No pequeno retângulo metálico que sobe e desce dezenas de vezes por dia, mora um dos rituais mais silenciosos e estranhos da vida urbana que é o momento em que
vizinhos separados por poucos centímetros de parede dividem um espaço por alguns andares sem trocarem mais que um aceno breve ou um “bom dia” seco.
O elevador, essa cápsula de aço inox, é um confessionário mudo onde ninguém se confessa.
Um lugar onde olhares preferem os números acesos acima da porta a qualquer tentativa de conexão humana.
A li, dois desconhecidos que compartilham o mesmo endereço, o mesmo encanamento e às vezes até os mesmos barulhos da madrugada, agem como estranhos num ponto de ônibus.
É curioso pensar que o silêncio nesses encontros forçados diz mais do que mil palavras.
Ele é carregado de uma espécie de acordo tácito como não invadir, não perguntar, não comentar.
Por que essa barreira?
Medo da invasão de privacidade? Timidez urbana?
Ou apenas o reflexo de uma sociedade cada vez mais desconectada do que está próximo?
Ninguém sabe ao certo o nome da senhora do 801, embora sua risada às vezes atravesse as frestas da porta.
O morador do 503 pode estar passando por um divórcio, ou apenas goste de escutar jazz alto aos domingos.
São histórias vizinhas, mas distantes.
Nos elevadores, o silêncio vira código de conduta. É uma pausa obrigatória no fluxo da vida.
Ali, respira-se juntos, mas não se conversa.
E é nesse não dito que mora a crônica da cidade pois vizinhos mal se conhecem, mas dividem o mesmo teto ainda que por apenas alguns segundos de subida ou descida.
Talvez um dia, entre o térreo e o sétimo andar, alguém quebre o protocolo e diga: “Você mora aqui há quanto tempo?”.
E quem sabe, nesse breve rompimento, um novo tipo de vizinhança possa nascer.