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sexta-feira, 16 de maio de 2025

SILÊNCIOS COMPARTILHADOS

No pequeno retângulo metálico que sobe e desce dezenas de vezes por dia, mora um dos rituais mais silenciosos e estranhos da vida urbana que é o momento em que

vizinhos separados por poucos centímetros de parede dividem um espaço por alguns andares sem trocarem mais que um aceno breve ou um “bom dia” seco.

O elevador, essa cápsula de aço inox, é um confessionário mudo onde ninguém se confessa.

Um lugar onde olhares preferem os números acesos acima da porta a qualquer tentativa de conexão humana.

A         li, dois desconhecidos que compartilham o mesmo endereço, o mesmo encanamento e às vezes até os mesmos barulhos da madrugada, agem como estranhos num ponto de ônibus.

É curioso pensar que o silêncio nesses encontros forçados diz mais do que mil palavras.

Ele é carregado de uma espécie de acordo tácito como não invadir, não perguntar, não comentar.

Por que essa barreira?

Medo da invasão de privacidade? Timidez urbana?

Ou apenas o reflexo de uma sociedade cada vez mais desconectada do que está próximo?

Ninguém sabe ao certo o nome da senhora do 801, embora sua risada às vezes atravesse as frestas da porta.

O morador do 503 pode estar passando por um divórcio, ou apenas goste de escutar jazz alto aos domingos.

São histórias vizinhas, mas distantes.

Nos elevadores, o silêncio vira código de conduta. É uma pausa obrigatória no fluxo da vida.

Ali, respira-se juntos, mas não se conversa.

E é nesse não dito que mora a crônica da cidade pois vizinhos mal se conhecem, mas dividem o mesmo teto ainda que por apenas alguns segundos de subida ou descida.

Talvez um dia, entre o térreo e o sétimo andar, alguém quebre o protocolo e diga: “Você mora aqui há quanto tempo?”.

E quem sabe, nesse breve rompimento, um novo tipo de vizinhança possa nascer.

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