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quinta-feira, 31 de julho de 2025

Resenha da dissertação: o direito eleitoral e o novo populismo digital

A dissertação “O Direito Eleitoral e o Novo Populismo Digital”, de autoria de Alexandre de Moraes, apresentada em 2024 à Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, oferece uma análise profunda e atual sobre os desafios impostos pela desinformação e pelo novo populismo digital ao sistema eleitoral e à democracia. O estudo, estruturado em quatro capítulos, aborda desde a legislação de combate à desinformação até a atuação da Justiça Eleitoral brasileira, com ênfase na proteção da liberdade de escolha dos eleitores e no enfrentamento de práticas antidemocráticas nas redes sociais e serviços de mensageria privada. No Capítulo 1, Moraes examina a legislação voltada ao combate à desinformação, com destaque para o Digital Services Act (DSA) e o Digital Markets Act (DMA) da União Europeia, que impõem transparência e responsabilidade às plataformas digitais (p. 29-40). O autor discute o conceito de autorregulação regulada, destacando a necessidade de medidas eficazes para mitigar conteúdos que violem direitos fundamentais, como a privacidade e a liberdade de expressão (p. 34). Ele também analisa o Direito Comparado, citando exemplos de regulamentação em países como Letônia, Paquistão e Suécia (p. 22-25).

O Capítulo 2 foca na liberdade de escolha dos eleitores e no acesso à informação, explorando como as fakes news e a manipulação digital corroem a formação da vontade popular. O autor cita Ana Paula de Barcellos e Felipe Terra, que descrevem as fakes news como conteúdos criados deliberadamente para enganar, destacando sua disseminação mais rápida que a de notícias verdadeiras (p. 67). Referências a Giovanni Sartori reforçam a influência das mídias digitais na formação de opinião, comparando-a ao impacto da televisão (p. 68-75). No Capítulo 3, a obra analisa a desinformação nas redes sociais como um instrumento de corrosão democrática, destacando o papel do novo populismo digital extremista. Moraes aponta que as “milícias digitais” exploram

algoritmos e inteligência artificial para propagar discursos de ódio e ataques às instituições, como o Poder Judiciário (p. 154-197). Ele cita autores como Michiko Kakutani, que alerta para a “morte da verdade” em um contexto de pós-verdade (p. 142-146), e Patricia Campos Mello, que analisa a “máquina do ódio” (p. 147). O Capítulo 4 detalha a atuação da Justiça Eleitoral brasileira, especialmente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), no combate à desinformação. O autor destaca decisões como a Resolução TSE n. 23.714/2022, que autoriza a suspensão temporária de perfis que disseminem conteúdos falsos durante o período eleitoral (p. 218-224). Ele também aborda casos específicos, como a multa aplicada a Valdemar da Costa Neto por litigância de má-fé em ações que questionavam a lisura das urnas eletrônicas (p. 252-253).

Na conclusão, Moraes propõe um novo paradigma para o Direito Eleitoral, que combine regulamentação das plataformas digitais, responsabilidade solidária dos provedores e ações judiciais céleres para coibir a desinformação (p. 271-287). Ele enfatiza a necessidade de proteger a democracia contra o uso abusivo das redes sociais, que se tornaram ferramentas de milícias digitais a serviço do populismo extremista. A dissertação de Moraes é um marco no estudo do impacto das tecnologias digitais no processo eleitoral, oferecendo uma abordagem interdisciplinar que combina direito, ciência política e tecnologia. Sua análise do novo populismo digital é particularmente relevante, dado o crescente uso de redes sociais para manipular a opinião pública, como observado em casos como a campanha de Donald Trump (p. 137-138).

A citação de autores como Sartori, Kakutani e Campos Mello enriquece o debate, conectando a teoria à prática contemporânea.Um ponto forte da obra é a ênfase na atuação proativa da Justiça Eleitoral brasileira, que se destaca no contexto global por sua capacidade de responder rapidamente a ameaças democráticas (p. 208-263). No entanto, o autor poderia ter explorado mais profundamente os limites éticos da autorregulação regulada, especialmente no que tange à privacidade dos usuários e ao risco de censura excessiva, temas que aparecem de forma menos detalhada (p. 34, 279-280). A obra contribui significativamente para o debate jurídico e político ao propor um marco regulatório que equilibre liberdade de expressão e combate à desinformação. Sua análise do papel das plataformas digitais como atores responsáveis pela propagação de conteúdos antidemocráticos é um convite à reflexão sobre a

necessidade de legislação atualizada, como o PL 2.630/2020 (p. 284). A dissertação é especialmente pertinente em um cenário global de polarização e erosão democrática, sendo uma leitura essencial para juristas, cientistas políticos.

REFERÊNCIAS

Moraes, Alexandre de. O Direito Eleitoral e o Novo Populismo Digital. São Paulo: Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, 2024.

Kakutani, Michiko. A Morte da Verdade. Rio de Janeiro: Intrínseca, 2018.

Campos Mello, Patricia. A Máquina do Ódio. São Paulo: Companhia das Letras, 2020.

Sartori, Giovanni. Homo Videns: Televisão e Pós-Pensamento. Bauru: Editora da Universidade do Sagrado Coração, 2001.

Autor:

Professor Dr. José Rinaldo Domingos de Melo

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