Diante da escalada dos crimes de guerra cometidos pela ocupação israelense na Faixa de Gaza e na Cisjordânia, a Espanha emergiu como um dos poucos países europeus a adotar uma posição ética e jurídica clara. O governo espanhol combinou condenações políticas com ações concretas para responsabilizar Israel e oferecer apoio real ao povo palestino, adotando medidas ousadas que vão além do discurso diplomático tradicional rumo a políticas tangíveis.
Enquanto Gaza enfrenta uma ofensiva sem precedentes liderada por Israel — em meio a um silêncio internacional e, por vezes, cumplicidade política — a Espanha atua para redefinir a postura europeia, apoiando os palestinos diante da política de extermínio, da expansão dos assentamentos e do desprezo contínuo de Israel pelo direito internacional.
A Posição do Governo: Da Retórica à Ação
As posições adotadas pelo governo liderado por Pedro Sánchez têm sido marcadas por uma coragem incomum no cenário europeu. O primeiro-ministro classificou as ações israelenses em Gaza como “genocídio”, criticando o silêncio internacional diante dos massacres. E mais do que palavras, a Espanha tomou medidas concretas, como:
- Reconhecimento oficial do Estado da Palestina, em coordenação com Irlanda e Noruega.
- Apoio à responsabilização internacional, votando a favor de resoluções no Conselho de Direitos Humanos da ONU e respaldando ações judiciais em andamento na Corte Internacional de Justiça (CIJ) e no Tribunal Penal Internacional (TPI).
- Operações de lançamento aéreo de ajuda humanitária sobre Gaza, com início oficial em 2 de agosto de 2025.
O Ministro das Relações Exteriores, José Manuel Albares, expressou a política externa de sua gestão em artigo publicado no jornal El País em 28 de julho de 2025, intitulado “Cerrar la herida de Palestina” (“Fechar a ferida da Palestina”). No texto, defendeu o reconhecimento do Estado Palestino, o fim das exportações de armas para Israel, sanções aos colonos israelenses e a suspensão de acordos com o Estado ocupante, reafirmando o compromisso da Espanha com a solução de dois Estados.
Os Partidos Espanhóis: A Esquerda Lidera o Apoio, a Direita em Constrangimento
O Partido Socialista Operário Espanhol (PSOE), liderado por Sánchez, tem sido a principal base do apoio institucional aos palestinos, contando também com o respaldo de coalizões como a Sumar — que inclui Izquierda Unida, Podemos e partidos regionais progressistas, como a Esquerda Catalã.
Partidos da esquerda, especialmente o Podemos e a Esquerda Republicana, têm adotado posições firmes e consistentes, exigindo a suspensão de toda cooperação com Israel — inclusive nos âmbitos militar e econômico. Em contraste, a direita espanhola tem se mostrado cautelosa, quando não cúmplice pelo silêncio. O Partido Popular, por exemplo, insiste na necessidade de “equilíbrio”, sem condenar explicitamente a ocupação.
Esse cenário político reflete um debate interno sobre o papel moral da Espanha em sua política externa: entre os que defendem princípios humanitários e legais, e os que se rendem às pressões geopolíticas europeias e norte-americanas.
Sociedade Civil e Solidariedade: A Palestina nas Ruas da Espanha
Desde o início da guerra em Gaza, cidades espanholas testemunharam grandes manifestações contra o genocídio e o silêncio das potências ocidentais. Organizações de direitos humanos, sindicatos e movimentos estudantis desempenharam papel fundamental na ampliação da conscientização sobre a causa palestina.
Sob a coordenação da Plataforma de Solidariedade com a Palestina, centenas de entidades locais em Madri, Barcelona, Sevilha, Bilbao e outras cidades intensificaram a pressão sobre o governo espanhol e o Parlamento Europeu. Universidades também se tornaram espaços de resistência, com apoio de federações estudantis de esquerda e docentes que exigem o fim de parcerias com instituições israelenses envolvidas em crimes de guerra.
Em 27 de setembro de 2024, a Confederação Geral do Trabalho (CGT), juntamente com movimentos estudantis e ONGs, organizou uma greve geral nacional em protesto contra o genocídio e para exigir a ruptura de relações militares e comerciais com Israel.
Também se destacou o papel do Comitê das ONGs sobre a Questão Palestina, fundado em 1991, que atua em programas de intercâmbio, pesquisa de campo e documentação de violações israelenses.
Espanha na Vanguarda da Ética Europeia
A Espanha está à frente de muitos países ocidentais em adotar medidas concretas contra os abusos israelenses. Sua política vai além da retórica diplomática, reconhecendo o que acontece em Gaza como genocídio — algo que outras capitais europeias ainda evitam admitir.
Essas ações surgem em resposta às repetidas violações por parte de Israel ao direito internacional humanitário e às resoluções da ONU: com a guerra devastadora em Gaza, o bloqueio à ajuda humanitária, a colonização agressiva na Cisjordânia e políticas sistemáticas de punição coletiva.
O governo espanhol representa uma mudança qualitativa na forma como a Europa enxerga sua responsabilidade moral perante os povos oprimidos, rompendo com a duplicidade de critérios. Essa transformação é também fruto da crescente pressão popular e mobilização da sociedade civil dentro do próprio país, o que tem encorajado os líderes políticos a agirem com mais firmeza — independentemente da anuência de Bruxelas ou Washington.
As medidas concretas do governo espanhol — da condenação à ocupação, ao reconhecimento do Estado Palestino, ao envio de ajuda humanitária e ao apoio à responsabilização internacional — refletem um compromisso real com o fim da ocupação e a construção de uma paz justa com base nas fronteiras de 1967.
Conclusão
Em um momento em que as vozes das vítimas clamam por justiça e as imagens da destruição em Gaza comovem o mundo, a Espanha prova que o compromisso com os direitos humanos e o direito internacional pode — e deve — ser traduzido em políticas de Estado.
Essa postura poderá desencadear um movimento mais amplo na Europa, especialmente à medida que cresce a pressão popular sobre governos hesitantes e com a expectativa de que a França reconheça o Estado da Palestina em setembro próximo.
O envolvimento ativo da Espanha no apoio aos direitos dos palestinos fortalece os esforços globais para interromper o genocídio, responsabilizar Israel e reavivar a solução de dois Estados — baseada no fim da ocupação e na criação de um Estado palestino independente com capital em Jerusalém Oriental.
Diante de um silêncio internacional vergonhoso, a Espanha permanece, até novo aviso, como a consciência viva da Europa — em defesa da justiça, da Palestina e do direito internacional.
Autor:
Dr. Rasem Bisharat