15.3 C
São Paulo
quarta-feira, 30 de julho de 2025

Matias Aires: Todos Deveríamos Ler

Nos últimos dois anos, abracei uma missão que parece óbvia — mas que é quase revolucionária: ler os grandes filósofos brasileiros esquecidos pelo tempo.
Aqueles nomes que não brilham em formaturas, que não viram frase de Instagram, mas que disseram o essencial — e disseram bem antes de todo mundo.

Vivemos de costas para o nosso pensamento.
Nos curvamos ao existencialismo europeu, nos deslumbramos com a espiritualidade oriental, reverenciamos os clássicos gregos — mas esquecemos que o Brasil também pensou.
E pensou grande.

Foi nessa jornada que reencontrei Matias Aires, paulistano de 1705, formado em Coimbra e na Sorbonne. Um filósofo à frente do seu tempo — e, ouso dizer, à frente do nosso também.

Seu livro, Reflexões sobre a Vaidade dos Homens (1752), é um tratado filosófico tão atual que poderia estar nas listas da Amazon entre os títulos de autoconhecimento e crítica à sociedade do ego. Mas sem os clichês. Sem as fórmulas. Sem os mantras vazios.

Matias nos olha sem filtro. E não gosta do que vê.
Para ele, somos vaidade pura. Vivemos para sermos notados, aplaudidos, curtidos.
Valorizamos o reflexo — não o conteúdo.
Trocamos consciência por performance.
E confundimos vaidade com valor.

Num estilo direto, agudo e quase incômodo, ele antecipa o que hoje neurocientistas e sociólogos chamam de narcisismo contemporâneo.
Mas Matias não vendia curso, nem monetizava dor.
Ele só escrevia — com lucidez e coragem.

E talvez por isso tenha morrido sem os louros da fama.
Mas com um legado que o tempo não apagou — apenas silenciou.

Foi patrono da Cadeira 6 da Academia Brasileira de Letras.
Reconhecido por Ariano Suassuna como “o maior filósofo da língua portuguesa do século XVIII”.
E, ainda assim… é um nome ausente das escolas, das rodas de conversa, da pauta cultural brasileira.

Enquanto consumimos filosofia em inglês com entusiasmo, Matias Aires grita em português perfeito:
“Vaidade das vaidades. Tudo é vaidade.”

Ele não entrega autoajuda. Entrega um espelho.
Não é selfie. É profundidade.
E se você tiver coragem de encarar, vai entender: pensar é um ato de resistência.
E o Brasil já teve — e ainda tem — quem pense por ele.

Só falta a gente ouvir.


Willians Fiori é neurocientista, psicanalista e pesquisador de cultura, longevidade e pensamento brasileiro. Professor do Hospital Israelita Albert Einstein e autor do livro Diversa-IDADE, dedica-se a resgatar vozes esquecidas da nossa história intelectual — como a de Matias Aires — e a conectar passado, presente e futuro em conversas que importam.

DEIXE UMA RESPOSTA

Por favor digite seu comentário!
Por favor, digite seu nome aqui

Leia mais

Patrocínio