Comecei a refletir sobre essa desigualdade tecnológica quando li o livro Sapiens, de Yuval Noah Harari. Nele, Harari discute como as evoluções tecnológicas moldaram a história da humanidade, mas também como essas mesmas inovações criaram divisões profundas entre grupos sociais. Foi então que me dei conta: estamos à beira de um novo abismo, um que pode redefinir o conceito de ser humano.
Nos corredores de inovação, onde a biotecnologia e a inteligência artificial ganham protagonismo, um novo mundo está se desenhando – e não é para todos. A promessa de um futuro mais avançado, eficiente e conectado carrega também uma sombra incômoda: a desigualdade tecnológica.
Com o ritmo acelerado do desenvolvimento de soluções tecnológicas, é inegável que o acesso a essas ferramentas será desigual. É um futuro que já começa a ser polarizado: de um lado, os aprimorados; do outro, os naturais.
Os Aprimorados: A Elite da Próxima Era
Os “aprimorados” serão os que têm acesso à biotecnologia e à IA aplicada ao potencial humano. Essa elite, com recursos para usufruir dessas inovações, viverá mais, com mais saúde, com habilidades cognitivas expandidas e um poder econômico exponencialmente maior. Isso não é mera especulação: um estudo do World Economic Forum estima que a economia ligada à biotecnologia e à IA crescerá de US$ 300 bilhões em 2022 para mais de US$ 1 trilhão até 2030. Uma elite potencializada pela tecnologia está surgindo, literalmente reprogramando a biologia humana.
- Implantes Cerebrais: Startups como a Neuralink, de Elon Musk, prometem interfaces que conectam o cérebro diretamente a máquinas, possibilitando desde cura de doenças degenerativas até expansão cognitiva.
- Editação Genética: O CRISPR, tecnologia revolucionária na manipulação do DNA, abre caminho para humanos mais resistentes a doenças, mais fortes e, em breve, mais inteligentes.
- Extensão da Vida: Empresas como Calico (Google) e Altos Labs já investem em pesquisas para retardar o envelhecimento e, possivelmente, ampliar radicalmente a expectativa de vida.
Os Naturais: Quem Ficou para Trás
Porém, se a tecnologia promete uma revolução, a realidade é que a distribuição dessas inovações será restrita. Segundo o Banco Mundial, cerca de 37% da população mundial ainda não possui acesso à internet. Se isso já é um abismo no presente, imagine no futuro, onde biotecnologias e IA serão os pilares do progresso humano.
- Educação Limitada: Sem ferramentas básicas de aprendizado e acesso ao conhecimento avançado, populações inteiras estarão condenadas a operar com habilidades defasadas.
- Barreiras Sociais: Como apontado no relatório da UNESCO, a divisão socioeconômica amplifica o fosso entre classes, pois aqueles sem acesso não apenas ficam para trás – eles retrocedem.
- Cenário Biológico: Enquanto os aprimorados acessarão terapias para reduzir doenças e melhorar sua performance, os naturais continuarão reféns de limitações genéticas e do envelhecimento natural.
O Abismo: Uma Nova Divisão de Classes?
Estudos como os de Yuval Noah Harari sugerem que a próxima fronteira de desigualdade não será mais econômica, mas biológica e cognitiva. Os aprimorados terão a capacidade de redefinir suas próprias limitações humanas, enquanto os naturais, sem esses recursos, viverão – e trabalharão – em um mundo onde nunca serão suficientes.
A “distopia”, porém, é um alerta. Se não tomarmos medidas agora, enfrentaremos uma divisão radical e perigosa entre aqueles que possuem a tecnologia e aqueles que dela são privados.
O futuro não pode ser exclusividade de alguns poucos. Mais do que nunca, é urgente discutir a democratização da tecnologia, com políticas inclusivas e educação ampla, garantindo que nenhum humano, por ser “natural”, seja tratado como inferior.
A verdadeira revolução tecnológica será aquela que criará avanços para todos, e não apenas para uma nova elite. Afinal, o que nos define como humanos é justamente a capacidade de evoluir juntos.
Por: Willians Fiori