Mulher, naturalmente, refere-se ao ser humano do sexo feminino, em contraste com o sexo masculino que, por questões biológicas, possuem órgãos sexuais dos quais os homens não possuem (vice-versa).
Embora exista essa diferenciação biológica, juridicamente, homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos da Constituição Federal de 1988, nossa Magna Carta, por ora, vigente.
A saber, Magna Carta significa um conjunto de ordenamentos que devem ser seguidos por uma nação e, nação, trata-se de um conjunto de pessoas que habitam o mesmo território, ligadas por afinidades culturais e linguísticas, das quais obedecem as mesmas leis. Falando em lei, a citada Carta, em seu artigo 3°, fundamenta para nossa nação que a República Federativa constitui alguns objetivos, dentre eles “promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.”.
E o que isso tem a ver com o sistema tributário nacional? Explico:
Nosso sistema tributário é composto por normas que regulamentam os tributos (impostos, taxas, contribuições), que, por sua vez, têm o condão de subsidiar/financiar as atividades do Estado.
Dentro desse sistema, o Estado, que é uma estrutura institucional que assegura a ordem e o controle de uma nação, tem certa ingerência na forma como a economia pode se comportar. Um exemplo disso é a alta carga tributária sobre bebidas alcoólicas e cigarros, cabendo, ao Estado, o desestímulo no consumo dessas mercadorias, tendo em vista que ambas prejudicam a saúde da nação.
Dessa forma, como comentado acima, um dos principais objetivos estampados na Constituição Federal é justamente promover o bem estar de todos. Não bastasse isso, essa Carta também fundamenta que a saúde é direito de todos e dever do Estado, garantindo, mediante políticas socias e econômicas, à redução do risco de doenças. Por isso, nota-se que o sistema tributário nacional também possui caráter de extrafiscalidade, que significa incentivar ou desestimular determinada conduta da sociedade através da tributação. No entanto, quando chegamos na análise das mercadorias de uso exclusivo do público de sexo feminino, encontramos certa contradição do sistema tributário em comparação à Carta Magna, e vemos que, o que deveria servir de incentivo – ou mero atendimento às normas constitucionais SEM DISTINÇÃO DE QUALQUER NATUREZA – nos serve (e aqui me coloco dentro da situação, pois, sou pessoa de sexo feminino) de desestímulo e consequentemente desequilíbrio econômico e social.
Pensemos que, assim como o álcool e o cigarro estão para o sistema tributário nacional como bens considerados não essenciais (e por isso sua tributação é elevada), absorventes, produtos de higiene íntima, cuidados infantis e geriátricos femininos, são tributados tal qual.
Em uma escala de comparação mais próxima de produtos, pode-se citar os métodos contraceptivos. Anticoncepcionais são tributados com alíquotas de 30% (ou mais, a depender do tipo), enquanto que preservativos de uso exclusivo do sexo masculino, possuem tributação inferior a alíquota de 10% – além de serem disponibilizados de forma totalmente gratuita nos postos de saúde pública.
Diante dessa breve análise, nota-se uma diferenciação que o sistema tributário têm feito diante de produtos destinados a públicos de sexos diferentes, falhando com a Constituição Federal. Isso porque, não bastasse a equidade de direitos e deveres que a Constituição objetiva para nossa nação, existe a nítida preocupação com o dever de o Estado promover a tributação de acordo com a essencialidade dos produtos ou serviços destinados à sociedade, de modo que, quanto mais essencial, menor a tributação.
Dessa forma, a imposição de alíquotas mais onerosas aos produtos essenciais femininos, criam o desequilíbrio na sociedade, obviamente, em relação às pessoas deste atingido sexo. Para além disso, é preciso a reestruturação desse sistema, pois, também tem-se que a maneira como os produtos são classificados como essenciais ou supérfluos é questionável.
É inevitável que, via de regra e por questões fisiológicas, mulheres irão menstruar e, por consequência, (e para além das questões hormonais que afetam pessoas desse sexo), precisam de produtos que suportam esse período menstrual, para assim possibilitar, à essas pessoas durante esse período, a normalização de suas vidas (por motivos óbvios).
Dito isso, evidente que tributar de maneira elevada – ou não isentar – tais produtos, que são de extrema essencialidade, mantém um sistema desigual, e anti isonômico.
Repisa-se, o artigo 5° da Constituição Federal dispõe que todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, e através disso se extrai o princípio da igualdade, que pressupõe que às pessoas colocadas em situações diferentes serão tratadas conforme suas desigualdades. Isso significa dar tratamento isonômico à nação. Assim, cabe a lei regular as relações, procedimentos e processos sociais e econômicos, com o fito de diminuir a desigualdade, promovendo isonomia ao legislar.
Por fim, o sistema tributário nacional, tendo como um de seus objetivos a extrafiscalidade, deve interagir diante da sua pujança e dirimir o atual cenário sensível que a nação feminina sofre, reestruturando, inclusive através da Reforma Tributária que se aproxima do sistema, a tributação que se volta à esse extenso grupo.
Autora:
Samara Fernanda Leal do Vale
Advogada Tributarista, Pós-Graduada em Direito Tributário, Especialista em Processo Tributário Analítico – IBET, Membro do Grupo de Estudos “Mulheres e Tributação: entre orçamentos e políticas públicas” da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo – USP.
Parabéns por mostrar algo que eu nunca entendi: por que o valor dos produtos de higiene pessoal, para o público feminino, é sempre mais alto do que para o público masculino? Me vi representada neste artigo.