Há algo de profundamente perturbador e ao mesmo tempo fascinante no fenômeno das bonecas Reborn.
São réplicas hiper-realistas de bebês, com veias pintadas à mão, peso idêntico ao de um recém-nascido, até cheiro de talco.
Mas o que choca não é a minúcia da arte. É o vazio que elas parecem preencher.
Chamam de “síndrome Reborn” quando adultos, sobretudo mulheres, passam a tratar essas bonecas como filhos de verdade.
Não como brinquedos, nem como peças de coleção.
Como filhos, com registro de nascimento, carrinho, fraldas, quarto decorado e até pediatra de mentira.
Não se trata aqui de julgar o luto legítimo de quem perdeu um bebê e encontra na boneca uma forma de conforto.
A dor tem caminhos insondáveis.
O problema começa quando a substituição se torna permanência.
Quando a boneca ocupa um espaço vital que deveria ser preenchido por relações humanas reais com todas as suas imperfeições, frustrações e surpresas.
No fundo, talvez estejamos diante de mais um sintoma de uma sociedade que prefere a simulação ao risco.
Um bebê de verdade chora, adoece, cresce e, pior, contraria. A boneca não. É obediente, plácida, eternamente bebê.
Não se perde, não se afasta, não decepciona.
É o filho ideal feito sob encomenda para mães que não suportam a realidade. Vivemos tempos em que a maternidade virou vitrine Instagram, YouTube, TikTok. Tudo é cuidadosamente editado, filtrado, roteirizado.
Nesse mundo, a boneca Reborn é quase uma evolução lógica. É a maternidade sem suor, sem desvelo, sem entrega.
É a selfie com bebê sem o bebê.
A síndrome Reborn escancara algo maior que é a recusa da dor, do acaso, da carne. Queremos controlar tudo, até o amor.
E o amor, por definição, é incontrolável.
Por isso, uma boneca pode ser parecida com um bebê, mas jamais será um filho. E, talvez, esse seja o ponto mais inquietante de todos.
Há quem prefira assim…
Autor:
Carlos Alberto Omena