Não esperava isso dela. Também, do jeito que estava, não podia continuar. Veja, meu amigo, e no final me diga se estou certo ou errado. Seja sincero — afinal, amigo é pra essas coisas.
Como posso confiar em alguém que não tem palavra? Diz que vem pela manhã, depois passa pra tarde, e quando já estou de pijama, chega cheia de ideias, querendo conversar até altas horas. Não tem noção de tempo: duas da manhã querendo cappuccino com bolo de laranja, como se aqui fosse uma cafeteria e eu, um barista.
E ainda vem com um papinho que só pode ser influência das “amigas”: — Vamos fazer uma crônica a quatro mãos.
E parecendo que já consultou um advogado, afirma com uma autoridade absurda que minhas crônicas só existem por causa dela. De onde ela tirou esse argumento? Como pode falar uma coisa dessas com tanta propriedade, se ela sabe muito bem que sou eu, somente eu, que escrevo pro Caroço de Manga, pro Recanto das Letras, e pelo que sei, o nome dela não consta em nenhum desses sites.
Mas, amigo, a vida é assim mesmo. No começo era tímida, quase não se apresentava. Mas era pontual como funcionária de fábrica, paciente e prestativa… quase uma Amélia do Mário Lago.
Agora, vou ser curto e grosso: — Olha aqui, Criatividade, baixe a bola. Venha quando eu quiser, e nada de chegar de madrugada tirando meu sono. Você sabe que eu não posso perder meu repouso remoendo ideias e ligando pensamentos pra criar crônicas. Respeite minha hora de dormir.