Nesta última semana, li vários artigos sobre Bianca Censori e sua nudez durante a premiação do Grammy 2025. Todos avaliavam o quanto ela estava sendo “escravizada”, “controlada” ou “explorada” por seu marido, um bilionário de valor duvidoso. Foram colocados em dúvida seu “feminismo”, senso de “liberdade” e “autonomia”, enchendo seu silêncio de hipóteses sobre uma suposta “servidão voluntária”. Além de ignorarem que qualquer contrato de trabalho ou matrimônio se presta exatamente a isto, poucos se deram conta de que Bianca não estava nua — usava um vestido com uma trama muito fina, que o tornava totalmente transparente. Nas fotos dos jornais e revistas, os seios e genitais da modelo foram cobertos com filtros de diversos tipos, que escondiam muito mais a hipocrisia dos fotógrafos, jornalistas e seus leitores do que a nudez de seu corpo.
O que todos querem ver no tapete vermelho não são as roupas de grife, mas os corpos malhados, traseiros torneados, braços e pernas musculosos. Usamos o raio X da imaginação para despir suas poses frontais e dorsais, expondo suas partes íntimas no meio daquele zoológico de espécimens raros. Bianca não estava nua, mas nos deixou despidos e envergonhados no ato.
No momento em que despejou seu casaco de peles sobre o tapete, olhando fixamente para frente, sem nunca sorrir, ela nos mostrou um espelho: “É isso o que vocês querem?
Então, é isso o que vão ter”. Cada piscadela de flash naquele corpo — perfeito, tal qual uma escultura de Rodin — era um tapa na cara dos espectadores. Ao mesmo tempo em que era impossível desviar o olhar daquela mulher em pele, parecia que havia algo errado: tínhamos que olhar para o lado, aquilo não podia estar acontecendo. Como ela ousava tirar nosso direito de imaginá-la nua? Para que serve, então, o tapete vermelho e toda aquela feira de vaidades?
Como na fábula A Roupa Nova do Rei, em plena festa do Grammy, Bianca representou o papel da criança que revela ao público a verdade sobre a nudez do monarca — só que, nesse caso, o rei éramos nós.
Autor:
Paulo Santos