar ou afastar, de fortalecer ou fragilizar, então a responsabilidade pelo que dizemos e como dizemos se torna uma obrigação inescapável.
Valorizar os estudos da linguagem é uma questão de formação humana e cidadã. É investir na capacidade crítica de analisar discursos, na habilidade de construir argumentações sólidas e, fundamentalmente, na promoção de um diálogo mais ético e construtivo em todas as esferas da sociedade.