Hoje, oito de maio de dois mil e vinte e cinco, o mundo esperava que o apóstolo Pedro reencarnasse na pessoa do Papa. E eis que Habemus Papam, e enfim conhecemos Leão XIV, o Papa que se auto intitula Agostiniano, filho de Santo Agostinho. Leão XIV segue seu legado e, em sua oração, declama: “Tocaste-me, e agora estou ardendo no desejo da tua paz.”
Santo Agostinho foi um Doutor da Igreja, filosófo e seus ensinamentos seguem até hoje como referência, até mesmo para a ciência. Talvez por isso a tarde de hoje tenha começado evocando o Papa e Santo Agostinho: uma tarde em que presenciamos a personificação da decadência humana, de almas necessitadas de fé, mas também de educação. Não uma educação centrada apenas no saber técnico, mas sim uma que valorize a humanidade e a ética social, algo cada vez mais ausente dentro das universidades.
Era só mais um dia comum em que eu e minhas amigas da faculdade saímos da aula e ficamos conversando do lado de fora da sala. De repente, vimos dois rapazes com uniforme da agência de tecnologia desta universidade federal. Um deles, com o capacete na mão, interrogava um morador de rua que ali estava, perguntando de forma sarcástica: “Confessa, vai?” A forma com que empurrava o homem e o jogava ao chão, espalhando suas roupas, logo nos chamou a atenção. O outro rapaz começou a ficar mais agressivo, até que o morador de rua saiu correndo, gritando e pedindo ajuda. Sua voz ainda ecoa em meus ouvidos: “Alguém me ajuda, alguém me ajuda!”
Ele correu em nossa direção. Ficamos atônitas, incrédulas com a situação. Em nenhum momento aquele homem demonstrou resistência — apenas tentava se defender da forma abrupta como estava sendo tratado por aqueles jovens. Ao correr, seguiu em direção ao pátio da universidade, e o rapaz, não sei dizer se era bolsista, professor ou servidor da agência, jogou o capacete nas costas do homem, atingindo-o em cheio. O homem gritou ainda mais. E eu, incrédula, só consegui gritar, mesmo sem ser ouvida: “Não faz isso com ele!”
Algumas pessoas que passavam disseram que o homem havia roubado. Já estava julgado e condenado: sem direitos, sem defesa, humilhado. Ali, diante das ameaças daqueles “letrados”, aquele homem, que, embora em situação de rua, estava em um campus universitário, foi tratado como se não tivesse dignidade. Sob os olhos de quem deveria fazer educação neste país, ninguém teve a sensibilidade ou a humildade de tratá-lo como um ser humano. Resolveram fazer o que chamam de “justiça com as próprias mãos”.
E, depois de tudo isso, ainda foram ovacionados, como se tivessem feito o bem. A quem? Quem agrediu, humilhou e ultrajou aquele que já tinha a humanidade negada por tantos, foi aplaudido. Os guardas chegaram, finalmente, e retiraram o homem do campus, mas não antes de ouvirmos mais uma ameaça do letrado: “Se eu te vir aqui de novo, eu te mato.” Sim, foram essas as palavras usadas.
Minha tamanha incredulidade me fez ficar parada, sem reação, por testemunhar tamanha agressão. Ainda quero acreditar na humanidade, na educação. Ainda quero crer nos princípios que deveriam nortear a educação superior no Brasil. Mas me pergunto: onde está a formação humana que a universidade deveria promover?
Mais uma vez, evoco Santo Agostinho: “Eis que habitavas dentro de mim e eu te procurava do lado de fora.” Eis que procuro a humanidade nos campi universitários desta universidade federal, sem segurança, sem piedade, sem humanidade.
Não se trata apenas de encontrar o culpado, o sistema, as pessoas, a formação escassa, mas de saber a quem ouvimos pedir socorro… e não ajudamos. De quantos procuramos e não encontramos. A quem educamos?!
Autora:
Laize Almeida de Oliveira